22/08/2012 - 21:00
Retangular, preto, com espessura de alguns milímetros, tela touchscreen, aplicativos e acesso à internet. Em linhas gerais, essa é a descrição do iPhone da Apple, o smartphone mais vendido de todos os tempos. A Samsung, porém, se tornou uma ameaça à soberania da empresa de Cupertino na área de telefonia móvel. A fabricante coreana assumiu a primeira posição no ranking dos maiores vendedores de celulares inteligentes do mundo, com quase 45 milhões de aparelhos comercializados, no primeiro semestre deste ano, ante 35 milhões da concorrente americana. A estratégia para destronar a Apple foi oferecer opções de produtos em diversas faixas de preço.
Onipresença: linha de design da Apple, idealizada por seu fundador,
está no centro da discórdia entre as duas companhias.
A maioria dos aparelhos da companhia asiática, no entanto, tem características de design similares aos da rival: é retangular, possui cor preta, espessura de alguns milímetros, tela touchscreen, aplicativos e acesso à internet. Essas semelhanças bastaram para que Apple e Samsung começassem a se engalfinhar nos tribunais, com acusações mútuas de quebra de propriedade intelectual. Há processos judiciais relacionados a essa disputa em ao menos dez países. O ápice da briga se dá agora, com um julgamento que ocorre desde o início do mês – e deve se estender até setembro – na corte de San Jose, terceira maior cidade da Califórnia, resultado de uma ação protocolada pela Apple, em abril do ano passado.
A empresa do Vale do Silício pede reparação de US$ 2,5 bilhões por suposta quebra de patentes. A Samsung também se diz vítima de uso ilegal de suas tecnologias. Um exemplo é o recurso de transmissão de dados usado em seus equipamentos, que teria sido violado pela Apple. O que está em jogo é o domínio do principal mercado consumidor da Apple, os EUA. Lá, a empresa vendeu 85 milhões de iPhones desde 2007, ano em que o aparelho foi lançado. O Galaxy S II, segunda versão do smartphone topo de linha da Samsung, de 2011, comercializou 4,1 milhões de unidades no mercado americano. A distância não impede a Apple de dizer que a sul-coreana só conseguiu tais resultados após copiar tecnologias patenteadas.
CIRCO MIDIÁTICO Qualquer que seja o resultado do julgamento em curso na Justiça americana, a ida à corte revela que a Apple teme o crescimento da sul-coreana. O efeito colateral da investida judicial é que a Apple, sempre zelosa de seus segredos, foi forçada a abrir várias informações internas diante de um júri composto por dez pessoas. No dia 26 de julho, ela revelou ter uma margem de lucro que varia entre 49% e 58% por unidade de iPhone. No iPad, a porcentagem fica entre 23% a 32%. Até mesmo curiosidades que não devem influir tanto nos mercados vieram à tona, como o sonho de Steve Jobs de criar um carro da marca Apple, segundo informou seu vice-presidente, Phil Schiller.
O fundador da companhia, aliás, é citado em diferentes momentos nas sessões, em grande parte por sua preocupação com o desenvolvimento do design dos produtos, um dos pilares do sucesso da Apple. Essas e outras histórias ajudaram a compor um circo midiático em torno dessa batalha jurídica. Outro componente que confere um ar de novela das nove ao caso são as equipes de advogados. Basta o júri se ausentar para que os representantes de cada uma das partes troquem insultos. Deslealdade, imitação e até mesmo manipulação de provas são algumas das ofensas disparadas. O advogado da Apple, Harold McElhinny, por exemplo, apresentou papéis da Samsung que diziam que o iPhone era fácil de ser copiado. Um executivo da fabricante asiática teria mencionado uma “crise de design” na empresa, causada pelo iPhone, segundo McElhinny.
Charles Verhoeven, advogado da Samsung, rebateu afirmando que todas as companhias trabalham com memorandos de análise da concorrência. “Isso é chamado de competição, é o que fazemos na América”, disse Verhoeven. Além de inflamar os ânimos de duas potências do setor de eletroeletrônicos, a peleja judicial deve encerrar uma era do design no mercado móvel. Um dos indícios de que isso está prestes a acontecer é o fato de que a Apple deve fazer modificações significativas em seu próximo iPhone, cujo lançamento está previsto para setembro. Com o Galaxy S III, lançado em maio, a Samsung também se distanciou do design consagrado pela concorrente. Esse smartphone ganhou mais curvas, uma série de recursos exclusivos e não vem na cor preta, algo raro no mercado. A sul-coreana também pode estar a ponto de se afastar do Google.
Interessada em diminuir sua dependência do Android, a empresa estaria se preparando para licenciar o sistema operacional BlackBerry 10, da RIM, que deve ser lançado em 2013, segundo rumores cada vez mais fortes do mercado. Desvencilhar-se do Google virou palavra de ordem para a concorrência desde que o gigante das buscas comprou a fabricante Motorola em 2011. Com essa aquisição, o dono do Android passou a ser visto como um forte concorrente de todos os seus parceiros, como a Samsung. Embora ainda não tenha havido, desde o fechamento do negócio, nenhum grande lançamento da Motorola, o setor acredita que a empresa de celulares vá sair da letargia com aparelhos pensados para harmonizar software e hardware. Trata-se de um cenário que poderá fazer o atual choque bilionário entre Samsung e Apple parecer apenas um preâmbulo de batalhas futuras ainda maiores.