Eram 11h25 da segunda-feira 2 quando a presidenta Dilma Rousseff deu início à cerimônia de assinatura do primeiro contrato de partilha do pré-sal. No Salão Nobre do Palácio do Planalto, o clima era de festa, com a presença dos executivos da anglo-holandesa Shell, da francesa Total e das chinesas Petrochina e CNOOC, além da presidenta da Petrobras, Graça Foster, e do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. “É lucrativo participar de um campo que tem como reservas estimadas entre 8 e 12 bilhões de barris de óleo equivalente”, disse a presidenta Dilma. “Afirmo, sem receio, que a exploração do Campo de Libra é um ótimo negócio.” 

 

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Cálculo difícil: Graça Foster (ao centro), entre o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão,

e a presidenta da ANP, Magda Chambriard), na cerimônia de assinatura da partilha do pré-sal.

A executiva defende previsibilidade para os reajustes da empresa

 

Naquele mesmo horário, no entanto, os acionistas da Petrobras contabilizavam uma perda de quase 10% no valor dos seus investimentos devido à frustração gerada pelo reajuste dos combustíveis. Era o ápice de uma novela que colocou o governo e a Petrobras em rota de colisão, e que tem o combate à inflação como personagem principal. O enredo começou no dia 25 de outubro, quando a diretoria executiva da Petrobras anunciou, por meio de um fato relevante, o debate sobre uma “metodologia de precificação através da qual se tenha maior previsibilidade do alinhamento dos preços domésticos”. 

 

O mercado apelidou o mecanismo de “gatilho”, nome imediatamente rechaçado pelo governo por remeter aos tempos sombrios de hiperinflação. No pregão seguinte, as ações da empresa subiriam 7,6%. Poucos dias depois, em resposta a um pedido da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a Petrobras trouxe mais detalhes sobre o tema que seria debatido na reunião do Conselho de Administração, no dia 22 de novembro, posteriormente remarcada para o dia 29 do mesmo mês. Naquele momento, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que também preside o conselho da estatal, afirmou que a fórmula não estava pronta. 

 

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Luiz Moan, presidente da Anfavea: “A política de preço ideal

é a que traz o preço real nas bombas”

 

“Estamos desenvolvendo essa metodologia, que é uma coisa séria e importante, que não pode ser feita rapidamente, de afogadilho”, disse o ministro, com razão. No total, foram cinco semanas com muitas especulações sobre atritos entre o governo e a estatal. Na quarta-feira 4, a Petrobras emitiu nota negando a saída de sua presidenta do cargo. O estopim dos boatos foi o desfecho da reunião: um reajuste pontual de 4% para a gasolina e de 8% para o diesel, nas refinarias, sem nenhuma pista sobre o “gatilho”. Decepcionados, muitos investidores venderam seus papéis e a Petrobras perdeu, em apenas um dia, R$ 24 bilhões em valor de mercado. 

 

“O anúncio foi muito ruim”, diz Marcelo Torto, analista-chefe da Ativa Corretora. “Os acionistas esperavam mais transparência e um alinhamento dos preços domésticos com os internacionais.” Na conta dos especialistas, a defasagem entre o que a Petrobras paga no Exterior e o preço que é praticado no Brasil chega a 10% para a gasolina e a 30% para o diesel. Como a produção da estatal é insuficiente para atender à demanda dos brasileiros, significa que a companhia tem um prejuízo ao importar o combustível. 

 

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David Zylbersztajn, ex-presidente da ANP: “A Petrobras está sendo

impedida de atuar como uma empresa”

 

“A Petrobras está sendo impedida de atuar como uma empresa de verdade”, afirma David Zylbersztajn, ex-diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP). “Isso pode levar à redução da nota de risco pelas agências.” O problema tende a diminuir conforme a empresa for capaz de aumentar a sua produção. Porém, a própria empresa reconhece que é preciso reforçar o caixa para dar conta do plano de investimentos de R$ 236,7 bilhões, no período de 2013 a 2017. A diretoria não revela o impacto dessa política de preços. Segundo o Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), a Petrobras perdeu R$ 14,1 bilhões nos oito primeiros meses do ano em virtude da defasagem no preço. 

