23/08/2016 - 18:00
P ouco mais de trinta minutos separam as cidades de Itu e Indaiatuba, no interior de São Paulo. Trata-se de um caminho tranquilo, percorrido diariamente por muitos trabalhadores da região. Mas, recentemente, o trajeto ganhou relevância no mapa da Lenovo, líder mundial em computadores e dona de uma receita de US$ 44,9 bilhões. Na semana passada, a companhia chinesa concluiu a transferência da sua fábrica, instalada em um terreno de 52 ml metros quadrados, no quilômetro 11 da rodovia SP-75, em Itu, para um galpão de 23 mil metros quadrados, no Centro Logístico de Indaiatuba. A nova unidade tem capacidade produtiva de 1 milhão de equipamentos por ano. A antiga estrutura tinha condições de fabricar o dobro desse volume. Mais que uma simples mudança de ares, a medida é parte do roteiro que a marca chinesa traçou para atravessar a retração da categoria no Brasil, reduzir custos e, ao mesmo tempo, ganhar fôlego para alcançar o topo.
Segundo a consultoria IDC, as vendas de computadores no Brasil caíram 36% em 2015. Com 6,6 milhões de unidades, o volume é similar ao patamar registrado dez anos antes. “De um dia para o outro, todos os fabricantes estavam maiores do que precisavam. Tínhamos que tomar uma decisão”, diz Silvio Stagni, 55 anos, presidente da Lenovo no Brasil. O executivo lidera os negócios de computadores e servidores da marca no País. A operação de celulares, fruto da compra da Motorola, é independente e está sob o comando de Sergio Buniac. “Estamos mais enxutos. Nesse momento, é essencial manter a eficiência.”
A nova abordagem contrasta com a postura agressiva que a Lenovo adotou no Brasil a partir de 2012. Na época, o País oscilava entre a terceira e quarta posições no ranking dos maiores mercados globais de computadores. Atual-mente, figura no sétimo lugar. Desde então, a companhia chinesa não mediu esforços para ganhar mercado. No periodo, o investimento local de maior destaque foi a compra da CCE, em setembro de 2012, por R$ 300 milhões. Da mesma forma, a devolução da empresa, em outubro de 2015, aos antigos donos, a família Sverner, é o maior símbolo da nova estratégia local. Alguns meses antes, a Lenovo já havia deixado de produzir as tevês e equipamentos de áudio da fabricante brasileira. No processo, houve uma redução significativa no time local. Após a aquisição, a Lenovo chegou a ter 3 mil funcionários no País. Hoje, são 800 profissionais. Stagni observa que a retração do mercado, especialmente nos produtos de entrada, foco da CCE, justificou a decisão. Ele ressalta, porém, que o objetivo inicial foi alcançado. Mais conhecida pela atuação no mercado corporativo, a marca chinesa conquistou espaço entre os consumidores brasileiros. “Saímos de uma participação de 2% no varejo, em 2012, para 20%”, afirma. Embora as consultorias nåo divulguem dados de participação dos fabricantes no mercado nacional, a americana Dell lidera as vendas. Hewlett-Packard (HP) e Lenovo revezam-se na segunda colocação. “Sem o fardo da CCE, o caminho da Lenovo fica menos tortuoso”, diz Ivair Rodrigues, sócio e analista da consultoria brasileira IT Data.
Os sinais de que os dias de CCE ficaram para trás são claros. “Não vamos entrar em guerra de preços para ganhar participação”, diz Stagni. No lugar de um leque amplo de produtos, a Lenovo reduziu seu portfólio no varejo de 30 para 13 linhas, de maior valor. A empresa está se concentrando em máquinas mais finas e leves, com telas sensíveis ao toque e re-cursos sofisticados. Os computadores 2 em 1, que podem ser usados como tablets ou notebooks, também ganharam relevância. “Estamos com uma oferta menor, mas muito mais assertiva.” Ele ressalta que, além das margens mais atrativas, as vendas para empresas vêm sofrendo me-nor impacto da crise. Neste ano, por exemplo, a Lenovo fechou contratos de 40 mil máquinas para o Bradesco e de 45 mil para a Caixa Econômica. Para ampliar sua presença nesse perfil de cliente, uma aposta é a linha de servidores comprada da IBM em 2014, por US$ 2,1 bilhões.
Apesar da queda do mercado brasileiro, Pedro Hagge, analista da consultoria IDC, vê boas perspectivas no País. “O Brasil é gigantesco e uma boa parcela da população nunca teve um computador”, diz. Stagni reforça: “Não tenho dúvida que o Brasil voltará a ser um dos principais mercados do mundo”, afirma. Ele estima uma retomada no primeiro semestre de 2017. “Quem conseguir identificar esse momento primeiro e com mais clareza, vai levar vantagem nessa corrida.”