13/05/2016 - 20:00
Ninguém contesta que o investimento em grandes obras é fundamental para o desenvolvimento econômico. Em seu primeiro discurso como presidente em exercício, na quinta-feira 12, Michel Temer destacou a importância das Parcerias Público-Privadas (PPP), a única saída para viabilizar os empreendimentos bilionários que o Brasil precisa para retomar o crescimento. “Teremos que incentivar, de maneira significativa, as parcerias público-privadas, na medida em que esse instrumento poderá gerar empregos no País”, afirmou o presidente, com toda a razão.
A consultoria Inter.B, uma das mais respeitadas na elaboração de estudos de infraestrutura e logística, calcula que esse potencial tem sido subestimado nos últimos tempos. Se, nos próximos meses, os investimentos forem destravados e dobrarem sobre a base atual, é possível chegar a uma expansão próxima a 4% do PIB em 2017, ao invés da expectativa atual de cerca de 1,5% de crescimento da economia. Os motivos são a quantidade de interessados em investir no Brasil, após a estabilidade política.
No mercado internacional, não há taxas de juros tão atrativas quanto as do mercado brasileiro, assim como projetos em grande quantidade em rodovias, portos, aeroportos e ferrovias. “O eixo do crescimento econômico está na infraestrutura”, diz David Díaz, presidente da Arteris, uma das principais concessionárias de rodovias do País. “Devido à importância e à urgência do momento atual do Brasil, o papel da iniciativa privada é ainda mais importante, pois há dinheiro para mover a economia.”
Existem 13 projetos, de cerca de R$ 20 bilhões, que podem, rapidamente, destravar a economia, como concessões de rodovias, que estão com as obras paralisadas, e o término das ferrovias Oeste-Leste e Transnordestina. Mas, com sete das 10 maiores construtoras nacionais investigadas pela Operação Lava Jato, a dúvida é se faltarão empresas capazes de tocar as grandes obras. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) utiliza um exemplo recente para rebater essa dúvida. No início de novembro do ano passado, o então ministro da Fazenda, Joaquim Levy, consultou a CBIC para saber se haveriam interessados no programa PPP+, um projeto que definia as prioridades nacionais com garantias regulatórias e de financiamento.
Em menos de 48 horas, a entidade mostrou que 84 empresas teriam condições de participar de concorrências públicas. “Se existirem obras, vão ter construtoras interessadas em fazer”, afirma o presidente José Carlos Martins. “Nos últimos tempos, não é que faltaram empresas interessadas na infraestrutura brasileira, faltavam estabilidade e segurança para o financiamento de projetos.” O desafio das construtoras enroladas com a Lava Jato é evitar receber o selo de inidôneas e deixar de participar de obras públicas.
Atualmente, todas estão temporariamente suspensas de entrar em novas concorrências da Petrobras. Na semana passada, a Andrade Gutierrez utilizou um informe publicitário para reconhecer os crimes cometidos por ela e sugerir melhorias na transparência na prestação de serviços entre empresas e o poder público. A publicação é parte obrigatória do acordo de colaboração homologado pelo STF. A construtora pagou uma multa de R$ 1 bilhão para ressarcir os prejuízos com a corrupção.
Antes dela, a Camargo Correa assinou com o Cade um termo de compromisso e pagou mais de R$ 800 milhões em multas. A Odebrecht ainda negocia os termos do seu acordo de delação com a Justiça. “É importante a empresa admitir publicamente que fazia algo errado”, diz Renata Muzzi, sócia na área de compliance de TozziniFreire Advogados. “Mas a boa-fé começa daqui para frente, com as empresas mostrando uma mudança cultural e de atitude.”
Procurada para explicar como foi esse processo de mudança de gestão, a Andrade Gutierrez demostrou que ainda não está totalmente preparada para falar sobre seus problemas e não quis dar entrevista. A atitude da construtora é um retrato da falta de transparência dessas companhias. Além disso, reforça a imaturidade das empresas brasileiras na área de compliance, termo utilizado para definir uma série de normas legais e regulamentos a serem cumpridos pela companhia.
Pesquisa da consultoria KPMG, aponta as dificuldades para se monitorar e prevenir os riscos. Apenas 36% têm um programa há mais de cinco anos. “As empresas, após a Lava Jato, têm tido uma preocupação maior em melhorar suas políticas de compliance”, diz Cynthia Catlett, diretora executiva da americana FTI Consulting. “Um melhor gerenciamento dos riscos de corrupção auxiliará a mitigar ou até mesmo prevenir riscos, de imagem ou financeiro.” Não basta apenas querer construir o País, as construtores terão, primeiro, de se reconstruir.
Colaborou: Paula Bezerra
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