Há uma visível mudança de humor em andamento no meio empresarial. Os empreendedores estão, senão otimistas, ao menos esperançosos de que novos tempos, mais serenos – com a estabilidade retomando o curso –, virão a partir da troca de comando na Presidência. Esse sentimento foi claramente verificado entre os participantes do Fórum Empresarial de Foz de Iguaçu, já na sua 15º edição, que serviu como uma espécie de laboratório para medir o grau de receptividade do setor produtivo às reviravoltas no campo político.

O que quer a turma do PIB? Todos sabem: estabilidade nas regras e um ambiente propício aos investimentos e aos negócios. No encontro de Foz, a turma do PIB teve a rara oportunidade de – em meio à situação de efervescência dos debates de Brasília – travar um contato direto, até descontraído, com alguns dos parlamentares que estão tocando o rumo e o ritmo de discussões no Congresso. Estiveram ali nomes como o de Antônio Anastasia, que será o relator do processo de impeachment no Senado; Romero Jucá, presidente do PMDB; Cássio Cunha Lima, líder do PSDB; e José Agripino Maia, do DEM.

Eles serão peças chaves no tabuleiro que deve apear Dilma Rousseff do poder. Os mais de 50 CEOs e donos de companhias presentes gostaram muito do que ouviram desses interlocutores. Principalmente no que se refere a algumas medidas em estudo e aos nomes que deverão compor a equipe da Fazenda e do Banco Central. Soou como música o comentário de Romero Jucá – cotado para a pasta do Planejamento – de que um dos pilares do plano de Michel Temer deverá ser o aumento das concessões e das parcerias público-privadas (as PPPs) com o objetivo de canalizar recursos à área de infraestrutura.

O economista Paulo Rabello de Castro, que chegou a ser cogitado como potencial ocupante de um dos cargos na tropa da economia, estava no Fórum e negou qualquer convite. Pelo sim ou pelo não, ele preparou a toque de caixa – e já entregou a Temer – um trabalho intitulado “Tríplice Resgate”, no qual defende a redução de R$ 100 bilhões nas despesas públicas, a simplificação de leis trabalhistas e o refinanciamento das dívidas dos Estados. Diz Rabello que o fundamental é aproveitar de imediato, sem hesitações, o crédito de confiança que será dado ao governo de transição.

“Não há tempo de construir uma ponte para o futuro, como dizem. Temos logo de pular do outro lado, de pular para o tal cenário de futuro da maneira que der”, avaliava Rabello à DINHEIRO, em meio aos debates. Quase em simultâneo ao convescote de empresários e políticos na tarde do sábado, 23, no Paraná, Temer recebeu no Palácio do Jaburu em Brasília o ex-presidente do BC, Henrique Meirelles, a quem fez o convite para pilotar o ministério na sua gestão.

“Não poderia haver escolha melhor”, observou a presidente da UPS do Brasil, Nadir Moreno, que atua no setor de logística e transporte. Como ela, são vários os que acreditam que um nome forte na Fazenda pode abrir boas rotas e oportunidades para o empreendedorismo. Flavio Batel, vice-presidente da Steelcase, argumenta que a sua empresa, uma das gigantes da indústria de móveis de escritório nos quatro cantos do globo, é o exemplo vivo dessa aposta a longo prazo. “Viemos para ficar e sabemos que, em mãos certas, o Brasil avança”.

Não por menos, um dos nomes mais assediados durante o encontro de Foz para revelar planos oficiais do próximo ocupante do Planalto era o do ex-deputado e braço-direito de Temer, Rodrigo Rocha Loures, que procurou saciar a curiosidade geral falando em “mudança sem traumas”. Tratado como ministro informal, Loures anotou propostas, prometeu futuras audiências e pediu a ajuda do PIB. Decerto, mesmo com as desejadas medidas de ajuste e reformas estruturais ainda em ritmo de espera, parece ter saído da frente a chamada “crise de expectativas”.

Era ela que segurava o ímpeto de investimentos dos empresários e foi também ela a responsável pela maior parte das reclamações desferidas contra a gestão Dilma. “A situação estava péssima e ninguém sabia como seguir adiante, nem tinha disposição para isso”, disse o presidente da Moët Hennessy do Brasil, Sérgio Degese, que produz o cobiçado champanhe Chandon. “Agora vemos alguma luz adiante”. No mesmo tom, o presidente da Mistral, Ciro Lilla, um dos principais importadores e distribuidores de bebida do País, resolveu fazer um gesto que traduzia seu atual estado de espírito: “Eu decidi trazer aqui no Fórum alguns vinhos para a saída da crise e não para a crise”.

