Nos últimos 18 meses, a cotação internacional do barril de petróleo despencou, passando de US$ 105 até estacionar na faixa atual de US$ 50. O movimento foi suficiente para que muitas empresas do setor suspendessem projetos e iniciassem um vigoroso processo de venda de ativos considerados menos nobres. As medidas tiveram por objetivo reduzir os custos operacionais e reforçar o caixa. Os efeitos desta queda também podem ser vistos nas economias de países produtores situados fora do Oriente Médio, que têm no chamado ouro negro uma fonte importante de divisas. Na quarta-feira, a direção da anglo-holandesa Shell surpreendeu o mercado ao anunciar a aquisição da britânica BG Group.

A transação deve representar um desembolso de até € 64,2 bilhões (R$ 217,7 bilhões), levando-se em conta o prêmio pago aos acionistas, além do montante usado no processo de recompra de ações. Com isso, a petroleira passa a ter acesso a posições estratégicas tanto no segmento de petróleo, quanto no de gás natural. No caso do primeiro, os ativos da BG no Brasil são os mais promissores e, por conta disso, permearam a fala do CEO global da Shell, Ben van Beurden, durante teleconferência com analistas de mercado para falar da aquisição. “No momento, o pré-sal é, talvez, a área mais excitante do mundo para a indústria do petróleo”, afirmou.

No mesmo encontro, o executivo se mostrou muito à vontade quando questionado sobre o noticiário delicado envolvendo sua principal sócia no Brasil, a Petrobras. Pelas regras de concessão, a estatal brasileira tem de atuar, obrigatoriamente, como operadora dos campos do pré-sal. “As manchetes (sobre a Petrobras) não são atrativas, mas estamos falando de uma atuação de longo prazo”, disse. “A Petrobras é uma empresa forte e queremos estar ao lado dela.” A confiança decorre do fato de que, da noite para o dia, a Shell passou a dominar 16% da produção do pré-sal e 6% do total extraído de óleo e gás no Brasil, de acordo com cálculos dos analistas.

A recolocação do pré-sal na ribalta acabou se refletindo positivamente no desempenho das ações da estatal. No pregão de quinta-feira 9, o papel preferencial (PN) liderou a alta da Bolsa de Valores de São Paulo, com valorização de 9,24%. Nesse mesmo dia, a presidente Dilma voltou a defender a Petrobras, em cerimônia de entrega de casas populares em Duque de Caxias, na Baixada Fluminense. Segundo ela, a empresa bateu recorde de produção ao extrair 700 mil barris de óleo no pré-sal, está de pé e já “limpou o que tinha que limpar”. “Se a Seleção Brasileira é a pátria de chuteiras”, afirmou, “a Petrobras é a pátria de macacão e mão sujas de óleo”. Parte da expectativa de analistas está no fato de que a estatal terá como sócia uma empresa com capital para investir e muita confiança no País.

Ao contrário da BG, cujo cacife foi afetado com a queda nas cotações de petróleo. Além de sua robustez (antes da fusão, a Shell era avaliada em US$ 192 bilhões e a BG, em US$ 46 bilhões), os anglo-holandeses também têm mais “gordura para queimar”. Para financiar sua expansão na prospecção de gás e petróleo está prevista a venda de US$ 30 bilhões em ativos, em termos globais. E o Brasil, pelo que se pode depreender da fala do CEO van Beurden, deverá receber uma parte significativa desta bolada. Hoje, os campos de Parque das Conchas, na Bacia de Campos, no litoral Norte do Rio de Janeiro, respondem por 65% do óleo extraído pela Shell no Brasil.