A liquidação extrajudicial da corretora Corval, de Belo Horizonte, em setembro, pegou muitos investidores de surpresa. A empresa mineira tinha autorização para operar no Tesouro Direto, mas, em vez de usar os recursos dos clientes para comprar e vender títulos públicos, simplesmente desviou o dinheiro. As operações fraudulentas acarretaram prejuízos de mais de R$ 10 milhões para cerca de 110 pessoas até agora. A má notícia é que casos como esse não ficam restritos à Corval. A corretora carioca UM Investimentos, por exemplo, está sendo processada judicialmente pelo pecuarista Delcides Barbosa Borges e por sua esposa, Denise Meireles Dornfeld. 

Ambos a acusam de ter desviado recursos enviados para a compra de ações e de ter perdido quase R$ 900 mil em operações no mercado futuro. Segundo o processo, ao qual a DINHEIRO teve acesso, as irregularidades começaram há sete anos. A trajetória ascendente da bolsa e as perspectivas de crescimento econômico acelerado, que predominavam à época, chamaram a atenção do casal. Moradores de Uberaba, Borges e Denise faziam viagens frequentes a São Paulo, onde residia o filho Renzo. Em uma das visitas, o casal foi convidado a investir em ações através da UM pelo amigo Marcello Giancoli, então sócio da corretora.

Em agosto de 2007, eles assinaram o contrato de intermediação e depositaram R$ 896 mil em duas contas, com a determinação de comprar ações de primeira linha – papéis como Vale, Bradesco e Petrobras. Dez meses mais tarde, no fim de junho de 2008, Borges levou um susto ao receber um telefonema do diretor de riscos da corretora. O pecuarista foi informado que sua conta estava negativa em cerca de R$ 863 mil, e que todas as suas ações tinham sido vendidas para cobrir o prejuízo, decorrente de operações no mercado futuro. Além disso, Borges era instado a enviar mais R$ 100 mil, pois a UM estava cobrando R$ 139 mil de corretagem.

Segundo recomendação de Giancoli, o casal deveria fazer o depósito para evitar cobrança de juros e que seus nomes fossem incluídos no rol de maus pagadores. O sócio prometeu que Borges e sua mulher seriam ressarcidos pelo prejuízo, mas, meses depois, se desligou da corretora. Em 2010, a família entrou na Justiça, exigindo uma indenização que, atualizada, chega a quase R$ 2 milhões. “Foram executadas centenas de ordens de compra e venda na BM&F, como contratos futuros e commodities, que não tinham sido dadas por eles”, diz Luiz Felipe Butori, sócio do escritório paulista Mesquita, Queiroz, Butori e Barreto Advogados, que assessora o casal.

O processo, que tramitou no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, já obteve duas sentenças favoráveis a Borges. A UM Investimentos contesta essa versão e promete recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo a superintendente Fátima Guerra, Borges visitava a UM frequentemente e dava ordens verbais a seu filho Renzo, então funcionário da corretora. Renzo também tinha poder para operar em nome do pecuarista e de sua esposa por meio de um ”mandato tácito outorgado”. Ele começou a trabalhar ali em 16 de julho de 2007 – a convite da UM, segundo o advogado Butori, e a pedido de Borges, de acordo com Fátima.

“Temos gravações de telefonemas que mostram pai e filho conversando sobre operações no mercado futuro, e vamos levar isso ao STJ”, afirma Fátima. Ela afirma que Borges sabia o que estava ocorrendo. “A corretora enviou as notas de corretagem mensalmente, assim como os extratos de todas as operações”, diz. “Além disso, a BM&F manda dados da custódia: será que eles não viram isso durante quase um ano?” Ela questiona a boa-fé dos Borges. “Eles nunca questionaram nada até 2010, quando entraram na Justiça, sentimos que estamos sendo usados.”

Para a relatora Rosa Maria de Andrade Nery, que analisou a apelação da UM, em setembro, o argumento de que Renzo autorizava os investimentos dos pais não pode ser considerado “diante do caráter dos negócios, da fiscalização específica que eles sofrem e, especialmente, por decorrência da responsabilidade objetiva da ré, que assumiu o risco de condutas dissociadas da seriedade do seu mister”. Para quem não conseguiu ultrapassar o juridisquês da juíza: a briga ainda promete. Para não ter problemas semelhantes, a recomendação do especialista Samy Dana é manter um registro das transações, anotando data, quantidade de ações ou títulos negociados e valor. Esse registro deve ser comparado com os extratos e comprovantes.