14/08/2015 - 19:30
Criado pelos empreendedores americanos Larry Page e Sergey Brin, em 1997, o Google foi por um longo período um dos símbolos de um modelo de gestão mais informal e, ao mesmo tempo, bem-sucedido. Após abrir o capital na Nasdaq, a bolsa de tecnologia de Nova York, em 2004, e acelerar o passo para se tornar um dos ícones da chamada Nova Economia, a empresa começou a lidar com o dilema natural das megacorporações: manter a jovialidade e o espírito inovador, sob uma estrutura mais engessada e os olhares atentos de investidores e acionistas. Dezoito anos depois, a dupla, também conhecida como “Google Guys”, tem agora a oportunidade de reviver um pouco do frescor de seus primeiros anos, quando ainda cursavam a Stanford University, na Califórnia.
Na segunda-feira 10, Page e Brin surpreenderam o mercado ao anunciar a criação de uma holding. Batizada de Alphabet, ela irá abrigar operações independentes das diversas áreas de atuação da companhia. Na estrutura, a marca Google passa a ser uma subsidiária da nova empresa, sob o comando do novo CEO, o indiano Sundar Pichai, que liderava as divisões de Chrome e Android. Divididos em estruturas próprias de gestão, estarão uma série de projetos em novos segmentos. O caldeirão de letras inclui nomes como a Nest, que investe em tecnologias para casas conectadas e o X Lab, responsável por iniciativas com o Google Glass e o carro autônomo da empresa (saiba mais no quadro ao lado). “Na indústria de tecnologia, em que as ideias revolucionárias impulsionam as próximas áreas de grande crescimento, você precisa se sentir um pouco desconfortável para permanecer relevante”, afirmou Page, no comunicado sobre a criação da holding.
Page e Brin atuarão, respectivamente, como CEO e presidente da Alphabet. “O Google está tirando sua dupla mais criativa e mais inteligente das operações do dia a dia e transferindo essas preocupações para Pichai”, diz Tom Austin, vice-presidente da consultoria americana Gartner. Para ele, Page e Brin continuarão no controle, mas terão liberdade para criar e inovar. “Muitos CEOs morrem de medo de ficar longe de seus principais negócios, mas esses caras estavam implorando por isso”, afirma Austin.
Para analistas, um dos fatores por trás da criação da Alphabet é a necessidade de dar maior transparência aos gastos e resultados do Google, uma preocupação crescente de Wall Street. “É um passo positivo para compreender melhor tanto a lucratividade dos principais negócios, como os projetos que geram perdas”, escreveu Brian Nowak, analista do banco de investimento Morgan Stanley, em um relatório. Apesar de frisar que essa maior visibilidade abre a possibilidade de os investidores serem menos tolerantes com “projetos de ciência”, que nem sempre chegam ao mercado, Roger Kay, analista da consultoria de tecnologia americana Endpoint Technologies Associates, ressalta a flexibilidade como um benefício do modelo. “Agora, cada uma das empresas poderá ser gerenciada, vendida, além de investir em fusões, aquisições, parcerias ou em qualquer movimento que seja mais apropriado para suas operações”, afirma Kay.
Mas nem tudo é comemoração. Em uma entrevista recente ao jornal britânico Financial Times, Page afirmou que o megainvestidor Warren Buffett e seu conglomerado Berkshire Hathaway eram exemplos de como uma corporação deveria ser comandada. Em um paralelo com a Alphabet, Jan Dawson, analista da consultoria americana Jackdaw Research, disse que, ao contrário do Berkshire Hathaway, a maioria dos negócios do Google não tem capacidade de se sustentar de forma independente do buscador, sua vaca leiteira. “Os CEOs dessas novas empresas irão bater na porta da Alphabet a cada trimestre para pedir mais dinheiro para financiarem suas operações”, afirma Dawson. A grande preocupação, na visão de Dawson, é que tanto Page como Brin não demonstram ter habilidades para combinar investimentos e a definição de objetivos financeiros para cada uma desses empresas, uma das características que, segundo ele, definem o modelo de sucesso da Berkshire Hathaway.