01/12/2010 - 21:00
Os chineses inventaram a pólvora e o sueco Alfred Nobel (1833-1896), a dinamite. Quase 114 anos após a sua morte e muitas guerras e explosões depois, o nome do cientista e empresário mais famoso da Suécia volta a despertar paixões na China. Ao escolher o dissidente Liu Xiaobo para receber o Prêmio Nobel da Paz de 2010, a Fundação Nobel irritou profundamente o governo de Pequim. Xiaobo foi condenado a 11 anos de prisão por ter feito um manifesto em favor da liberdade de expressão e do multipartidarismo, está preso e não irá a Estocolmo receber a honraria, no dia 10 de dezembro. Sua escolha, aplaudida mundo afora, foi recebida como uma “obscenidade” pelo regime comunista.
Wijers, CEO da AkzoNobel: ele comanda uma empresa que fatura 14 bilhões de euros globalmente
Mas isso não quer dizer que a marca Nobel seja maltratada no país. Ao contrário, a revolução econômica iniciada por Deng Xiaoping continua em curso e a China acaba de abrir os braços para a megamultinacional AkzoNobel. A companhia química, que carrega o sobrenome famoso desde a fusão entre os grupos Akzo e Nobel, em 1994, acaba de dobrar sua aposta no país que mais cresce no mundo.
No começo de novembro, inaugurou uma nova fábrica, de 275 milhões de euros, em Ningbo, na rica província de Zhejiang. É a coroação de uma estratégia que inclui os mercados emergentes e também foca no Brasil. “Queremos dobrar a receita nestes dois mercados em cinco anos”, afirmou à DINHEIRO, Hans Wijers, CEO da AkzoNobel.
Na China, em uma área de 50 hectares, irá produzir produtos químicos especiais, utilizados como insumos por indústrias de vários setores, da construção à alimentação, da limpeza ao petróleo, da higiene pessoal ao papel. Com ela, a AkzoNobel amplia para 27 o número de fábricas no país, onde emprega 6.500 pessoas e obteve 1 bilhão de euros dos 14 bilhões de euros de faturamento de 2009.
Esse império global de tintas e produtos químicos atua em 80 países e é comandado, em Amsterdam, por Hans Wijers, ex-ministro da Economia da Holanda. Sua meta é elevar as receitas da empresa para 20 bilhões de euros até 2015. Para isso, ele traçou um ambicioso plano de expansão, com ordens para crescer acima do mercado nos países mais promissores para os seus negócios, China e Brasil.
Guardadas as devidas proporções, ambos têm em comum uma elevada taxa de crescimento do PIB, pesados investimentos em infraestrutura e uma classe média ascendente e ávida pelo consumo.
Passado e futuro: a empresa criada a partir da união da Akzo com a do inventor Alfred Nobel (à dir.)
quer vender as tintas Coral para projetos da Olimpíada de 2016
Isso significa um mar de oportunidades em obras de grande magnitude – que consomem produtos da companhia, como tintas de uso industrial e revestimentos de alto desempenho – e nas vendas de varejo.
A empresa deixou sua marca nas grandes arenas olímpicas de Pequim, está presente nas obras para os jogos de Londres (2012) e quer fazer o mesmo no Brasil (2016), atuando também nos estádios da Copa do Mundo de 2014. A preparação para os dois megaeventos deve movimentar pelo menos R$ 1 trilhão, sendo que de 30% a 50% desse valor será dividido pelos fornecedores de tintas e revestimentos especiais, estima a empresa.
No Brasil, a principal marca popular da AkzoNobel é a Tintas Coral, focada no mercado de decoração. Cada apartamento ou casa vendida ou reformada no Brasil soa como música aos ouvidos dos holandeses, que têm feito uma campanha agressiva de marketing com o mote “Tudo de Cor Para Você”.
O diferencial são produtos mais sustentáveis, como tintas e vernizes à base de água e sem substâncias químicas nocivas aos consumidores. A empresa deve fechar o ano com faturamento de R$ 2 bilhões no País, sendo que quase a metade disso provém da Tintas Coral, maior concorrente da Suvinil.
“Crescemos quase 10% no ano passado e este ano repetimos a dose”, comemora Jaap Kuiper, presidente da AkzoNobel para América Latina. Como também fornece para indústrias de automóveis e bens de consumo semi-duráveis, como fogões e geladeiras, e vende insumos químicos para fábricas de papel e embalagem, a Akzonobel está entusiasmada com o País, cujo PIB deve aumentar 7% a 8% em 2010 e estabilizar em 5% ao ano nos períodos seguintes.
“Muitos fabricantes crescem mais no Brasil que no resto do mundo. Estamos pegando essa onda”, diz Kuiper. Para chegar ao faturamento previsto de R$ 4 bilhões em cinco anos, a companhia vai investir em crescimento orgânico e, se necessário, em aquisições. “Temos planos específicos para expandir todas as nossas áreas de negócios e estamos procurando oportunidades”, afirma Wijers.
ENTREVISTA
“Vamos expandir as operações no Brasil”
O holandês Hans Wijers, presidente mundial da AkzoNobel, é um apaixonado pelo Brasil. Suas visitas frequentes não se restringem aos negócios e incluem as férias com a família. “Adoro Jericoacoara”, afirmou à DINHEIRO:
Wijers, o CEO: ele já foi ministro da Fazenda da Holanda
Qual a importância da China e do Brasil na estratégia global da empresa?
Queremos dobrar a receita nestes dois mercados em cinco anos. A China tem outra magnitude, mas o nível de desenvolvimento do Brasil é maior.
Quando faz negócios no Brasil e na China, como o sr. vê o papel dos governos? Um Estado controlador como o chinês torna as coisas mais difíceis ou mais fáceis?
O investimento em Ningbo é grande, demanda permissões, autorizações de Pequim. Leva tempo, mas, com organização, dá para fazer. O Brasil também é muito burocrático. O governo não está tão envolvido na economia por meio de empresas estatais e controle de preços, por exemplo, mas tem um papel importante por meio de tributação e regulação trabalhista. O arcabouço é muito complexo, mas é muito diferente do chinês.
Quais são os planos para o Brasil?
Iremos continuar a investir nas áreas química, de papel, de decoração, na distribuição e na marca Coral. Temos planos específicos para expandir todas as nossas áreas de negócios e estamos procurando oportunidades.
Como a guerra cambial afeta os negócios de uma multinacional como a sua?
De maneira geral, toda essa volatilidade cambial não é boa para uma empresa global, causa muito ruído nos números.
Como se proteger nesse ambiente?
Muitos de nossos negócios são locais. Embora tudo isso tenha impacto no nosso fluxo de caixa em euros, podemos lidar com o problema cambial. Há muito ruído nos números, mas nossos negócios no Brasil são brasileiros, nos Estados Unidos são americanos e na China, chineses. Temos proteção contra os riscos.
Enviado especial a Ningbo (China)