02/12/2022 - 0:20
Ele parece não ter fundo. Na verdade, ninguém tem ainda a real dimensão de até onde vai. Nem mesmo os técnicos do governo que saem agora no final do ano. Muito menos os que estão para assumir o rojão. Existem estimativas preliminares e a conta assombra. O ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles já calculou em algo perto de R$ 400 bilhões o montante. Caso sejam adicionados os chamados “riscos fiscais” — aquelas pendências que podem gerar despesas monstros para a União — o valor alcança a estratosfera. Na soma da dívida ativa com as ações judiciais em andamento esse número se aproxima de R$ 5 trilhões e cresceu nada menos que R$ 697 bilhões em apenas um ano. A informação foi lançada no Relatório de Riscos Fiscais da União elaborado pelo próprio Ministério da Economia. Bom lembrar que tais riscos estão relacionados normalmente a programas governamentais, passivos contingentes e balanço patrimonial do setor público e, portanto, ocorrem de maneira irregular, por diversas formas, a depender das decisões do mandatário que conduz o Estado. As ações contra a União, por exemplo, cresceram assombrosamente neste ano — quase 36% em relação a 2023 — batendo a casa de R$ 2,9 trilhões. Mas, no plano da esbórnia financeira cotidiana, são bem conhecidos os abusos, retratados especialmente no chamado orçamento secreto, além das benesses sem fim a setores e interferências populistas eleitoreiras como ocorreram no caso dos combustíveis e da energia. Bolsonaro tentou de tudo e o estrago ficou para ser pago por quem assumirá no seu lugar. A luta da equipe de transição junto ao Congresso é justamente quanto ao tamanho do cobertor para cobrir esses buracos e ainda deixar alguma sobra para o mínimo de gestão operacional. Definitivamente não é possível ignorar que o País foi vergado pela má administração dos últimos tempos e se encontra em situação de penúria em áreas essenciais, necessitando vitalmente de recursos para se reabilitar. Caso das pastas de Educação, Saúde, Ciência e Tecnologia e de tantas outras. No plano social então, nem se fala. A herança maldita é estatística. Mais miseráveis, muito mais pessoas passando fome, sem o essencial. A proposta original do orçamento encaminhada ao parlamento é uma falácia. Inexequível. Até mesmo a conta de salários dos servidores terá de ser revisto, dada a pressão por aumentos que estão sustados há anos. O tamanho da pressão de compromissos é significativo. O próprio relator da comissão que trata do assunto no Congresso, senador Marcelo Castro, diz que uma PEC da ordem de R$ 80 bilhões, como sugerida por colegas, será insuficiente para tantas demandas represadas. O mercado se assombra com o que classifica de irresponsabilidade fiscal qualquer proposta que siga furando o teto, como vem ocorrendo de tempos para cá, embora haja pouco espaço para saídas. A contabilidade criativa entregue pelo governo Bolsonaro foi um fardo pesado demais para carregar. Como moeda de troca para reconstruir sua base de apoio, ele promoveu a gastança. O vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, que tem uma interlocução firme com a iniciativa privada, aponta que quem apostar na irresponsabilidade fiscal daqui para frente “vai errar”. Serão buscadas, no seu entender, novas âncoras de controle, lastreadas na dívida, não esmagando os investimentos. Ou seja: o foco estará em conter o aumento da curva da dívida ao longo do tempo na sua relação com o PIB. Algo que o presidente Lula já fez lá atrás quando pegou a dívida em 60% do PIB e a reconduziu para 40% do PIB. A nova regra de ancoragem não deverá estar inscrita na Constituição, segundo defendem os técnicos da equipe.
Carlos José Marques
Diretor editorial