13/04/2015 - 18:00
Quando venderam sua fatia de 49,5% na cervejaria Schincariol para os japoneses da Kirin, em novembro de 2011, os irmãos José Augusto, Gilberto e Daniela Schincariol embolsaram um polpudo cheque de R$ 2,3 bilhões. É dinheiro suficiente para tomar um cervejão, como era chamada a Schin em sua publicidade, para o resto da vida. Mas depois de muito tempo fora dos holofotes, um dos herdeiros da cervejaria de Itu volta, de forma discreta, aos negócios. José Augusto é um dos investidores da Sikur, de Porto Alegre, startup que desenvolveu um smartphone criptografado batizado de GranitePhone.
O aparelho, que só deve chegar ao mercado no terceiro trimestre deste ano, foi um dos destaques da Mobile World Congress, um dos eventos mais importantes do setor de mobilidade, que acontece anualmente em Barcelona. O celular da Sikur quer se aproveitar do frenesi em torno da segurança de dados na era digital. Esse assunto deixou o submundo dos hackers para as manchetes dos jornais, depois que o ex-agente da CIA, Edward Snowden, revelou que a agência de segurança americana NSA investigava as comunicações de diversos chefes de Estado, incluindo a presidente brasileira Dilma Rousseff, e de empresas, como a Petrobras.
A Sikur garante a proteção das informações de duas formas. Uma delas é por meio de um aplicativo, que pode ser instalado em qualquer smartphone com o sistema operacional Android, do Google. A outra é com seu próprio aparelho, o GranitePhone. “Garantimos a segurança do aplicativo, mas pode haver algum programa malicioso rodando nos bastidores do telefone”, explica Cristiano Iop, CEO da Sikur. “Com o nosso celular, a segurança é total.” Curiosamente, Schincariol foi preso em uma operação da Polícia Federal que usou grampos, o que seria evitado com o GranitePhone.
A Operação Cevada, deflagrada em 2005, investigou empresas que sonegavam impostos e tinha como um dos principais alvos a Schincariol. “Conheço José Augusto há muito tempo, não vejo problema algum em ter ele como sócio”, afirma Iop. Além do herdeiro da Schincariol, o fundo brasileiro G5 Evercore, comandado pelo italiano Corrado Varoli, ex-presidente da Goldman Sachs para a América Latina, também comprou uma fatia da companhia brasileira. Procurados, eles não quiseram fazer comentários para esta reportagem. O GranitePhone será fabricado na China e rodará um sistema operacional Android modificado (o software do Google usa código aberto e permite adaptações).
Com ele, será possível enviar mensagens, fazer ligações por internet, abrir documentos, entre outras funções básicas. Não é possível instalar aplicativos “normais” – esqueça, portanto, o popular serviço de mensagens WhatsApp. O aparelho está em fase de pré-venda por US$ 639. O preço deve subir depois do lançamento. O público-alvo são executivos de grandes empresas e membro do alto escalão do setor público, que lidam com informações sensíveis. A expectativa da Sikur é de que mais de 100 mil unidades sejam vendidas, ainda em 2015. Criada por ex-executivos do mercado financeiro em 2009, a Sikur tem apresentado um crescimento acelerado.
Em 2012, foi comprada pelo grupo gaúcho Ciberbras, que desenvolve negócios na área de defesa e segurança cibernética. No ano passado, a ela transferiu sua sede para Miami, na Flórida. A companhia também abriu escritórios nos Emirados Árabes, México, Colômbia e Chile, mercados nos quais o GranitePhone também estará disponível. Em 2016, a empresa pretende vender o smartphone na Europa e na Ásia. A internacionalização deverá ajudar a turbinar suas receitas, que chegaram a US$ 24 milhões em 2014, doze vezes maior do que o ano anterior.
A Sikur, no entanto, não está sozinha nesse mercado. Ela compete com a suíça Silent Circle, dona do Blackphone. Neste ano, a companhia exibiu a segunda geração do aparelho, com uma configuração potente, que incluía processadores de oito núcleos, memória de 3 GB, além de uma nova versão de seu sistema operacional. A finlandesa Jolla, formada por ex-funcionários da Nokia, anunciou uma parceria com a compatriota SSH Security para oferecer um sistema operacional também baseado em segurança, que roda em smartphones.