O ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, afirmou que nem todas as medidas de um ajuste fiscal são sexy e divertidas. Os brasileiros ainda não começaram a sentir o peso dessa declaração, ao contrário dos argentinos. Desde que Mauricio Macri assumiu a Presidência, ele escancarou as medidas irresponsáveis e populistas adotadas pela antecessora Cristina Kirchner e não teve outra saída a não ser corrigir os erros de La presidente nas contas públicas. O resultado amargo é o aumento exponencial do custo de vida na capital Buenos Aires.

Os preços administrados pelo governo, como água, luz, gás e telefone, foram, no mínimo, dobrados nos últimos seis meses. A energia elétrica, por exemplo, principal símbolo do subsídio dos governos Néstor e Cristina Kirchner, que ficaram 12 anos no comando da Casa Rosada, recebeu um aumento de 300%. Abastecer o tanque do carro custa, aproximadamente, R$ 80 a mais do que em países vizinhos, como Brasil e Paraguai. Mesmo com o preço do barril do petróleo em queda, foram feitos três reajustes pelo governo argentino. Um quarto, por incrível que pareça, está em negociação.

As medidas de austeridade, que popularmente são chamadas de tarifaço, fazem parte do duro ajuste fiscal proposto pela equipe econômica de Macri para recolocar o país na rota do crescimento econômico. Antes da alta, porém, a Argentina deve registrar um recuo de 1,5% do PIB neste ano. A inflação, que se aproximou dos 12% no primeiro trimestre, está entre 35% e 40% nos dados anualizados. O ministro da Economia, Alfonso Prat-Gay, estima que a elevação dos preços de energia, gás, transporte e gasolina ajude a reduzir em até 7% o déficit público do país. Apenas com a eliminação dos subsídios, a economia será de 2,5 pontos percentuais do PIB.

“Não há dúvidas de que este é um ano de transição para a Argentina”, diz Dante Sica, diretor da consultoria argentina Abeceb. “Todas as medidas tomadas por Macri visam equilibrar as contas públicas.” A mesma seriedade aplicada por Macri nas contas internas se estendeu para as relações exteriores. O presidente deu atenção especial à disputa com os fundos abutres, que não aceitaram as condições de Cristina na renegociação da dívida argentina e travaram o acesso do país ao mercado de crédito. Com o acordo selado e o fim de uma disputa com os títulos da moratória de 2001, a Argentina conseguiu emitir títulos de sua dívida externa e captar US$ 16 bilhões.

Esse movimento só foi bem-sucedido pela credibilidade conquistada por Macri, que soube negociar com a oposição para reconquistar a confiança do empresariado e angariar investimentos para destravar projetos de infraestrutura. “Durante muitos anos, o país não recebeu investimentos em energia e saneamento básico”, diz Eric Ritondale, economista-chefe da consultoria Econviews. “O desenvolvimento da infraestrutura reduzirá o desemprego e aumentará a atividade econômica.” O auge da popularidade com os argentinos permitiram a Macri colocar em prática a promessa de descongelar os preços, que não condiziam com a realidade do país.

No entanto, o presidente começa a enfrentar o descontentamento de sindicatos e da população de baixa renda. Essa sequência de aumentos, mais o escândalo Panama Papers, fez sua aprovação cair de 50,7% para 42,9%, segundo a consultoria Management & Fit. Para evitar uma ruptura antes da hora, a equipe econômica tem trabalhado com um ajuste gradual e a manutenção de subsídios à população mais pobre. “A inflação estava reprimida, essa foi uma das armadilhas que o governo anterior deixou”, diz Alberto Alzueta, presidente da Câmara de Comércio Argentina. “Vai doer agora, mas será bom para recolocar as contas da Argentina novamente em ordem.”