 

O valor equivale a dois terços do lucro total da empresa em 2012, de R$ 21,2 bilhões, e representa mais do que o dobro do que a estatal pagou pela vitória no leilão de Libra. “Nesse ritmo, a Petrobras vai precisar ser capitalizada pelo governo, via Tesouro ou BNDES”, diz o especialista Mauro Kahn, presidente do Clube do Petróleo, entidade do Rio de Janeiro. “O ideal é que ela pudesse buscar um lucro maior para reinvestir no próprio negócio.” Ao vetar um reajuste mais elevado dos combustíveis e adiar para o ano que vem o debate sobre uma fórmula automática, o governo emite um sinal aos agentes do mercado de que a prioridade é o combate à inflação. 

 

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Está caro?: especialistas calculam que a defasagem entre o preço dos derivados de petróleo no mercado internacional

e o praticado no Brasil é de 10% para a gasolina e de 30% para o diesel

 

A decisão, embora atrapalhe a Petrobras, é coerente com o atual momento econômico. A inflação permanece longe do centro da meta, de 4,5%, o que tem levado o Banco Central a elevar os juros. Desde abril deste ano, a taxa Selic subiu seis vezes consecutivas, passando de 7,25% para 10% ao ano. “Se o governo autorizasse o repasse integral da defasagem da gasolina e diesel, a inflação de 2014 pularia para 6,24%”, diz Fabio Romão, economista da LCA Consultores. “O principal vilão seria o diesel, que geraria um efeito cascata no valor do frete em todos os setores.” 

 

Para o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Luiz Moan, “a política de combustíveis ideal é sempre a que traz o preço real nas bombas”. Isso não significa, porém, que o governo deva seguir o sobe e desce diário da cotação do petróleo no mercado internacional. Para tentar contemplar diferentes interesses, como a inflação e o caixa da Petro­bras, os analistas defendem a criação de um mecanismo de reajuste trimestral, que evitaria indexações de curto prazo e, ao mesmo tempo, daria fôlego à estatal. E, de quebra, acabaria com a desconfiança do mercado financeiro. O enrosco, no entanto, permanece sem data para terminar.

 

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Investimento baixo freia o PIB do terceiro trimestre 

 

Porém, números mais recentes já indicam retomada da economia em dezembro

Por Carolina Oms

 

Manifestações que pararam o País em junho e julho, alta do dólar e da taxa básica de juros e desconfiança de empresários e agentes de mercado com as contas públicas e com o programa de concessões de infraestrutura. As consequências para a economia já eram esperadas e foram confirmadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) na terça-feira 3, quando anunciou uma queda de 0,5% no Produto Interno Bruto (PIB) em relação aos três meses anteriores. Na comparação com o mesmo período do ano passado, no entanto, o PIB avançou 2,2%. 

 

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Fim de ano aquecido: dados de outubro sobre a produção industrial vieram acima das expectativas

e sinalizam retomada da atividade econômica

 

“A taxa de crescimento da economia é crescente e vamos chegar a 2,5% neste ano”, disse à DINHEIRO o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Uma das principais preocupações do governo e dos economistas por seu efeito multiplicador na economia, o investimento teve queda de 2,2% entre julho e setembro em relação aos três meses anteriores. A queda de confiança e a alta dos juros são apontadas pelos analistas como as principais responsáveis por essa redução. A comparação com 2012, no entanto, mostra que a parada foi, aparentemente, apenas temporária. 

 

Em relação ao ano anterior, o investimento subiu 7,3%, enquanto o consumo das famílias aumentou 2,3%. “Essa é uma composição mais saudável para a economia”, diz o Bráulio Borges, economista-chefe da LCA Consultores. A agricultura, que vem sendo a locomotiva do PIB, com aumento de produção e alta dos preços das commodities, teve queda pontual de 3,5% em relação ao trimestre anterior e de 1% na comparação anual. O IBGE também revisou o PIB do ano passado, de 0,9% para 1%, abaixo do esperado por analistas e pelo governo, que era em torno de 1,5%. Mantega diz que o instituto ainda fará outras revisões. 

 

Apesar do resultado ruim do terceiro trimestre, indicadores mais recentes mostram que a situação já mudou, confirmando as previsões mais otimistas para a volta do crescimento nos últimos três meses deste ano. Os dados de produção industrial, divulgados pelo IBGE na quarta-feira 4, mostram alta de 0,6% na passagem do mês de setembro para outubro. Foi a terceira alta mensal consecutiva e veio acima das expectativas dos analistas de mercado. No ano, a indústria avança 1,6%. “A produção industrial mostra que a economia voltou a crescer”, diz Borges. E de maneira bem abrangente. Dos 27 segmentos industriais pesquisados, 21 tiveram aumento da produção em outubro. Um bom início do quarto trimestre.