Analisar a viabilidade de uma ideia nova dá trabalho. Imagine fazer isso com 1.300 delas. Essa foi a tarefa a que quatro executivos de carreira no mercado de investimentos se dedicaram durante um ano para inovar em um segmento que vem sendo marcado por uma crise profunda, o das corretoras de valores. Foram mais de 100 horas de entrevistas com clientes em potencial para descobrir pontos fortes e fracos do trabalho das empresas do ramo. O resultado foi a criação da Guide Investimentos, que, além de ser uma corretora, é uma plataforma de distribuição de produtos financeiros, como fundos, ações e títulos do Tesouro Direto. 

 

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Quiz: em sentido horário, Aline Sun, Marcelo Macedo, Jean Sigrist

e Alexandre Atherino: 100 horas de entrevistas

 

Construída a partir da corretora pertencente ao Banco Indusval, rebatizado BI&P, a Guide nasce com cinco mil clientes e um patrimônio administrado de R$ 1 bilhão. As metas são chegar a R$ 3,5 bilhões e a 25 mil clientes em três anos, mirando nos investidores com patrimônios a partir de R$ 250 mil para aplicar. Essa iniciativa vem em um momento de mudanças drásticas para o setor. Em 2007, ano da abertura do capital da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), o número recorde de lançamentos de ações e a perspectiva de juros consistentemente baixos faziam prever um longo período de mercado em alta, com a popularização das ações como investimento. 

 

A própria Bovespa, que meses depois fundiria suas atividades com a Bolsa de Mercadorias & Futuros, dando origem à BM&FBovespa, previa que o número de investidores individuais chegaria a cinco milhões, no ano passado. Baseadas nessas expectativas otimistas, muitas corretoras investiram pesadamente na contratação de profissionais, em sistemas de informação e em estratégias de mercado agressivas. No entanto, essa euforia inicial foi brutalmente interrompida pela crise financeira iniciada em 2008 e pela demora na recuperação da economia americana, que só começou a retomar seu ritmo quatro anos depois. A meta dos cinco milhões de clientes foi sendo adiada e o setor começou a viver uma onda de fusões e aquisições. 

 

Nos últimos cinco anos, 11 grandes operações aconteceram, entre elas a compra da Ágora pelo Bradesco e a união entre a Prosper e Planner. Atualmente, existem pouco mais de 600 mil clientes ativos na Bolsa. Trata-se de um número respeitável, mas apenas 12% da meta prevista. Por isso, a Guide precisava se diferenciar das concorrentes. Baseada na experiência da americana Apple, a empresa usou uma metodologia de trabalho em que os problemas e as expectativas dos investidores eram listados em alguns milhares de pedaços de papel autoadesivos, colando-os nas paredes por assunto, uma das técnicas mais comuns de um método de solução de problemas conhecido como “design thinking”.

 

Nessa forma de trabalhar, o produto é pensado a partir das necessidades e expectativas do cliente. “Com isso, descobrimos o que os clientes gostavam e o que desagradava ao investir, e procuramos desenvolver soluções para esses problemas”, diz Jean Sigrist, um dos sócios responsáveis pela Guide. Ao desenhar o produto, o projetista procura superar as dificuldades do processo. Um bom exemplo é a burocracia ao preencher as fichas cadastrais. “Em vez de o cliente mandar cópias dos documentos em papel ou arquivos escaneados, fomos autorizados a fazer o processo de maneira totalmente automatizada”, diz o sócio Alexandre Atherino, executivo com mais de três décadas de carreira em corretoras. 

 

“O cliente informa seus números e nosso sistema faz as validações nas bases de dados automaticamente, o que poupa trabalho e tempo.” Segundo Aline Sun, executiva recrutada do Banco Itaú, o processo levou a algumas mudanças drásticas no processo de venda de produtos. “Percebemos que era preciso ir além de conhecer a situação patrimonial do investidor; era preciso traçar um perfil psicológico dele, para saber quais as aplicações mais adequadas”, diz. “Isso reduz a probabilidade de oferecermos um investimento volátil para alguém que não fica confortável com as oscilações no mercado.” O mercado mudou. “Tivemos que mudar também”, afirma Sigrist.

 

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