04/12/2015 - 20:00
Na manhã de sexta-feira, 4 de dezembro, o banqueiro André Esteves saiu de sua pequena cela na Cadeia Pública Pedrolino Werling de Oliveira, o Bangu 8, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, com a esperança de receber uma boa notícia de seu advogado, o criminalista Antonio Carlos de Almeida e Castro, o Kakay. Vestido com a camisa verde, obrigatoriamente usada pelos detentos, e com a barba por fazer, ele caminhou pelos corredores do presídio e sentou-se de frente para Kakay no chamado parlatório, lugar em que o preso e o advogado são separados por um vidro e falam apenas por meio de um telefone.
Abatido, Esteves procurava entender por que ainda não havia sido solto. Indignado, repetia para o advogado. “Por favor, me explica por que estou aqui? O que estou fazendo em Bangu 8? Não tenho nenhuma relação com esses acontecimentos”, dizia Esteves. E prosseguia. “Por que eu faria uma besteira como essa?” De fato, é difícil imaginar que um suposto gênio do mercado financeiro, um self made man que ganhou US$ 1 bilhão antes de fazer 40 anos, cairia na armadilha de participar pessoalmente da fuga mirabolante de Nestor Cerveró, delator da Operação Lava Jato da Polícia Federal e condenado no esquema de corrupção da Petrobras.
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Mesmo que seja inocente e consiga provar isso na Justiça nos próximos meses e anos, o destino de Esteves já está selado. Ele despencou do Everest das finanças internacionais para nunca mais voltar. Na semana passada, foi oficialmente desligado de todas as funções executivas do BTG Pactual e as suas ações ordinárias (com direito a voto) suficientes para lhe garantir o controle do banco foram automaticamente transformadas em preferenciais (sem direito a voto), conforme previam as regras internas em caso de um afastamento que o impedisse de retornar às suas atividades normais.
Ele continua sendo o maior acionista individual, mas não manda mais nada no banco. Nem voltará a mandar. Agora, cabe aos colegas que ficaram salvar o BTG Pactual e, assim, ajudar a preservar a maior parte da fortuna monetária de Esteves, bem como dos cerca de 200 sócios e associados no Brasil e no exterior. Nesse ponto, pelo menos, o banqueiro não se sente desamparado, nem pré-condenado. “Apesar de tudo, pelo menos tenho o conforto de ter os sócios ao meu lado”, repete Esteves para quem o visita.
O estrago de seu afastamento foi grande e provocou uma fuga de investidores. A ação do BTG Pactual recuou cerca de 35% desde sua prisão, no dia 25 de novembro, e os fundos com liquidez diária encolheram mais de R$ 11 bilhões. Agora, é hora de mostrar que a montanha financeira continua robusta e estancar a sangria, mantendo viva a máquina de fazer dinheiro do banco. Na sexta-feira, enquanto Esteves conversava com seu advogado, Persio Arida e os outros seis dos principais sócios – o Top Seven Partners inclui Marcelo Kalim, Roberto Sallouti, Antonio Carlos Canto Porto Filho, James Marcos de Oliveira, Renato Monteiro dos Santos e Guilherme da Costa Paes – fechavam um acordo com o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) que garantiu a quantia de R$ 6 bilhões para enfrentar os saques da clientela.
A medida assegura liquidez adicional e tende a acalmar os inseguros e atender aos mais afoitos. Não basta ter patrimônio e caixa suficiente para bancar os saques – e isso o banco assegura que tem –, é preciso atender a todos os pedidos de forma imediata e evitar que a crise de confiança se alastre. O acordo com o FGC é apenas uma parte da ampla estratégia traçada por Arida, um estudioso das crises financeiras, e seus sócios para garantir a sobrevivência do banco. Outras medidas deverão ser anunciadas nos próximos dias, como a venda de participações em outras empresas e o anúncio do nome do escritório de advocacia internacional que irá examinar com lupa todas as transações do banco.
