11/11/2016 - 17:00
Desde que assumiu o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços, há seis meses, Marcos Pereira, 44 anos, tem escutado todo tipo de reclamação. Afinal, a sua pasta é a que tem a maior interlocução com os representantes da indústria e do comércio nacional, os setores mais afetados pela crise econômica brasileira. E os pleitos vão desde o fim da burocracia, que atrasa o desenvolvimento das companhias do País, até a necessidade de aprovar as medidas econômicas como a PEC 241 e a reforma da Previdência. Presidente licenciado do PRB, partido do prefeito eleito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella, Marcos Pereira parece estar ouvindo atentamente os pedidos dos representantes do PIB. Nesta entrevista à DINHEIRO, ele revela o que pensa sobre as deficiências do Estado, que atrapalham a competitividade das empresas, defende o fim de subsídios e aposta todas as suas fichas nas aprovações das reformas. “São medidas amargas, mas, para doentes crônicos, você precisa de remédios eficazes”, diz Pereira. E prossegue. “Espero que o Congresso esteja maduro o suficiente para entender o que o Brasil precisa.” Ele também se posiciona sobre as negociações do Mercosul com a União Europeia, fala sobre o reconhecimento da China como economia de mercado e pede cautela em relação a Donald Trump, que acaba de se eleger presidente dos Estados Unidos. “Ele falou muito em protecionismo na campanha, mas agora precisamos ver o que fará”. Acompanhe:
DINHEIRO – Como o senhor observa a chegada de Donald Trump à presidência dos EUA?
PEREIRA – Não teremos problema de relação, o Brasil sempre se deu bem com os Estados Unidos. O próprio presidente Temer falou isso.
DINHEIRO – Mas Donald Trump sinalizou que adotará políticas protecionistas…
PEREIRA – Precisamos esperar um pouco. Ele falou muito em protecionismo na campanha, mas agora é necessário ver o que fará. A questão do protecionismo vem sendo muito discutida por todos os países. O mundo inteiro está falando sobre isso. E hoje o nosso principal parceiro comercial é a China.
DINHEIRO – Aliás, uma questão que preocupa os empresários é o reconhecimento da China como economia de mercado. O prazo expira em dezembro. O Brasil vai reconhecer?
PEREIRA – O prazo é 11 de dezembro. Não posso adiantar se reconheceremos a China como economia de mercado porque estou discutindo isso com o presidente, com o Itamaraty, com os demais ministros que fazem parte da Camex (Câmara de Comércio Exterior). Mas o Brasil tem histórico de cumprir com os seus compromissos, quando assumidos em organismos internacionais. Esse foi um compromisso assumido no âmbito da OMC (Organização Mundial do Comércio) e a gente vai ter que se posicionar.
DINHEIRO – O Brasil ficou de fora de acordos comerciais como o TPP (Parceria do Transpacífico). O que o ministério está fazendo para botar o Brasil novamente no mapa do comércio mundial?
PEREIRA – Estamos trabalhando, com a autorização e a orientação do presidente Temer, para reinserir o Brasil no cenário internacional. Estamos trabalhando para voltar a dialogar com os principais parceiros comerciais, os Estados Unidos, a União Europeia, os países do Pacífico, o Canadá.
DINHEIRO – Em que estágio estão as negociações o acordo do Mercosul com a União Europeia?
PEREIRA – Tivemos uma rodada de negociações, entre 10 e 14 de outubro, em Bruxelas, e teremos outra rodada em Montevidéu, no primeiro trimestre de 2017. Foi feita a lista, a troca de ofertas, e a Europa não incluiu etanol e carne bovina. Eu, nas reuniões bilaterais que tive com alguns ministros europeus em Xangai, pedi para que eles inserissem carne bovina e etanol. Existem resistências, sobretudo, da França e da Irlanda. Há uma boa vontade deEspanha, Itália e Portugal. O ministro de comércio da Espanha acredita que poderemos concluir isso já no ano que vem. Eu já acho difícil por conta das eleições na Alemanha e na França em 2017. Quando você tem um calendário eleitoral, querendo ou não, atrasa um pouco a discussão. Mas estamos otimistas e empenhados para concluir isso em 2018. É importante ressaltar que essa lista e troca de ofertas está sendo discutida com o setor produtivo para que depois não haja reclamação de um setor ou um produto tenha ficado de fora. É também importante ressaltar que, quando você abre o mercado, você atrai a concorrência. Por isso estamos costurando com o setor produtivo. Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai estão muito empenhados nessas negociações. A Venezuela não participa dessa negociação.
