23/03/2011 - 21:00
O terremoto, seguido de um tsunami e da explosão numa usina nuclear na terceira nação mais rica do mundo, jogou por terra toda e qualquer previsão sobre o futuro da economia global.
A tragédia registrada na região nordeste do Japão assusta não somente pelo número de vítimas ? entre 12 mil e 15 mil, pelo menos o dobro do total de mortes do terremoto de Kobe, em 1995 ?, mas também pela angústia com a falta de previsibilidade diante do imponderável, algo que a mente linear do Ocidente não está acostumada a conceber.
Os prejuízos: centenas de contêineres em Sendai foram amontoados após o terremoto e o tsunami de 11 de março
A pergunta de US$ 1 trilhão é até que ponto os países desenvolvidos (que vinham se recuperando da crise de 2008) e os emergentes (que estão a todo vapor) serão afetados pelos desdobramentos da situação japonesa.
?O Japão traz mais incertezas ao cenário global?, disse o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, na quinta-feira 17. ?Ninguém consegue enxergar uma tendência evidente e clara neste momento?, afirma Paulo Molinari, economista da consultoria Safras & Mercados, especializada em commodities.
Estão em jogo investimentos, o comércio global de bens e serviços e a produção de energia em todo o mundo. Os preços dos produtos agrícolas, por exemplo, estão em queda desde o tsunami do dia 11 de março, o que indica temores de desaceleração econômica global.
O problema é que o terremoto no Japão veio na sequência da crise nos países árabes, que havia jogado a cotação do petróleo às alturas, acima de US$ 100 o barril. As explosões na usina nuclear de Daichii, na província de Fukushima, reacenderam o debate sobre a viabilidade dessa fonte de energia ?limpa?.
Com mais incertezas no cenário, houve abalo na confiança dos investidores e as bolsas de valores globais desabaram e registraram seguidos prejuízos ?as perdas de valor de mercado das empresas superaram US$ 1 trilhão num primeiro momento.
Obviamente, sempre há excessos nos mercados financeiros em momentos de alta tensão, quando as especulações aumentam e fortunas são perdidas e criadas em questão de segundos.
No Brasil, o ambiente já estava relativamente pesado nas últimas semanas por conta da alta da inflação, dos juros e das dúvidas quanto à eficácia dos cortes de gastos do governo. Com esse clima propício a boatos, houve até quem espalhasse que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, homem de confiança de Dilma Rousseff na economia, estaria na frigideira do Palácio do Planalto.
A presidente, percebendo a delicadeza do momento nacional e global, resolveu cortar o mal pela raiz e saiu em defesa de Mantega. Na quarta-feira 16, deu entrevistas a jornais paulistas para defender seu ministro e sua política de combate à inflação. ?Tenho absoluta confiança no Mantega”, afirmou Dilma.
“Não vou aceitar nenhuma tentativa de diminuir a importância dele em meu governo.? E foi além, defendendo a autonomia do Banco Central. ?Não vou permitir que a inflação volte ao País?, insistiu.
Fez bem: blindar a economia é essencial em situações como a atual, como fez o presidente Lula na crise de 2008 ao estimular o crédito e convocar os brasileiros a consumir ? por sugestão, aliás, de Mantega.
O fato é que o cenário de crescimento, fortemente baseado no mercado interno, não muda no País. ?Tenho certeza de que o Brasil vai crescer entre 4,5% e 5% este ano?, afirmou Dilma.
Do outro lado do oceano Atlântico, a reação em favor da estabilidade econômica também foi imediata. Num movimento que já está sendo chamado de ?A Grande Barganha?, a União Européia e o Fundo Monetário Internacional decidiram aumentar em E 300 bilhões o pacote de ajuda imediata aos países em dificuldades, como Grécia, Espanha e Portugal, para E 765 bilhões.
Enquanto os mais fracos tentam se proteger, os mais fortes buscam oportunidades de negócios surgidas no Japão. Empresas dos Estados Unidos, da China, da Alemanha e de outras regiões já se candidatam aos trabalhos de reconstrução das áreas devastadas, num cenário parecido ao de 65 anos atrás.
O tsunami ? ?a pior catástrofe desde a Segunda Guerra?, nas palavras dramáticas do premiê japonês Naoto Kan ? vai resultar em novos investimentos estimados em até US$ 200 bilhões para a reconstrução de estradas, aeroportos e cidades, o que também atrai grandes companhias brasileiras.
Abriu-se uma janela de oportunidades para países fornecedores de alimentos e de insumos vitais à construção civil, como o minério de ferro, que respondeu por 45% dos US$ 7 bilhões em produtos brasileiros exportados para o Japão em 2010.
?O Japão terá de importar insumos como cobre e ferro, além de elevar a demanda mundial por cimento?, afirma o economista especializado em Ásia do Peterson Institute for International Economics, de Washington, Gary Hufbauer.
?Os importadores japoneses pediram pressa para repor estoques de 90 dias?, diz Francisco Turra, presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango (Ubabef). O Japão é o segundo mercado comprador do frango brasileiro.
Os japoneses sabem que a recuperação depois do caos será inevitável, mas não será fácil, especialmente diante da ameaça nuclear. Na quarta-feira 16, o imperador Akihito foi à tevê e invocou aos súditos que tivessem ?compaixão com o próximo para superar estes tempos tão difíceis?.
Para estancar a sangria das bolsas (a de Tóquio chegou a cair 14% após o terremoto) e injetar otimismo, o ministro da Economia, Kaoru Yosano, traduziu as expectativas do governo em números. ?O abalo para a economia japonesa com a tragédia será limitado, não mais do que 0,1% ou 0,2% do PIB?, previu.
E disse mais: ?Os gastos decorrentes da reconstrução provavelmente vão agregar entre um e dois pontos percentuais ao PIB?. A estimativa de crescimento antes da tragédia era de 1,5% em 2011, depois da expansão de 3,9% no ano passado, quando o PIB fechou em US$ 5,78 trilhões.
Dinheiro é o que não falta: entre a segunda 14, e a quinta 17, o Banco Central do Japão já havia injetado US$ 709 bilhões na economia. ?A prioridade do governo é minimizar os efeitos econômicos da catástrofe?, disse à DINHEIRO Nobuharu Imanishi, chefe do departamento econômico da Embaixada do Japão no Brasil.