Quando o economista alemão Thomas Schmall assumiu a Volkswagen, em 2007, aos 42 anos, a empresa passava por um dos mais difíceis momentos de sua história no Brasil. Naquela época, a montadora, então dirigida por Hans-Christian Maergner, estava em pleno processo de reestruturação, instaurado em 2003. Seu antecessor chegou a cogitar até o fechamento de uma unidade de produção, a de São Bernardo do Campo, primeira fábrica da empresa no País. Schmall assumiu com o compromisso de reerguer a companhia. O executivo revitalizou quase todo o seu portfólio, além de aproveitar as oportunidades do mercado para trazer modelos em categorias nunca antes disputadas pela VW no Brasil.

Em um ano, os alemães estavam de volta à liderança do mercado, que havia sido perdida para a Fiat. Esse foi um dos grandes feitos que marcaram sua passagem por aqui, que se encerra daqui a um mês, em 1º de janeiro de 2015. O executivo deixará de pilotar a subsidiária brasileira da montadora para assumir uma cadeira no conselho mundial, na Alemanha. O escolhido para substituí-lo é o engenheiro sul-africano David Powels, de 52 anos. Assim como aconteceu com Schmall, ele terá muito trabalho pela frente. O baixo crescimento da economia brasileira afeta diretamente o mercado automotivo.

Até outubro deste ano, as vendas de veículos apresentavam queda de 7,7% em relação ao mesmo período de 2013, de acordo com a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea). Além disso, a Volkswagen não é mais líder do mercado desde 2010, quando foi superada novamente pela Fiat. E, neste ano, a empresa alemã ainda corre sérios riscos de perder também o topo do ranking do carro mais vendido do País, ocupado desde 1983 pelo Gol, para o Palio, da Fiat. Nos últimos cinco anos, o mercado brasileiro passou por uma onda de investimentos de companhia estrangeiras, mais especificamente das asiáticas.

Não só a Volkswagen, mas todas as grandes montadoras instaladas no País enfrentam, agora, a forte concorrência da sul-coreana Hyundai e das japonesas Toyota e Nissan, que entraram no segmento de carros populares, até então amplamente dominado pelas europeias. Mais recentemente, vieram as montadoras chinesas, como Cherry e Jac Motors, que estão construindo fábricas por aqui. Para contra-atacar, a Volkswagen investiu no lançamento do up!, supercompacto europeu de design moderno, cuja principal missão é suceder o Gol e manter a montadora na liderança do segmento de carros populares de entrada, o de maior faturamento do mercado.

“Até hoje a Volkswagen não conseguiu se desvincular do Gol”, afirma o consultor do setor automotivo Francisco Satkunas. “Já tentaram com o Fox, agora com o up!, mas o Gol continua sendo o popular de entrada preferido dos clientes da marca.” Até outubro, o up! acumulava vendas de 47,9 mil unidades. O Gol, por sua vez, registrava vendas de quase 100 mil unidades a mais: 147,2 mil. Já o Palio, principal concorrente na categoria, vinha logo no retrovisor, com 145,3 mil veículos comercializados. Por outro lado, Schmall é responsável por levar a Volkswagen para novas categorias no País.

O executivo trouxe a picape Amarok, produzida na Argentina, mas gabaritada a disputar um segmento nunca antes desenvolvido pela VW, o de utilitários premium. Ele ainda colocou a companhia para brigar pelo mercado de supercompactos e conseguiu trazer para o País os novos modelos do Golf e do Jetta, que serão produzidos a partir do próximo ano nas fábricas brasileiras. “Vale lembrar que a Volkswagen ainda trouxe um novo motor, de tecnologia mundial da companhia, para o País”, afirma Rafael Marques, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

“A planta de São Bernardo, que tinha planos para ser fechada, recebeu investimentos e se mantém produtiva.” O executivo sai da companhia com o mérito de ter garantido R$ 10 bilhões de investimentos até 2018 para a subsidiária brasileira em novos produtos e modernização das plantas. A favor de Powels pesa o fato de o executivo já ter conhecimento sobre o mercado brasileiro. Ele foi vice-presidente de finanças e estratégia corporativa de 2002 a 2006, no mesmo período em que Maergner comandava a companhia.

Por seu cargo, ele teve grande participação no plano de reestruturação com foco em cortes de custos. Powels deixou o Brasil para dirigir a subsidiária da montadora na África do Sul, onde estava até agora, e foi responsável por modernizar as fábricas e trazer novos modelos. Porém, em seu segundo tempo no Brasil, ele não irá encontrar o mercado da mesma forma. “A Fiat não é a mesma daquele período, muito menos o mercado após o avanço de outras montadoras por aqui”, afirma Satkunas. Acostumado com momentos de crise, Powels deve trabalhar duro para que a montadora alemã retorne para a liderança do mercado.