DINHEIRO – Qual é o maior entrave para a conclusão do acordo?
PEREIRA – É justamente chegar num consenso sobre a lista de produtos e o prazo para que haja o desgravamento das tarifas. Nós queremos mais prazo, haja vista a nossa falta de competitividade em alguns setores.
DINHEIRO – Recentemente, o presidente de uma montadora alemã deu uma entrevista dizendo que o Brasil precisa parar de dar subsídios para as empresas, para que elas sejam mais competitivas. Que políticas o ministério poderia incentivar para tornar as empresas nacionais mais inovadoras e competitivas?
PEREIRA – Acho que o Brasil tem uma série de coisas para rever e eu tenho batido muito nessa tecla junto ao governo. As empresas brasileiras não são competitivas, principalmente, por causa do “custo Brasil”. Esse custo Brasil tira a competitividade das empresas. Cito, por exemplo, a famigerada e debatida NR12, que trata da segurança do trabalho nas indústrias, nas máquinas. Uma máquina produzida na Alemanha precisa ser adaptada para vir para o Brasil. Do jeito que ela é produzida, ela serve para operar em qualquer lugar do mundo, na Europa, nos EUA, no Japão. Mas para o Brasil ela precisa ser adaptada. Isso exige mais tempo e mais custo. As empresas brasileiras, a meu ver, são criativas e podem surfar na inovação. Mas a gente vem de um legado não muito bom de subsídios e de muitos incentivos. Isso tira a competitividade das empresas brasileiras.
DINHEIRO – A burocracia também atrapalha…
PEREIRA – Sim. Essa máquina de imposição de obrigações acessórias também tira a competitividade do País. De acordo com o relatório Doing Business, do Banco Mundial, uma empresa brasileira gasta 2.600 horas para cumprir obrigações acessórias. Recebi o presidente da Huawei do Brasil (empresa chinesa de tecnologia) e ele me disse que tem 100 funcionários na contabilidade para cumprir com as obrigações, trabalha de forma intensa, e no final do dia o fiscal ainda vem e autua a empresa. Eles não sabem ao certo as regras, não há clareza. Se nós desburocratizarmos e criarmos uma melhora no ambiente de negócios, isso reduz o custo Brasil, aumenta a competitividade e as empresas poderão inovar. A falta de competitividade está nas burocracias, nos sistemas tributário e trabalhista. O empresário brasileiro tem capacidade para desenvolver, inovar e ser competitivo, mas o Estado tem de facilitar o ambiente de negócios.
DINHEIRO – E o que o senhor tem feito nesse sentido?
PEREIRA – Conversei muito com o presidente Temer sobre isso, porque essa é uma demanda que recebo muito de todo o setor produtivo e do comércio. Ele determinou, no dia em que tomou posse em definitivo, que todos os ministérios verifiquem o que é desburocratizável e desburocratizem. No nosso ministério, estamos coordenando a criação do Portal Único do Comércio Exterior, uma obrigação assumida pelo Brasil junto à OMC. Essa seria hoje a principal medida coordenada pelo ministério com 22 órgãos do governo envolvidos, como a Receita Federal, Ministério da Agricultura, Ministério da Fazenda. Enfim, todos os envolvidos nos processos de importação e exportação. A ideia é implementar, ainda neste ano, o módulo exportação modal aéreo; no próximo semestre, o módulo exportação marítimo terrestre, e, no segundo semestre do ano que vem, o módulo importação. Até o final de 2017, estará pronto. Isso vai reduzir o tempo de importação e exportação em até 40%. O prazo médio de exportação, que hoje é de treze dias, vai cair para oito dias. O prazo de importação será reduzido de dezessete dias para dez dias. De acordo com um estudo da Fundação Getúlio Vargas, vai gerar uma economia anual de US$ 23 bilhões. Vai zerar o uso de papel e vai enquadrar o Brasil nos padrões da OCDE.
