Não se sabe se foi por vingança, vaidade ou por uma legítima vontade de fazer os Estados Unidos “grandes novamente”. O fato é que o bilionário Donald Trump se sagrou vencedor na disputa que travou contra os caciques republicanos e já é, praticamente, o candidato do partido à Presidência da maior economia do mundo. Na terça-feira 3, o senador Ted Cruz, principal oponente do boquirroto empresário nas primárias, desistiu de sua campanha, após uma acachapante derrota no Estado de Indiana.

No dia seguinte, o governador de Ohio John Kasich também se retirou do pleito, deixando Trump como a única opção dos conservadores na provável disputa com Hillary Clinton, virtual candidata do Partido Democrata, nas eleições de outubro. “Este foi um dia e um ano inacreditáveis”, afirmou o bilionário, logo após saber da desistência de Cruz. “Nunca passei por algo assim, mas tem sido lindo de ver. Vamos fazer a América grande de novo.” Desde que anunciou sua candidatura, no dia 16 de junho do ano passado, Trump se tornou alvo de campanhas contrárias tanto do seu próprio partido, quanto da oposição.

Nada foi suficiente. Ele liderou as prévias de ponta a ponta. De início, imaginava-se que sua fonte inesgotável de dinheiro seria sua principal arma. Não foi. Ele gastou menos na campanha do que os oponentes: US$ 47,2 milhões, ante US$ 70,3 milhões de Cruz. Seu sucesso, na verdade, se deve a uma tática de superexposição na mídia, alimentada por declarações polêmicas, algumas vezes racistas, e populistas. Dessa forma, ele conseguiu conquistar parte do eleitorado conservador, que se sente mal representada pelo neoliberalismo atual.

Seu eleitor possui menor renda e menos estudo do que os apoiadores do establishment, segundo pesquisa feita pelo diário The Wall Street Journal. Em grande medida, sua base é formada por trabalhadores que perderam o emprego, ou passaram a ganhar menos, em virtude da terceirização da indústria americana para o sudeste asiático. Não por acaso, um dos seus slogans de campanha é: “Serei o melhor presidente para o trabalho e o emprego que Deus já criou.” O caminho até a presidência ainda será longo e difícil.

Sua vitória causou uma espécie de paralisia entre os republicanos. Dois dias após o resultado de Indiana, o jornal The New York Times tentou contato com 70 representantes do partido. Apenas 20 responderam. Vários líderes afirmaram que não irão apoiá-lo. O senador John MacCain, candidato em 2008 contra Barack Obama, disse que a nomeação de Trump prejudica sua campanha de reeleição para o Senado, em virtude da forte rejeição do bilionário entre os eleitores hispânicos, que representam 30% do total no Estado natal de MacCain, o Arizona.

“Será o pleito da minha vida, caso Trump siga na liderança”, afirmou MacCain. Os dois únicos ex-presidentes republicanos ainda vivos, George Bush, pai, e seu filho George W. Bush, também se posicionaram contra o bilionário. Líderes mundiais começam e se mostrar preocupados. “Ele passou de engraçado para realmente amedrontador”, afirmou, em entrevista recente, Tim Barber, um importante consultor do governo canadense.

Para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, sua eleição seria um desastre. “Trump tem uma visão distorcida do mundo”, disse FHC, ao jornal britânico The Guardian. Para ele, com o bilionário na presidência dos EUA, o Brasil deve se aproximar, ainda mais, da China. “É um fator de incerteza. E o que ele vem dizendo é terrível, particularmente em relação aos latino-americanos”, afirmou o ex-presidente.

Segundo Ilan Goldfajn, economista-chefe do Itaú Unibanco e cotado para a presidência do Banco Central (leia a reportagem aqui), os mercados estão subestimando uma possível eleição de Trump. “São baixas as chances, mas, se for eleito, muitos acreditam que haveria consequências geopolíticas relevantes e aumento abrupto da incerteza econômica”, afirmou Goldfajn, em artigo no jornal O Estado de São Paulo. “Essas incertezas são piores que riscos porque são difíceis de mensurar. Riscos se calculam, incertezas se evitam.”