Para a Saint-Gobain, gigante industrial francesa fundada há mais de 350 anos, os números da economia brasileira, em 2015, foram alarmantes. Todos os setores em que a empresa atua no País sofreram quedas acentuadas. No automotivo, para o qual ela produz vidros, as vendas caíram 26,5%, segundo a Fenabrave, entidade que representa as concessionárias de veículos. No mercado de construção, no qual ela atua na fabricação de diversos materiais, como paredes de gesso (drywall), telhas e argamassas, além de controlar a varejista Telhanorte, a situação não foi diferente.

As vendas de materiais de construção declinaram 5,8%, de acordo com a Anamaco, associação que reúne os comerciantes. Já a indústria foi ainda pior: queda de 12,6% no faturamento, segundo a Abramat, representante do segmento. “A situação negativa de renda, emprego e crédito afetou o mercado”, afirma Walter Cover, presidente da entidade. Nada disso, no entanto, é motivo para pessimismo na Saint-Gobain, que inaugurou a primeira das suas 55 fábricas no País há 79 anos.

“Soubemos fazer os ajustes necessários”, afirma o francês Thierry Fournier, presidente da companhia para Brasil, Argentina e Chile. “Nosso faturamento cresceu no ano passado.” Sem revelar as cifras da operação brasileira, Fournier afirma que as receitas repetiram o desempenho de 2014, quando subiram 7%. Globalmente, a Saint-Gobain faturou € 41,7 bilhões em 2014. Como a companhia conseguiu vender mais em um mercado em recessão? A fórmula, segundo Fournier, é composta por vários fatores. O primeiro – e talvez o mais importante deles – foi absorver parte da alta dos custos e repassar ao consumidor final um reajuste abaixo da inflação.

“Tivemos de aumentar os preços, mas abaixo da média”, garante o executivo. Da porta para dentro, a Saint-Gobain promoveu uma forte reestruturação operacional, que incluiu a venda de uma fábrica, reorganização da força de trabalho (com cortes pontuais e realocação de funcionários), melhorias nos processos produtivos e, em especial, a redução do endividamento para um nível próximo de zero. “Entramos em 2016 numa posição extremamente confortável”, diz Fournier. A crise também cria oportunidades de aquisições. 

Logo nas duas primeiras semanas do ano, foram anunciadas as compras das fabricantes de tubos SG Plásticos e a de argamassas Industrial Potengy, por valores não foram revelados. “Temos dinheiro em caixa e na crise sempre há boas opções”, afirma Fournier. Em relação à alta dos juros, se, por um lado, ela dificulta a obtenção de crédito e prejudica as vendas, por outro, deve ajudar a Saint-Gobain a obter ganhos financeiros em 2016. “Essa é uma das vantagens de ser uma empresa global”, diz o presidente. “O grupo pode decidir investir onde existe maior expectativa de retorno, minimizando os efeitos da crise.”

Não é no mercado financeiro, no entanto, que a Saint-Gobain aposta todas as suas fichas. Durante a COP 21, conferência mundial sobre o clima realizada em dezembro, em Paris, o governo brasileiro firmou uma aliança no setor da construção com 19 países, entre eles França, Estados Unidos, Canadá, Japão, Alemanha e México, para lutar contra o aquecimento global. A iniciativa prevê o uso de materiais sustentáveis e soluções limpas em obras públicas e privadas. Mais de 60 organizações e empresas, entre elas a Saint-Gobain, assinaram o documento.

O setor de construção é responsável por 30% das emissões mundiais de CO², segundo dados divulgados durante a conferência. “Um mundo sem emissões de carbono não é incompatível com o crescimento econômico”, afirmou Pierre-André de Challendar, CEO global do grupo, logo após o encerramento do evento. O desenvolvimento de novos materiais e técnicas de construção é um dos pontos fortes da empresa. Este ano, será inaugurado na cidade de Capivari (SP) o primeiro centro de pesquisa e desenvolvimento da companhia no hemisfério Sul.

Desde a criação do programa Minha Casa, Minha Vida, do Governo Federal, a Saint-Gobain vem investindo no desenvolvimento de sistemas de construção customizados para o Brasil. Recentemente, a empresa lançou um tipo de telha capaz de reduzir em até quatro graus a temperatura ambiente da casa. Segundo Fournier, esse tipo de solução cria maior conforto e reduz os custos de energia. “Precisamos quebrar algumas barreiras culturais ainda”, diz Fournier. “O drywall, por exemplo, é pouco utilizado no Brasil, mas é uma solução muito mais eficiente do que as tradicionais paredes de tijolo. Não dá para continuar a construir da mesma forma que se fazia há 100 anos.”