17/06/2016 - 20:00
A campanha pela saída ou permanência do Reino Unido na União Europeia (UE), cujo referendo será realizado na próxima quinta-feira 23, virou caso de polícia. Na quinta-feira 16, a deputada Jo Cox, do Partido Trabalhista, contrário à saída do país do bloco, foi brutalmente assassinada enquanto deixava um ato da campanha na biblioteca de Birstall, na Inglaterra. Policiais locais prenderam um suspeito de 52 anos, apontado como autor do crime. Acreditava-se, até o fechamento desta edição, que a motivação tenha sido exclusivamente política, pois testemunhas afirmaram tê-lo ouvido gritar “Britain first!”, lema de nacionalistas radicais. O ataque levou à suspensão das campanhas e mostrou, de forma cruel, como os nervos estão aflorados por conta do referendo. Uma tarefa nada simples para o primeiro-ministro David Cameron, líder do Partido Conservador, que lida com uma das mais emblemáticas votações, que pode fazer de junho de 2016 um mês histórico para o estado formado por Inglaterra, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte. Até o momento, porém, ninguém arrisca antecipar um resultado.
A proximidade do referendo, nomeado de Brexit – uma mistura, em inglês, das palavras british e exit –, e o avanço de quem apoia a saída do Reino Unido têm agitado e preocupado, também, o mercado sobre o futuro da Europa. Pesquisas de intenções de voto mostram que a possibilidade da desintegração do bloco europeu é cada vez maior. Um levantamento publicado em 14 de junho mostrava que os eleitores favoráveis à saída somavam 47% das intenções de votos, contra 40% dos que acreditam que permanecer é a melhor opção. Apesar dessa vantagem, especialistas avaliam que o grande número de indecisos (13%) indica uma votação que será decidida nos detalhes. “Como em todo divórcio, ambas as partes têm a perder com a separação”, diz Maurits van Rooijen, reitor da London School of Business and Finance. “Os favoráveis ao Brexit acreditam que o Reino Unido irá se recuperar rapidamente. Os contrários avaliam que não vale a pena correr o risco.”
Estudos da London School of Economics indicam uma retração de até 3% no PIB do Reino Unido, caso a decisão seja pela saída da União Europeia. Isso aconteceria em razão das necessidades de renegociação de acordos comerciais, bilaterais ou multilaterais, e da queda dos investimentos diretos. Em defesa da permanência, Cameron e o atual prefeito de Londres, Sadiq Khan, do Partido Trabalhista, acreditam que o estado é mais forte com o bloco, já que 50% dos investimentos recebidos pelo Reino Unido vêm dos países da UE. Além disso, eles apontam que a eventual saída do bloco regional poderá causar efeitos econômicos irreparáveis, como a perda de 820 mil postos de trabalho. “Deixar a União Europeia é como trair os valores britânicos”, disse Khan, em recente pronunciamento. Do outro lado, o ex-prefeito de Londres, Boris Johnson, e a maioria do Partido Conservador, argumentam que o controle das políticas migratórias e da abertura da economia só será possível sem as amarras dos acordos fechados em bloco. A crise migratória no continente é um dos motivos do aumento do apoio popular em favor da independência.
O mercado financeiro assiste com atenção a escolha dos britânicos. A reunião do Federal Reserve , o banco central americano, foi diretamente influenciada pelo Brexit. Preocupados com as consequências que o referendo pode provocar no comportamento global e a necessidade de um aperto monetário, os juros dos Estados Unidos permaneceram inalterados, na faixa de 0,25% e 0,5%. Essa incerteza tem reflexos, também, no desempenho dos principais índices das bolsas de valores européias. Assim que foi divulgada a pesquisa mostrando que a tendência à saída era mais popular, os investidores reagiram. O índice FTSEurofirst 300 (que reúne as principais ações do continente) fechou com queda de 1,9%, menor nível desde 24 de fevereiro, e o índice Financial Times, em Londres, recuou 2%. As três principais agências de classificação de risco, Standard & Poor’s, Fitch e Moody’s, afirmaram que o Reino Unido poderá ter sua nota rebaixada caso a população opte pela saída do bloco. “Está claro que o mercado europeu sofrerá impactos caso o sim vença”, diz David Meier, economista do banco suíço Julius Baer. “Não cogitamos recessão na zona do euro, mas, no curto prazo, haverá depreciação cambial e aumento de desemprego.”
Líderes europeus veem a decisão dos britânicos como vital para a existência do bloco político-econômico. No dia 15 de junho, o ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Frank Walter Steinmeir, afirmou que a decisão do Reino Unido terá dois efeitos: a saída pode desencadear uma reação em cadeia de outros membros e a permanência vai aumentar os esforços para manter o bloco unido. Além dos britânicos, a União Europeia conta com movimentos contrários ao bloco na França e na Grécia.