31/07/2015 - 20:00
Devido ao seu custo proibitivo, o cheque especial é desaconselhado como alternativa de crédito por dez em cada dez consultores financeiros. Mas as estatísticas mostram que ainda é muito utilizado no País, sobretudo em momentos de crise. Neste ano, o saldo acumulado da modalidade, até junho, cresceu 12,7%, para R$ 27,6 bilhões, segundo dados do Banco Central (BC), divulgados na quinta-feira 30. Quem costuma recorrer a essa linha deve ter notado, porém, uma grande diferença em relação aos últimos anos.
Com o ciclo de alta dos juros, as taxas cobradas alcançaram o maior nível desde 1995, nada menos que absurdos 241,3% ao ano. Nesse patamar, um consumidor brasileiro que tome R$ 1.000 no cheque especial e só consiga pagar 12 meses depois, terá de devolver ao banco R$ 3.569, quase R$ 1.200 a mais do que se a operação tivesse sido realizada em janeiro de 2013, quando as taxas estavam no menor nível já registrado. O ciclo mais recente de alta nos juros básicos (a Selic), que balizam o custo das outras linhas de crédito, iniciou-se no final do passado, apenas três dias após a reeleição da presidente Dilma Rousseff, para fazer frente ao cenário de inflação persistente.
O ritmo do avanço foi intensificado nos últimos meses, numa tentativa da autoridade monetária de recuperar a credibilidade perdida nos últimos quatro anos e afastar as críticas por ter sido leniente em relação aos reajustes dos preços. Na quarta-feira 29, o Comitê de Política Monetária (Copom) promoveu mais um ajuste, elevando a taxa básica para 14,25%, ante 11% em setembro de 2014. Um comentário inserido no comunicado do Copom levou a maior parte do mercado a interpretar o fim do ciclo de alta.
“O comitê entende que a manutenção desse patamar da taxa básica de juros, por período suficientemente prolongado, é necessária para a convergência da inflação para a meta no final de 2016”, afirma o texto. A decisão foi unânime. No entanto, um fato inédito marcou a reunião: Tony Volpon, diretor recém-empossado, decidiu não participar da deliberação, depois de ter sido criticado por ter antecipado seu voto em um evento público. A disparada dos juros vem contribuindo para derrubar ainda mais o nível de atividade econômica, num cenário já recessivo.
A consequência óbvia é a elevação do desemprego. Mas o impacto sobre o ajuste fiscal conduzido pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, se dá de duas formas distintas. Por um lado, trabalha para melhorar a confiança da sociedade, porque ajuda a atenuar as projeções de inflação. Por outro, aumenta o gasto do governo com os juros – com a Selic acima de 14%, essa conta passa de R$ 30 bilhões. No mercado, há quem ainda acredite que o BC possa ir além do patamar atual, na tentativa de alcançar o centro da meta no final do ano que vem, como tem se comprometido.
“O Banco Central tem de subir mais do que o mercado espera porque está explícito nos comunicados anteriores que quer ancorar expectativas para 2016”, afirma André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos. A projeção do mercado para o IPCA de 2016 está hoje em 5,4%, O analista acredita em mais uma alta de 0,25 ponto neste ano e manutenção até o segundo trimestre do ano que vem, quando a Selic começaria a cair. Ele alerta, no entanto, para o desafio do resgate da confiança, num contexto em que “a crise política é maior do que a econômica”. “O mercado exigiu uma recessão, o governo está entregando, mas o mercado finge que não é com ele”, afirma Perfeito.