13/11/2015 - 20:00
A temperatura política em Brasília atingiu um patamar tão elevado que não há espaço para debates econômicos salutares. No Congresso Nacional, os parlamentares só falam sobre o impeachment da presidente Dilma Rousseff e o processo de cassação do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, no Conselho de Ética. A poucos metros dali, no Palácio do Planalto, há uma nítida desarticulação política na cúpula do governo e uma interferência cada vez menos velada do ex-presidente Lula em vários assuntos.
Soluções para a crise econômica, ao que parece, estão ausentes da lista de prioridades das autoridades de plantão. Foi justamente nesse ambiente inóspito, carente de mentes criativas, que brotou um fio de esperança para a economia brasileira. O PMDB apresentou à sociedade um documento de 19 páginas com medidas emergenciais e reformas estruturais que primam por uma qualidade escassa na capital federal: o bom senso.
Com a liderança do presidente do partido e vice-presidente da República, Michel Temer, e a chancela da Fundação Ulysses Guimarães, o documento intitulado “Uma ponte para o futuro” enfatiza a necessidade de “atacar o desequilíbrio fiscal”, sem o que o relançamento da economia será inútil. Com uma análise realista, o principal partido da base governista salienta que a carga tributária cresceu de 24% para 36% do PIB nos últimos 30 anos. Portanto, falar em aumento de impostos só seria aceitável em situações de “extrema emergência e com amplo consentimento social”.
Não é à toa que Temer tem criticado publicamente a tentativa do próprio governo de recriar a CPMF. O coro é engrossado por Henrique Meirelles, que presidiu o Banco Central no governo Lula e cujo nome está sendo especulado para o Ministério da Fazenda (leia reportagem aqui). O PMDB defende que o crescimento das despesas públicas seja obrigatoriamente inferior à evolução do PIB, facilitando a obtenção de superávits primários. Além disso, é fundamental o retorno de um “orçamento verdadeiro”, que seja impositivo e com base zero, sem vinculações constitucionais.
“Creio que o Brasil também precise rever o Pacto Federativo, com uma menor concentração da arrecadação na União”, afirma o economista Eduardo Giannetti da Fonseca, que foi assessor econômico da candidata Marina Silva na última campanha eleitoral. “O dinheiro público tem de ficar o mais perto possível de onde será gasto, ou seja, dos governos estaduais e municipais.” Ao longo de suas 19 páginas, o documento reitera a necessidade de uma ampla articulação suprapartidária para viabilizar o avanço das reformas.
“É preciso a formação de uma maioria política, mesmo que transitória ou circunstancial, para procurar o entendimento e a cooperação”, diz o texto. Filiado ao PMDB, o ex-ministro da Fazenda Delfim Netto ratifica as medidas propostas pelo seu partido. “O problema é de organização política”, afirma Delfim. “Temos um presidencialismo de coalização que nem assume seu protagonismo, nem coaliza. E um Congresso perdido e ocupado com propostas que, com caras exceções, ignoram o interesse nacional.”
As propostas apresentadas pelos peemedebistas serão debatidas no congresso do partido marcado para o dia 17 de novembro. Elas tocam em questões polêmicas e nem sempre populares como a adoção de idade mínima para a aposentadoria e o fim da indexação de benefícios sociais e previdenciários. “Está ficando muito claro que se não encararmos com muita seriedade uma transformação radical nesses temas espinhosos, vamos ficar estagnados”, afirma José Pastore, especialista em mercado de trabalho. “Esse é o desafio para a população brasileira.”
Outro ponto aplaudido pelos especialistas é a posição do PMDB de oferecer protagonismo econômico aos empresários. “A iniciativa privada é muito mais eficiente”, afirma Érico Ferreira, presidente da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi). “Meu sonho é privatizar todas as estatais, autarquias e empresas de economia mista.” No comércio exterior, o documento prega a abertura comercial do País e a busca de acordos relevantes ainda que sem a participação do Mercosul. Na esfera jurídica, a ideia é permitir que as convenções trabalhistas prevaleçam sobre as normas legais, aliviando a sobrecarga no Poder Judiciário.
Esse tema foi comentado pelo ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa durante o 10º Seminário Internacional Acrefi (SIAC), realizado na quarta-feira 11, em São Paulo. Barbosa criticou o excesso de processos trabalhistas, muitos dos quais poderiam ser evitados através de acordos entre as partes. “O problema é que, no Brasil, a Justiça é barata”, afirmou. “E os advogados escrevem páginas e páginas nos processos.” Embora não tenha nenhuma filiação partidária, Barbosa é um dos nomes sempre lembrados pelo PMDB para ser candidato à Presidência da República, em 2018. Temer, com sua grande proeminência, também. Boas propostas econômicas o partido já possui.