Os títulos emitidos por empresas privadas, como debêntures e commercial papers, são uma alternativa bastante tradicional para os investidores qualificados – com mais de R$ 1 milhão para aplicar – que gostam de renda fixa, mas preferem evitar concentrar suas apostas em títulos públicos. No entanto, nos últimos meses, tem sido difícil para esses aplicadores renovar seus portfólios. A emissão de debêntures no mercado brasileiro recuou 75% nos quatro primeiros meses do ano em relação à média histórica registrada entre 2010 e 2015, de R$ 95 bilhões.

Neste ano, segundo a empresa de registros financeiros Cetip, foram emitidos R$ 23 bilhões, ante R$ 63 bilhões no mesmo período de 2015. As causas da retração do mercado são bem conhecidas. A desaceleração da economia fez as empresas engavetarem novos projetos e investimentos, o que fez minguar a necessidade de capital para expandir a capacidade de produção. Pelo lado do investidor, o aumento da inadimplência reforçou a aversão ao risco, o que fechou as portas do mercado local.

Assim, as companhias brasileiras de primeira linha e que têm exposição ao mercado internacional passaram a recorrer aos investidores americanos, asiáticos e europeus para rolar suas dívidas ou para reforçar seu capital de giro. Companhias como Petrobras e Marfrig captaram, respectivamente, US$ 6,75 bilhões e US$ 750 milhões no mês de maio. Isso criou uma oportunidade aos investidores: para atrair os estrangeiros, essas companhias tornaram apetitosa a remuneração dos papéis, chegando a pagar juros iniciais, o chamado cupom de 8% ao ano, no caso da Marfrig.

Já a Petrobras levantou US$ 5 bilhões em um título com vencimento em 2021, pagando juros iniciais de 8,375% ao ano, e mais US$ 1,75 bilhão, com cupom de 8,750%. Essas taxas representam quase três vezes o prêmio pago por títulos soberanos chineses, que, ao longo dos últimos anos, marcaram presença entre os queridinhos do mercado internacional. Por isso, a estratégia da Petrobras para atrair investidores deu certo – o volume de interessados em comprar os papéis somou US$ 19 bilhões, apesar de a estatal brasileira ser atualmente a companhia mais endividada nos mercados emergentes.

Mais emissões estão a caminho. Comenta-se no mercado que, após a abertura dos trabalhos com Petrobras e Marfrig, empresas de papel e celulose, a petroquímica Braskem, a siderúrgica Gerdau e a BRF são outras companhias que podem recorrer ao mercado externo em breve para fazer emissões. “Há uma percepção de que as coisas melhoraram no Brasil, o que permite às empresas com bons balanços e bons projetos se prepararem para fazer novas captações”, afirma o professor de Finanças da FEA-USP, Roy Martelanc.

Para ele, o investidor brasileiro que pensa em comprar bônus em dólares precisa, antes de mais nada, estar confortável com risco cambial. “Deus inventou o câmbio para ensinar humildade aos economistas, já que é muito difícil acertar”, diz Martelanc. O professor acredita que existem quatro perfis que justificam esse investimento: o investidor estrangeiro, empresas ou profissionais que têm parte de suas receitas em moedas estrangeiras, brasileiros que pensam em morar no exterior ou investidores com perfil especulativo.

Para investir, é preciso buscar uma corretora ou banco de investimento e os aportes variam entre US$ 10 mil e US$ 100 mil. Apesar de ser difícil prever o que vai acontecer com a moeda brasileira, a perspectiva é de alta de 18% nas taxas de câmbio nos próximos 12 meses, segundo o relatório Focus, do Banco Central. Um papel desses pode render suculentos 20% ao investidor, sem contar a mordida do Leão brasileiro. Nos Estados Unidos os bônus são isentos de cobrança do fisco. Aqui, além do pagamento de impostos cuja alíquota varia entre 15% e 22,5% sobre o ganho de capital, há ainda um adicional sobre o lucro obtido com a valorização do dólar em relação ao real.

Segundo Carlos Ratto, diretor-executivo da Unidade de Títulos e Valores Mobiliários da Cetip, outro benefício adicional é que investir em renda fixa é uma espécie de noivado, que permite que se conheça melhor a empresa antes de se optar pela compra de ações, o casamento. Normalmente, um ano após a compra dos bônus, que têm vencimento entre três e cinco anos, o investidor passa a receber pagamentos semestrais de juros. O calote é raro, mas tem se tornado freqüente a renegociação entre empresas e debenturistas, que podem aceitar ou não a extensão ou a mudança dos acordos.

Tanto que, no ano passado, a Cetip criou a funcionalidade take out em seu sistema, para retirada de empresas da janela de liquidação no caso dos bancos emissores fazerem os pagamentos fora dos prazos acertados inicialmente. Antes, isso era feito manualmente. Em caso de calote, e da consequente recuperação judicial, a vida do investidor se complica, porque ele entra no fim da fila para recuperar seu investimento. Mas, segundo Martelanc, esse risco é relativamente baixo.