DINHEIRO – Uma das questões muito debatidas pelos exportadores é o câmbio. O senhor tem discutido isso com a equipe econômica? Qual seria o câmbio ideal?
PEREIRA – Se você conversar com um exportador, o câmbio ideal é acima de R$ 3,50. Se você conversar com um importador, o câmbio ideal é R$ 2. Se você falar com um turista, o câmbio ideal é R$ 1. Não é fácil, não. Temos de deixar o Banco Central cuidar desse tema. Ao passarmos pelas primeiras medidas concretas de ajuste da economia, a começar pela PEC 241 e depois pela reforma da Previdência, esses índices vão se ajustar de forma natural.
DINHEIRO – O senhor está otimista com as reformas econômicas?
PEREIRA – Estou otimista. São medidas amargas, mas, para doentes crônicos, você precisa de remédios eficazes. Existe um estudo da FIESP mostrando que, se tivéssemos tomado essa medida há dez anos, hoje a dívida seria de R$ 1 trilhão e não de R$ 3 trilhões como agora. São medidas necessárias. O partido do qual sou presidente licenciado está cooperando, votamos majoritariamente com a PEC e vamos contribuir com o que pudermos para aprovar as medidas.
DINHEIRO – O senhor é a favor da reforma trabalhista?
PEREIRA – Eu sou a favor de uma modernização da reforma trabalhista, da máquina administrativa, de todo o sistema público e regulatório. Temos que enfrentar o debate com diálogo.
DINHEIRO – O senhor acredita que as reformas passarão no Congresso?
PEREIRA – Honestamente, espero que passem. Espero que o Congresso esteja maduro o suficiente para entender o que o Brasil precisa.
DINHEIRO – Qual é o maior pleito dos empresários hoje?
PEREIRA – O setor produtivo reclama por uma desburocratização, pela melhora do ambiente de negócios, e por clareza nas regras. Isso tira a segurança jurídica e a previsibilidade do empresário para poder investir. Outra demanda importante é a necessidade de o Brasil fazer um novo Refis. Muitos empresários não têm hoje certidão negativa de débitos porque estão inadimplentes. Tenho defendido junto ao Ministério da Fazenda que temos de diferenciar o sonegador de impostos do inadimplente. O sonegador tem que ser identificado e tratado como tal. O inadimplente é aquele que, por circunstâncias da economia e da crise, não conseguiu pagar os impostos e pede uma oportunidade de refinanciar isso.
DINHEIRO – Quando o será o ano da retomada?
PEREIRA – Acredito que o ano que vem. Todos os analistas apontam para o início da retomada da economia. O mais conservador, que é o FMI, fala em 0,5%. Os mais otimistas falam em 1,6%, 1,7%. Mas os dois cenários, tanto o mais conservador como o mais otimista, apontam para um crescimento. Agora, em relação aos investimentos da indústria, acredito que a retomada vem em 2018. Isso porque a indústria está com a capacidade ociosa, não há porque investir se está ociosa. Mas o ano de 2018 será da retomada a depender das medidas que vamos tomar. É fundamental aprovar a PEC 241 e a reforma da Previdência para que o empresário aumente a confiança que já tem no governo.
DINHEIRO – É fundamental aprovar as reformas, mas a Lava Jato tem assombrado o governo. Muitos colocam em dúvida a força do Planalto em aprovar as medidas diante das delações que vêm pela frente como a da Odebrecht. Como o senhor está lidando com isso?
PEREIRA – Estou trabalhando de forma muito tranquila. Precisamos separar o que foi financiamento de campanha, seja oficial, seja caixa dois, que é uma discussão que o Congresso e a sociedade terão de fazer. Outra coisa são membros do governo serem pegos com contas no exterior, dinheiro pessoal. Essas pessoas, a meu ver, estarão mais complicadas do que outras que possam ser citadas por dinheiro de campanha. Ambos têm lá suas preocupações. Mas é difícil falar sobre isso porque não sabemos o que vem. Não tenho muita preocupação de que isso possa atrapalhar as medidas que precisam ser tomadas. A PEC 241 será aprovada neste ano e a reforma da Previdência no ano que vem.