01/11/2013 - 21:00
Desde o início da década, quando ganhou força a exploração comercial dos depósitos de gás de xisto, nos Estados Unidos, essa modalidade de combustível vem ganhando força na matriz energética global. O Brasil também deve entrar nessa corrida a partir de 2014, data marcada pela Agência Nacional de Petróleo (ANP) para a realização dos leilões de concessões. Apesar de as reservas nacionais serem consideradas expressivas (6,4 trilhões de m³, o que coloca o País na décima posição no ranking global), sua importância parece limitada, quando comparada ao potencial do biogás, um combustível muito mais fácil de ser obtido e que não acaba jamais.
Combustível ecológico: o biogás é extraído no processo de decomposição de matéria orgânica
Isso porque o gás é extraído no processo de decomposição de matéria orgânica: alimentos, dejetos humanos e de animais, além de sobras da produção agrícola. “A principal vantagem é que, ao contrário das fontes de combustíveis fósseis, o biogás é renovável, pois resulta de atividades controladas pelo homem”, afirma Cícero Jayme Bley Junior, superintendente da área de energias renováveis da Usina Binacional de Itaipu. De acordo com o especialista, apenas as indústrias alimentícias e o setor sucroalcooleiro poderiam garantir uma produção de 30 bilhões de m³ de biogás por ano.
Trata-se de um volume capaz de gerar 35 milhões de megawatts por hora de energia, suficiente para abastecer a cidade de São Paulo durante um ano ou todos os Estados do Centro-Oeste pelo período de dois anos. Se essa vertente da matriz energética é tão promissora, por que, então, não existem projetos para seu aproveitamento? Na avaliação de Bley Junior, o biogás paga o preço das políticas erráticas adotadas no passado. Especialmente na década de 1970, em meio à crise de petróleo, e na de 1990, quando da popularização dos projetos de venda de créditos de carbono. “Jamais existiu uma programa efetivo, consistente e de longo prazo para essa vertente da matriz energética”, diz.
“Os incentivos foram pontuais e quem investiu na área acabou ficando na mão.” Essa situação, no entanto, deverá sofrer uma guinada radical, de acordo com Bley Junior. E um dos agentes dessa mudança, aposta ele, será Itaipu. Por meio da parceria com a Companhia Energética do Paraná (Copel) e com a Onudi, agência da ONU para o desenvolvimento industrial, a diretoria de Itaipu pretende fazer do biogás o motor de desenvolvimento dos municípios da região oeste do Estado. O projeto mais robusto está sendo implantado no município de Entre Rios do Oeste e deve entrar em operação ao longo de 2014.
Bley Junior, superintendente de Itaipu: “A vantagem do biogás
é que ele é renovável”
O investimento na localidade de quatro mil habitantes é de R$ 14 milhões e inclui a construção de um sistema de gasoduto ligando os biodigestores instalados pela Itaipu e pela Copel em 63 das 93 propriedades rurais do município, cuja principal atividade econômica é a criação de suínos. São 130 mil animais responsáveis por uma carga de dejetos equivalente à de 520 mil pessoas. “É a chance de transformarmos um passivo ambiental em um negócio lucrativo para todos”, afirma o superintendente de Itaipu. O sistema funcionará no modelo de ciclo fechado (leia o quadro ao final da reportagem) e contempla também a construção de uma usina termelétrica que vai receber os 12 mil m³ de biogás gerados diariamente nas pequenas granjas.
O volume é suficiente para abastecer os prédios públicos, escolas e também para iluminar ruas e praças, o que representaria uma economia anual de R$ 385,4 mil nos gastos da administração municipal. Ainda não está definido o que será feito com o excedente de produção de biogás e energia, estimada em 44% da capacidade da usina. Entre as opções constam a venda para a Copel, sua utilização como gás natural renovável (GNR), para o abastecimento da frota de veículos de Entre Rios do Oeste, ou a construção de uma rede para uso doméstico em aquecedores de chuveiros ou fogões. A segunda fase prevê a implantação de um sistema de coleta de esgoto, cujo gás também vai ser canalizado para a termelétrica.
A participação de Itaipu nesse programa vai muito além do interesse em fazer bonito na área socioambiental. De acordo com Bley Junior, a empresa está cuidando de seu próprio futuro. Como o principal insumo da usina é água, a conservação de rios e nascentes da região é vital nesse processo. Segundo ele, o descarte incorreto de dejetos altera a qualidade da água, podendo, no limite, comprometer o funcionamento da usina. “Cerca de 70% dos rios da região Centro-Sul do País sofrem o processo de esverdeamento da água, conhecido como eutrofização pelos especialistas, causado pelo excesso de poluentes “Nossa matéria-prima é a água e para nós, quanto mais limpa ela for, melhor”, diz Bley Junior.