12/11/2015 - 19:26
Era para ser segredo, mas alguém falou demais e a conversa vazou em pleno feriado de Finados. Discretamente, Edemir Pinto, presidente da BM&FBovespa, procurou Gilson Finkelsztain, CEO da Cetip, para propor uma fusão entre as duas casas. A notícia provocou um momento de euforia no mercado. Na terça-feira 3, ambas as ações subiram quase 10%. Logo antes da abertura dos negócios, os rumores foram confirmados por comunicados, que não trazem prazos ou condições. Como a Bolsa é maior que a Cetip tanto em faturamento quanto em valor de mercado, o mais provável é que a operação seja uma aquisição, não uma fusão entre iguais.
A Bolsa não concedeu entrevista. Quanto à Cetip, durante a teleconferência de apresentação de resultados na manhã da sexta-feira 6, o diretor financeiro, Willy Jordan, limitou-se a dizer que “o assunto será submetido ao Conselho.” Os analistas de mercado gostaram da ideia. “A fusão faz sentido em termos estratégicos e criaria um participante que dominaria o mercado brasileiro, o que tornaria mais difícil a entrada de concorrentes internacionais”, avaliou Tito Labarta, analista do Deutsche Bank de Nova York.
Ao longo dos últimos anos, bolsas internacionais como a britânica Bats e a americana DirectEdge ensaiaram uma incursão pelo mercado brasileiro, de olho nos polpudos ganhos da Bolsa, premiada como a melhor empresa de serviços financeiros em 2015 pelo anuário AS MELHORES DA DINHEIRO. Elas desistiram quando calcularam quanto teriam de investir para construir sistemas de liquidação de transações e de registro das posições dos participantes do mercado, atividade conhecida como custódia.
Uma eventual fusão criaria uma barreira intransponível e tornaria mais fácil à Bolsa acelerar sua disputa pelo mercado de transações da América Latina. Embora a Bolsa seja famosa e a Cetip seja pouco conhecida do grande público, elas são muito parecidas. A Bolsa intermedia negócios com ações, câmbio e derivativos. A Cetip surgiu nos anos 1970 como um sistema desenvolvido pelos bancos para registrar os títulos de renda fixa e facilitar as transações entre eles. Assim, quando um investidor aplica dinheiro em um Certificado de Depósito Bancário (CDB) em um banco, informações como valor, prazo e taxa de juros são registrados na Cetip.
Propriedade dos bancos, ela abriu capital em 2009 e diversificou seus negócios. Agora, a Cetip também registra se os carros estão totalmente pagos ou não e está desenvolvendo um sistema para facilitar o controle das dívidas que recaem sobre os imóveis. Há outra semelhança. Ambas seriam queridinhas de investidores como Warren Buffett. Elas dominam seus mercados, são pouco endividadas, geram resultados sólidos e consistentes, e pagam dividendos suntuosos. Ao divulgar os resultados do terceiro trimestre na manhã da sexta-feira 6, a Cetip informou que distribuiria R$ 314,1 milhões aos acionistas referentes aos resultados dos três primeiros trimestres do ano.
“Aprovamos a distribuição de 85% do lucro líquido desse período”, disse Jordan. Em 2014, a Bolsa distribuiu R$ 595,7 milhões aos acionistas, ou 80% do lucro. “As duas empresas estão entre as líderes no pagamento de dividendos”, avalia Caio Weil Villares, presidente da Ancord, associação das corretoras de valores. “O desempenho já é espetacular, e em uma fusão o ganho com sinergias deve ser astronômico.” A transação criaria muitos ganhadores, e alguns prováveis perdedores: as corretoras de valores, os principais clientes da Bolsa. Nos últimos tempos, elas têm enfrentado não apenas um mercado adverso, mas também maiores exigências para poder operar.
Por isso, muitas casas tradicionais simplesmente deixaram de atuar, o que abre uma lacuna no mercado. O predomínio de grandes empresas acaba reduzindo a diversidade e desestimulando a inovação. “As corretoras tradicionalmente formam e educam os investidores e seriam beneficiadas se houvesse mais concorrência entre bolsas, e uma situação de monopólio as prejudica”, diz Villares. “Seria o caso de os órgãos reguladores determinarem que parte dos ganhos de sinergia sejam direcionados para o desenvolvimento do mercado de capitais.” Procurada, a CVM não comentou o assunto.