Vale registrar que a temática da crise sempre esteve presente ao menos nas ultimas três edições desse encontro de líderes empresariais. Mas o organizador – e hoje candidato a prefeitura de São Paulo pelo PSDB -, João Doria Jr., acalenta a esperança de uma virada, em breve, da agenda. “Queremos discutir daqui por diante o desenvolvimento e estamos mais próximos disso”. A sensação de retomada rápida e consistente, fora do ciclo vicioso de cancelamento de projetos, demissões, queda de consumo e de arrecadação, está diretamente ligada às promessas de choque na máquina.

Ninguém mais no âmbito empresarial aceita segurar a carga de uma estrutura inchada, movida a impostos e ineficiência, com apadrinhamentos e descalabros de toda ordem com o dinheiro público. Os equívocos administrativos recentes e barbeiragens no âmbito federal serviram como mola propulsora de uma espécie de insurreição dos responsáveis pelo PIB. Eles resolveram colocar a boca no trombone e reclamar abertamente, fugindo do figurino discreto e “low profile” que sempre os caracterizou em circunstâncias semelhantes no passado.

“Acabou a era do empresário moita”, decretou Flávio Rocha, presidente do grupo Riachuelo, um dos maiores varejistas do setor têxtil no Brasil. Aplaudido efusivamente durante a sua palestra no seminário do Lide, Rocha condenou o que chamou de “peso insuportável da carruagem estatal”. Disse que em 2015 quase 100 mil pontos de comércio foram fechados – ou o equivalente ao universo total de lojas existentes nos shoppings do Brasil. A quebradeira acarretou a eliminação de 180 mil vagas de trabalho.

“Um ciclo perverso que, imagino, está com os dias contados. O que vem por aí é o oposto desse nós contra eles. Será baseado no binômio democracia e livre mercado. O varejo, como sempre, vai ser um camarote privilegiado do espetáculo do mercado”. Existem ainda etapas importantes a serem vencidas antes disso, como o resgate de conquistas que ficaram pelo caminho. O setor automobilístico, para citar um caso extremo, viveu seu inferno particular depois de ter alcançado recordes extraordinários de vendas. O Presidente da MAN Caminhões, Roberto Cortês, relata que nunca viu nada parecido.

“Há três anos estávamos crescendo 20% ou até mais em média. No ano passado recuamos perto de 30%”. A presidente da Microsoft do Brasil, Paula Bellizia, apresentou no Fórum dados da pesquisa “The 2015 IMD World Competitiveness Scoreboard”, que retrata o tamanho do estrago. Segundo ela o Brasil caiu para a 56º posição no ranking mundial de competitividade, dentro de um universo de 61 nações avaliadas. Mas Bellizia, mesmo assim, se alinha ao bloco dos que apostam em saídas. E ela sugere como estratégia o apoio ao empreendedorismo, a tecnologia e a educação.

“Estamos diante de uma grande oportunidade e acredito que a jornada empreendedora começa na educação. A qualidade dela vai tornar o Brasil mais competitivo. É a minha expectativa”. Em quaisquer dos grupos de empresários que se formaram ao longo dos três dias de evento, era possível colher evidencias dessa guinada de expectativas. Tome-se, por exemplo, o que disse o presidente da Amil, Edson de Godoy Bueno, um titã na área de planos de saúde, que tempos atrás fechou uma transação de cerca de US$ 5 bilhões com a multinacional americana United.

“Está na hora de sermos mais otimistas. Precisamos de otimismo para avançar. Nosso grupo vem comprando novos hospitais; recentemente investimos R$ 1 bilhão na aquisição do Samaritano em São Paulo”, afirmou Bueno, convocando seus pares a se engajarem na corrente de luta por melhorias. Juan Quirós, outra voz da produção, que comanda a agência de fomento Investe SP, deu fundamento concreto ao movimento de retomada. Informou que, nos últimos três meses, a organização conseguiu o melhor desempenho de liberações e análises de sua história.

Em parte, o aumento da demanda de consultas por financiamento de projetos está diretamente atrelado à crença geral de que as condições de mercado tendem a ser promissoras após a transição política. No cálculo da BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, a equação é simples: menos entraves para a produção local (como a eliminação do alto custo da mão-de-obra) permite inversões em pesquisa e inovação, competitividade e, por consequência, ampliação de mercados. O CEO global da BRF, Pedro Faria, contou no Fórum que a intenção do grupo é acelerar esse processo, com o lançamento de mais de 100 produtos em 2016.

“Acreditamos que o ambiente vai ajudar”, observa. Wilson Ferreira, presidente da CPFL, concorda. “Temos condições de criar uma agenda positiva na infraestrutura e no âmbito regulatório, com a volta da segurança jurídica dos contratos”. Cada um deles possui seu próprio modelo de saída da crise, mas, ao que tudo indica, a maioria concorda que o simples afastamento da presidente Dilma Rousseff já equivale a meio caminho andado nessa direção.