A história das grandes invenções é feita de lamentáveis injustiças envolvendo o Brasil. O francês Hercules Florence inventou a fotografia em Campinas (SP) anos antes do conterrâneo Joseph Nicéphore Niépce, mas poucos ouviram falar dele na Europa. O brasileiro Santos Dumont, pai da aviação no Brasil, nem é citado em livros de história do Exterior, que atribuem aos americanos irmãos Wright a invenção voadora. O padre brasileiro Landall de Moura, inventor do rádio, não é lembrado lá fora pela criação do aparelho, atribuído ao italiano Guglielmo Marconi. Agora, numa jogada oportunista, o empresário Eugênio Staub se lançou ao panteão dos heróis da Pátria ao clamar pela criação do iPhone em 2000, sete anos antes do genial Steve Jobs lançar o smartphone mais revolucionário e popular do mundo.

 

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Staub, da Gradiente: ”Estamos abertos ao diálogo”  x  Tim Cook, CEO da Apple: sucessor de Steve Jobs,

morto em 2011, terá que encarar a Gradiente

 

Segundo Staub, presidente do conselho da Gradiente, o iPhone brasileiro foi criado durante uma reunião entre ele e outros três executivos da empresa. Eles estavam juntos para pensar em nomes para um tipo de equipamento que, acreditavam, teria o potencial de revolucionar o mercado de tecnologia. Os executivos, diz Staub, imaginavam que a tendência do mercado seriam celulares com conexão à rede mundial de computadores. Qual seria a melhor marca? “Alguém, talvez eu mesmo, sugeriu contrair as palavras internet e telephone”, afirma Staub. O nome “G Gradiente Iphone” foi solicitado ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) no ano 2000, mas o lançamento do aparelho só foi realizado na semana passada. 

 

Isso depois de a Apple ter vendido mais de 250 milhões de iPhones, com os quais faturou US$ 150 bilhões. Steve Jobs não está mais entre nós, mas o iPhone verde-amarelo, enfim, chegou. Por incrível que pareça, a Gradiente lançou na terça-feira 18 uma linha de smartphones chamada Família IPHONE, grafado com as letras todas maiúsculas, cujo primeiro modelo é o Neo One. A Gradiente justificou o uso da marca consagrada pela empresa de Jobs: é dela o registro do nome IPHONE no País, investimento que custou R$ 1,22 mil em valores atualizados. A autorização foi obtida no Inpi em 2008, oito anos depois de feita a requisição visionária. 

 

Quando perguntado sobre os motivos que levaram a Gradiente a não lançar antes equipamentos com essa marca – ou até a reivindicar seus direitos perante a Apple – Staub diz que a empresa estava focada em sua reestruturação. “Tínhamos outras prioridades”, afirmou à DINHEIRO. O ano de 2012 marcou a volta dos produtos da Gradiente às prateleiras do varejo, quase cinco anos depois de quebrar, com dívidas de R$ 500 milhões. Segundo Silvia Rodrigues, diretora de marcas do Inpi, o registro para a Gradiente foi publicado na revista do INPI, espécie de Diário Oficial da instituição. A demora na aprovação se deu em função de entraves com outra marca, o Aiphone Kabushihi Kaisha, registrado por uma empresa japonesa homônima em 1975. 

 

“Como não houve uso dessa marca, a Gradiente passou a ser detentora”, diz Silvia. O fato é que a fabricante resolveu fazer uso do nome agora para não perder esse direito. Isso porque, pela lei, se uma marca não for usada por cinco anos, ela pode ser contestada e passar às mãos de outra empresa ou pessoa física. O prazo final para lançar um produto se encerraria em janeiro próximo. O smartphone da Gradiente mira um público de menor poder aquisitivo, bem diferente do iPhone da Apple. Com preço de R$ 599, o aparelho vem com a capacidade para duas linhas no aparelho (dual chip) e tem configuração mais modesta. O sistema operacional é o Android 2.3, lançado em 2010 pelo Google. Agora, pairam dúvidas sobre o desenrolar jurídico dessa história. 

 

A Gradiente será ousada o suficiente para tentar barrar a venda do produto da Apple no mercado brasileiro ou exigirá uma compensação financeira? Como a concorrente americana vai reagir? Como está não pode ficar. “As duas marcas não poderão conviver, pois isso prejudica o consumidor”, afirma André Ferreira de Oliveira, advogado especialista em propriedade industrial. “É uma situação delicada, porque iPhone é uma marca mundialmente conhecida como sendo de propriedade da Apple”, diz Oliveira. De sua parte, Staub afirma que não quer desafiar a todo-poderosa Apple. “Quero apenas proteger nosso direito. Estamos abertos ao diálogo, embora a Apple nunca nos tenha procurado”, disse o pai do Iphone brasileiro. Ah, bom.

 

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