Na edição que comemorou os dez anos da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), o homenageado foi o escritor mineiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), autor de algumas das mais belas passagens da poesia brasileira, como No meio do caminho, José e Poema de sete faces. Além de celebrar a literatura brasileira e mundial, por meio da participação de autores como o português José Saramago, a festa também se firmou como um privilegiado espaço para prospecção de negócios. Nos cinco dias do evento, que começou na quarta-feira 4, e no qual foram investidos R$ 8,4 milhões, as 28 patrocinadoras usam seus estandes como vitrine para suas obras e para aproximar seus autores do público. 

 

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Por conta disso, não seria exagero dizer que a Flip tem sido uma das responsáveis pela efervescência do mercado literário brasileiro. Desde 2003, quando da primeira edição, o setor passou por inúmeras transformações, a começar pela entrada de gigantes globais como a britânica Penguin, a francesa Larousse e a espanhola Planeta. Nesse período, as vendas do segmento deram um salto de 87% para R$ 4,5 bilhões em 2010, último número disponível. Desse total, os livros didáticos responderam por R$ 1,3 bilhão. Esse crescimento animou empreendedores e executivos da área a apostar em novos modelos de negócio como as editoras-butiques. São empresas que fazem poucos lançamentos e contam com um time de autores renomados. 

 

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Para ler e ver: turista fotografa retratos de escritores em exposição na Flip,

que reuniu cerca de 25 mil pessoas em Paraty.

 

É o caso da jornalista carioca Isa Pessôa, que fundou a Foz Editora, em fevereiro, cujo portfólio inclui 12 autores entre os quais se destacam Chico Buarque, Marcelo Rubens Paiva e Ruy Castro. Eles aderiram ao projeto por confiar na experiência que Isa acumulou ao longo dos 17 anos em que atuou na Objetiva, da qual saiu em 2011, quando vendeu sua participação de 1% no negócio. Foi o compositor de Apesar de você quem ajudou no batismo da empresa que, a princípio, se chamaria Sequoia. “O Chico me falou que o nome era horrível, então resolvi trocar”, diz Isa. Com uma equipe de apenas quatro funcionários, ela diz que não teme ser engolida em um mercado que vem passando por um processo de consolidação e no qual apenas 16 editoras faturam mais de R$ 50 milhões. “A disputa é acirrada, mas leal.” 

 

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A primeira obra do catálogo da Foz é um livro de ensaios intitulado Auto-ajuda, do escritor e letrista Francisco Bosco, filho do compositor mineiro João Bosco. O lançamento está previsto para setembro. Até o fim do ano, deverão chegar às prateleiras das livrarias obras assinadas por Marcelo Rubens Paiva e Ruy Castro. “Queremos lançar, no máximo, 20 títulos por ano”, afirma Isa. Outro filão que vem crescendo na esteira do bom momento vivido pelo mercado editorial é o de escritórios especializados no agenciamento de autores. Trata-se de um nicho no qual quem deu as cartas por muitos anos foi Lucia Riff, fundadora da agência que leva seu sobrenome e que comanda a carreira de autores como o gaúcho Luis Fernando Verissimo. 

 

É nessa arena que a carioca Luciana Villas-Boas e seu namorado, o advogado americano Raymond Moss, especializado em direito autoral, acabam de ingressar com a Villas-Boas & Moss Literary Agency & Consultancy. Egressa da editora Record, Luciana tornou conhecidos escritores como a gaúcha Lya Luft e o catarinense Cristovão Tezza. “Em geral, o autor não sabe negociar a própria obra”, diz Luciana. “Ganhamos uma comissão pelos contratos fechados com editores e outros produtos culturais se o livro for adaptado para cinema, teatro e tevê”, diz. A empresa, que começou a operar em abril com escritórios no Rio de Janeiro, Nova York e Atlanta, já tem contrato com 25 escritores, incluindo o jornalista Edney Silvestre, autor do best seller Se eu fechar os olhos agora, ganhador do prêmio Jabuti como o melhor romance de 2010. 

 

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Carreira solo: Isa Pessôa, ex-Objetiva, leva para sua editora,

a Foz, ícones como Chico Buarque.

 

Tanto Isa quanto a dupla Luciana-Moss estão de olho no crescimento do apetite dos brasileiros pela leitura. De acordo com a edição de 2010 do Censo do Livro, coordenado pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), o brasileiro está lendo cada vez mais. Em 2010, último dado disponível, as vendas de livros para o público em geral cresceram 8,3% em relação ao período anterior. O número de leitores é estimado em 50 milhões. Ainda assim, a média é baixa. O brasileiro lê quatro livros por ano, enquanto nos Estados Unidos o número chega a 17. “Temos um mercado potencial muito grande”, diz Karine Pansa, presidente da Câmara Brasileira do Livro. “O surgimento de novas editoras traz mais opções para o público e eventos como a Flip chamam a atenção dos leitores.”

 

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