“Fizemos vários movimentos importantes ao longo desses 10 dias“, afirmou Arida à DINHEIRO, na sexta-feira 4. “Mudamos a administração, mudamos o controle e tomamos todas as medidas necessárias para assegurar a liquidez da companhia. O banco é sólido e tem patrimônio, mas precisa assegurar que tenha liquidez também.” Com a investigação privada, a ideia é “esclarecer os fatos o mais rapidamente possível” e tocar a vida em frente. E como fica o BTG Pactual sem André Esteves? Segundo Arida, o pilar da estrutura de partnership do banco continua intacto e forte.
Nesse modelo, os principais executivos tornam-se sócios, são remunerados de acordo com o desempenho individual e da instituição e têm pesos iguais na tomada de decisão. Nesse ponto, a única mudança foi a saída de Esteves. Quem dá as cartas em todos as estratégias e missões dos 3.000 funcionários é o grupo dos Top Seven, cada um deles com suas áreas específicas. “O banco sempre foi tocado por um partnership“, insiste Arida. Ele deixou a área de gestão de recursos para assumir a presidência do conselho de administração. No comando do dia-a-dia do banco, em vez do CEO André Esteves há agora dois co-presidentes executivos, Marcelo Kalim (que cuida do caixa) e Roberto Sallouti, que já eram nomes fortes na organização.
O inglês Huw Jenkins é o vice-presidente do conselho. Na prática, o poder que se concentrava em Esteves, agora, fica mais diluído e ele perdeu definitivamente qualquer ingerência sobre a empresa. “Estamos tocando uma nova administração. O banco é hoje um outro banco. O jeitão dessa nova fase vai ficar claro a partir das próximas semanas, quando as pessoas entenderem o que está acontecendo“, afirma Arida. Os próximos passos são as vendas de ativos que não se relacionam ao negócio principal e, quem sabe, até a venda do BSI, private bank suíço comprado por Esteves por US$ 1,7 bilhão em julho de 2014.
Arida não confirma e nem desmente essa possibilidade, mas admite que o BTG Pactual irá diminuir de tamanho e poderá ficar com um patrimônio maior que antes, dado que muitos ativos estão sendo vendidos por valores maiores que os contabilizados nos balanços. Com a experiência de quem já conduziu o Banco Central, o BNDES e ajudou a acabar com a hiperinflação no Plano Real, Arida demonstra serenidade nessa tempestade que se abateu sobre o banco. O clima entre os funcionários é de tensão absoluta, principalmente entre aqueles que apostaram todas as fichas em ações do banco e temem perder o patrimônio duramente conquistado nos últimos anos.
“Muitos estão desesperados, mas têm de demonstrar autocontrole”, afirma um executivo de um banco concorrente. Na cúpula, a ordem é tocar o barco, no estilo “business as usual”. Carlos Fonseca, responsável pela administração dos mais de 30 negócios não-financeiros, teria recebido um prazo para encontrar interessados em todos eles. O BTG Pactual quer voltar a fazer o que faz de melhor: ser um banco de investimentos (veja quadro). “O BTG está acostumado com tíquetes médios de US$ 250 milhões, mas o varejo é um negócio de tíquete médio de R$ 15”, diz um executivo ligado a um fundo de private equity.
A participação na rede de hospitais D’Or, que teve receita de R$ 5,5 bilhões no ano passado, foi vendida rapidamente para o Fundo Soberano de Cingapura, por R$ 2,4 bilhões. E o BTG Pactual vendeu 5,96% da participação que detinha na empresa de ativos imobiliários BR Properties, por R$ 223,6 milhões na bolsa. A próxima a sair da carteira é a rede de estacionamentos Estapar. Leader Magazine e BR Pharma estão na prateleira. Vem daí, talvez, a única boa notícia dessa tormenta toda. “Um aspecto bom dessa crise é que você não precisa procurar um comprador. Os teus compradores passam na nossa porta, são bons ativos e tem gente interessada em comprar”, diz Arida.
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