O executivo Antonio Roberto Cortes, CEO da MAN Latin America, fabricante dos ônibus e caminhões da marca Volkswagen, diz estar passando pelo maior desafio de sua carreira. “Se considerarmos o auge do mercado, em 2011, a queda para o ano passado foi de 70%, no setor de caminhões”, afirma. “É muito.” Cortes é um veterano da indústria automotiva – o que aumenta o peso de suas palavras. Ele entrou nesse mercado em 1979. Participou da criação da Autolatina, joint venture entre Ford e Volkswagen no Brasil e na Argentina, em 1986, e foi estrategista da Ford, em Detroit, no início dos anos 1990.

“Mas essa crise tem data para acabar”, ressalta. “Resolvendo a crise política, o otimismo volta.” Ele não sabe exatamente, no entanto, quando isso irá acontecer. De qualquer forma, desde o final do ano passado, Cortes vem preparando a MAN para os novos tempos. E isso significa tomar medidas duras, ou, como ele próprio resume, “rever tudo”. “Estamos entrando em uma nova era, com nova estrutura, novos processos, novos produtos e novos executivos”, afirma. Cortes recebeu a DINHEIRO na manhã do último dia 13, horas antes de anunciar uma campanha interna chamada “Vire a Chave”.

O objetivo é comunicar ao mercado, aos clientes e funcionários esse novo posicionamento. Trata-se, na verdade, apenas da parte visível de um processo que vem acontecendo há meses, e provocou uma mudança drástica no perfil da MAN. Os pilares dessa renovação são a revisão de processos, a readequação de sua estrutura produtiva para a realidade atual do mercado, foco no desenvolvimento de produtos de nicho e especializados, investimentos em tecnologia e o rejuvenescimento de seu corpo diretivo.

Na prática, explica Cortes, é como se a empresa estivesse começando do zero. O orçamento, por exemplo, não sofreu reduções: ele foi inteiramente refeito. “Pegamos tudo o que a gente compra e analisamos cada processo”, diz o executivo. “Não faz sentido comprar uma caneta da mesma forma que se compra aço. Mas, quando se tem um monte de gente para fazer, isso passa batido.” Os esforços resultaram em uma economia de 30% nos custos. No chão de fábrica, houve um encolhimento. A capacidade de produção, que era de 400 veículos por dia, foi reduzida para 110, atualmente.

Apesar de ser um momento difícil, Cortes se mostra orgulhoso pela condução desse processo, feito por meio de programas de demissão voluntária (PDV). A empresa também aderiu ao Programa de Proteção ao Emprego, do Governo Federal, e flexibilizou a jornada de trabalho – hoje, a fábrica funciona só quatro dias na semana. Nesse ponto, a MAN contou com um lance de sorte. A região da cidade de Resende, no Rio de Janeiro, onde fica a fábrica da companhia, recebeu nos últimos anos novas fábricas automotivas, de empresas como Nissan, Jaguar Land Rover e Hyundai.

Os trabalhadores que saíam no PDV arrumavam emprego rapidamente. O número de funcionários no complexo produtivo de Resende caiu de 5,5 mil para 3,5 mil, sendo apenas 1,5 mil diretamente contratados pela MAN. Juntamente com o PDV, a MAN lançou um programa para incentivar a antecipação de aposentadorias. Cortes acredita que é preciso rejuvenescer a empresa, sem abrir mão da sua experiência – do alto dos seus 61 anos de idade e quase 40 anos de mercado automotivo. O programa foi um sucesso, diz ele, sem revelar o número de aderentes.

As áreas de engenharia e vendas contam com novos diretores e vice-presidentes, todos na faixa dos 40 anos de idade. Leandro Siqueira, de 42 anos, o responsável pela engenharia, é o expoente dessa nova geração, que conta também com Antonio Cammarosano (45), diretor de vendas de caminhões, Jorge Carrer (41), responsável pelas vendas de ônibus, e Luciano Cafure (41), que responde pelos mercados internacionais. “Estamos focando muito em conectividade e digitalização, além de novos meios de propulsão”, afirma Siqueira, cujo antecessor, Gastão Rachou, foi um dos executivos que se aposentou.

“O caminhoneiro demanda cada vez mais esse tipo de tecnologia. E isso é algo que os mais jovens têm mais facilidade.” De fato, segundo uma pesquisa feita pela Sontra Cargo, empresa que desenvolve sistemas para contratação de fretes online, 71,8% dos caminhoneiros brasileiros possuem celulares com acesso à internet e 62% dizem que navegam na rede diariamente. “Com a mudança no comportamento online do caminhoneiro, é preciso que as marcas se reinventem”, diz Bruno Moreira, diretor de marketing da Sontra. Beber nessa fonte da juventude, segundo Cortes, já vem dando resultado.

Neste ano, a MAN lançou 20 produtos. São caminhões e ônibus voltados para situações específicas, como fora de estrada, coleta de lixo e transporte de bebidas. As novidades geraram um adicional de 1,2 mil unidades vendidas no primeiro trimestre, para clientes como a Eldorado Brasil, de celulose, que adquiriu 70 unidades do modelo TGX com a configuração Crossover, que tem suspensão elevada, protetores de farol, suportes especiais de amortecedores e tração 6×4. Nessa toada, o CEO acredita que recolocará a companhia de volta ao caminho do crescimento. No ano passado, o faturamento da MAN Latin America foi de € 1 bilhão (cerca de R$ 4 bilhões), menos da metade da receita obtida um ano antes.

A julgar pelo desempenho do mercado de caminhões, será preciso muita jovialidade para reverter o quadro. De acordo com a Anfavea, associação que representa as montadoras, em janeiro e fevereiro, as vendas do setor caíram 35%, em comparação a 2015. Para 2016, a expectativa é que sejam vendidos 62 mil caminhões, patamar equivalente ao de 1999. Nesse cenário, a exportação também ganha importância. A meta é dobrar o porcentual das vendas externas em relação ao total, de 15% para 30%. Os investimentos, por outro lado, estão mantidos. Do total de R$ 1 bilhão reservados para o País, R$ 400 milhões devem ser aplicados neste e no próximo ano.