11/11/2016 - 17:00
Durante os quase oito anos em que esteve à frente da Casa Branca, Barack Obama trabalhou duro para conseguir transformar suas propostas em um legado. Herdeiro de um governo problemático, marcado pelas cicatrizes da Guerra no Iraque e da crise financeira de 2008, Obama chegou à presidência como símbolo de esperança para reconciliar o país domesticamente e com o exterior. Junto de sua carismática família, reaproximou os Estados Unidos do resto do mundo, derrubando a imagem de soberba que os americanos carregavam nos anos Bush.
Reformulou o sistema de saúde pública, colocando em ação o Obamacare, medida que atende 20 milhões de pessoas. Pôs fim a um dos resquícios da Guerra Fria, sendo o primeiro presidente americano a pisar em Cuba, após 88 anos, e iniciar conversas para acabar com o embargo econômico que já dura 54 anos. Obama tirou o país da recessão econômica e aprovou o grande acordo comercial, a Parceria Transpacífico (TPP na sigla em inglês), que reúne 12 países responsáveis por 40% do PIB global. Seu legado, no entanto, pode estar por um fio. Com apenas uma canetada, o futuro líder da Casa Branca, o presidente eleito Donald Trump pode enterrar grande parte das conquistas de seu antecessor.
“O Trump defende uma política comercial que pode anular os ganhos conquistados por Obama nos últimos anos”, diz Roberto Abdenur, embaixador do Brasil em Washington entre 2004 e 2006. As divergências políticas entre o futuro e o atual presidente são gritantes. Trump afirmou que acabaria com tratados comerciais que tirassem empregos dos americanos. Entre eles, a Parceria Transpacífico, aprovado por Obama em uma espécie de medida provisória, que aguarda ratificação no Senado – agora com maioria republicana.
O democrata, que se empenhou ostensivamente na campanha de Hillary Clinton e amargou a derrota com ela, corre contra o tempo. Os últimos dois meses de seu mandato serão focados na aprovação de três pontos cruciais ao seu legado: garantir a nomeação de Merrick Garland como novo juiz do Supremo Tribunal; selar o acordo TPP e fechar a prisão de Guantánamo, em Cuba, uma promessa de sua primeira campanha presidencial. A trajetória de Obama na Casa Branca, por si só, é um marco histórico. Primeiro negro a se tornar presidente dos Estados Unidos, em menos de um ano ele foi contemplado com o Prêmio Nobel da Paz por reforçar o papel da diplomacia internacional e a cooperação entre os povos.
Para honrar a nomeação e uma de suas promessas de campanha, em 2010, ele iniciou a retirada das tropas americanas do Iraque. Em 2015, porém, retomou os ataques aéreos no local, para combater o Estado Islâmico. No âmbito econômico, quando assumiu a presidência, encontrou um ambiente altamente recessivo, com o desemprego batendo os 13% e o PIB em 2,8% negativos. Embora a renda média dos americanos não tenha aumentado, a economia está estabilizada: o desemprego está na casa dos 4,8% e o PIB voltou a crescer na média de 1,5% ao ano.
“Agora, a situação é incerta, porque o ritmo futuro da economia americana dependerá se Trump cumprirá suas promessas de campanha”, diz Marie Albert, economista da Coface, seguradora francesa de crédito. “O risco de queda não é descartado. Um aumento de incerteza política nos EUA resultaria uma perda de até 1,5 ponto percentual do PIB americano em um ano.” Além de recuperar a fragilizada economia, Obama lutou contra a forte oposição, que, desde 2011, enfraqueceu seu governo. Aumentou os cuidados de saúde públicos nos EUA, reduzindo o número de adultos sem seguro de 18% para 11%. Também limitou a dependência energética no Oriente Médio, diminuindo a importação de 33% para 25% do consumo total no país.
No contexto global, reduziu o intervencionismo dos EUA ao assinar o acordo nuclear com o Irã. Domesticamente, deu voz às mulheres com a nomeação das juízas Elena Kagan e Sonia Sotomayor para a Suprema Corte. E aprovou o casamento entre pessoas do mesmo sexo. “Certamente, o maior legado que Obama deixou aos EUA foi quebrar as barreiras do racismo e se tornar presidente”, diz Laura Carlsen, diretora do Center for International Policy, de Washington. “Ele incluiu as minorias, organizou a economia nacional e tornou os EUA simpáticos ao mundo.” Obama deixará a Casa Branca com uma aprovação de 55% da população. E usará seu carisma para pedir à opinião pública que não deixe que seus feitos sejam atropelados por Trump.
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Yes, he can!
Primeiro presidente negro da história da Casa Branca, Barack Obama sai de cena com a popularidade em alta, sendo aprovado por 55% da população. Suas conquistas ao longo dos últimos oito anos foram um marco para o país, relembre algumas:
• Obamacare: 20 milhões de americanos passaram a ter cobertura de saúde, com o seguro público
• Legalizou o casamento entre pessoas do mesmo sexo
• Retomou as relações com Cuba (mas não desativou a base militar de Guantánamo)
• Firmou acordo nuclear com o Irã e reduziu o intervencionismo comercial
• Reduziu o desemprego de 13% para 4,8%
• Nomeou duas mulheres, Elena Kagan e Sonia Sotomayor, para a Suprema Corte
• Avançou com o acordo de parceria comercial TPP
• Retirou soldados do Iraque (embora tenha retomado os bombardeiros posteriormente)
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Seu legado pode ser desfeito nas Mãos de Donald Trump
As promessas do futuro presidente republicano podem pôr fim em algumas conquistas de Obama:
• Fim da estabilidade comercial com a China, com a promessa de implantação de taxas de importação
• Conflito diplomático com o Irã por armas nucleares
• Conservadorismo elevado
• Fim do Obamacare, por considerar que prejudica o mercado e gera menos concorrência no setor
• Prometeu não levar adiante o acordo TPP
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