Um espectro ronda o mundo: o de um futuro em que o lucro não será o único objetivo das empresas, que usarão seu poder para resolver os problemas sociais e ambientais. As companhias não terão hierarquias. Os ganhos serão distribuídos entre todas as pessoas, que escolherão onde trabalhar não pelo salário, mas porque sentem que serão capazes de construir algo prazeroso. Esses ideais são propagados por revolucionários que combatem empresários gananciosos. Mas se engana quem pensa que eles formem uma nova onda de comunistas barbudos em busca de outra Cuba. Ao contrário.

Suas fileiras são compostas por pessoas bem formadas. Muitas delas abandonaram carreiras bem-sucedidas em grandes companhias para lutar por essa causa. São os empreendedores que aderiram ao movimento do capitalismo consciente, que ganha espaço no Brasil. Sua expansão no País foi retratada pelo jornalista Alexandre Teixeira, no livro “De Dentro Para Fora” (Arquipélago Editorial, R$ 45), lançado na terça-feira 28. “Para o capitalismo consciente, uma empresa que não lucra vira um peso para a sociedade”, diz Teixeira, ex-editor da DINHEIRO. “O lucro importa, mas não pode ser o único propósito de um negócio.”

Não é fácil aplicar esse princípio na prática, já que ele esbarra em uma série de preconceitos e desafios. Um dos primeiros a adotá-lo foi Cláudio Emanuel de Menezes, que fundou a desenvolvedora de software Disoft, há 30 anos. Menezes seguia a cartilha básica de gestão até 12 anos atrás, quando uma crise quase o levou à falência. Decidiu, então, virar a empresa pelo avesso. Aboliu a estrutura de cargos, reduziu a hierarquia e adotou um modelo de equipes em que líderes e liderados compartilham decisões e informações com total transparência.

As mudanças não foram indolores: houve greve de analistas e o seu principal cliente, que respondia por 30% do faturamento, simplesmente lhe disse que aquilo tudo era ingênuo demais e foi embora. Mas Menezes não se arrepende. Com 90 clientes e 60 funcionários, a Disoft faturou R$ 13 milhões, no ano passado, e se recuperou do tombo. “Temos de desmontar as estruturas que endurecem as pessoas”, afirma Menezes, adepto fervoroso da chamada “empresa horizontal”. Se promover essa transformação estrutural é difícil, quando se é o dono da empresa, imagine a perplexidade causada por consultores que ganham a vida pregando essa mudança. Que o diga Lourenço Bustani, um dos fundadores da Mandalah. Com 20 clientes em oito países, a ousadia da equipe de Bustani é tamanha que desafia o que muitos sequer questionariam.

Um exemplo é o projeto que propôs para a montadora GM. Contratada para elaborar um cenário para o setor nos próximos anos, a Mandalah recomendou, sem meias palavras, que a companhia deveria investir num mundo sem carros. “Queremos que as empresas tenham um objetivo maior, que é proporcionar alegria e bem-estar a todos”, diz Bustani. E, em vez de espantar a clientela, seu discurso atrai cada vez mais gente. Se tudo correr como o previsto, a consultoria, que não revela números, crescerá 40% sobre 2010 – até aqui, seu melhor ano. O afluxo de interessados é sentido por outros militantes do capitalismo consciente.

A Plug, por exemplo, nasceu há três anos e seu negócio é hospedar e conectar toda sorte de empreendedores – desde startups, até veteranos como o Uber, o polêmico serviço que transforma motoristas em táxis, e a Virgin Mobile, do bilionário britânico Richard Branson. A empresa paulista, que faturou R$ 1,6 milhão em 2014, espera superar os R$ 2 milhões agora. “Saber que ajudamos alguém a prosperar me enche os olhos de lágrimas”, diz Jorge Pacheco, um dos criadores da Plug. Mas não se engane, os capitalistas conscientes estão também com o bolso cheio. Eis o (bendito) paradoxo de fazer o bem.