Poucas marcas têm sua trajetória tão intimamente associada à existência de equipamentos de áudio e vídeo quanto a da Japan Victor Company, mundialmente conhecida como JVC. A empresa inventou a vitrola nos anos 1920, depois de transformar o fonógrafo esboçado pelo americano Thomas Edison em um equipamento comercial de som, o gramofone. Em 1976, inventou o VHS, mais famoso como vídeo-cassete, revolucionando a indústria da produção cinematográfica.

Não demorou muito para também inventar as filmadoras portáteis para uso doméstico e as câmeras fotográficas que cabem no bolso, entre muitos outros aparelhos. Em seus 89 anos de existência, a companhia, que faturou US$ 2,3 bilhões em 2015, só não conseguiu inventar um produto à prova de crises. O rápido avanço das novas tecnologias, a popularização das filmadoras em smartphones e a concorrência com marcas coreanas e chinesas no segmento de televisores quase levaram a gigante à lona por algumas vezes nas últimas duas décadas.

“Tivemos de unir forças para nos adaptar aos novos tempos”, reconheceu o CEO global da companhia, Haruo Kawahara, em recente entrevista à imprensa americana. “Mais do que inventar, é hora de nos reinventar.” Essa reinvenção da JVC nos 52 países em que atua começou de forma mais intensa em 2008, quando a marca deixou o grupo Matsushita – proprietário também da Panasonic – e partiu para o ataque com uma estratégia mais focada. Em 2011, a empresa se uniu à compatriota Kenwood, criando a JVC Kenwood Corporation.

A divisão de televisores, pouco rentável em um mercado altamente disputado, foi licenciada para a sul-africana Nu-World, que detém em seu portfólio marcas como Telefunken, Fenici (alisadores e modeladores de cabelo) e Goldair, de ventiladores. Vendeu, mas também comprou. Em 2013, adquiriu a japonesa Totoku, fabricante de equipamentos médicos, e passou a concorrer com gigantes como GE, Siemens e Philips. Logo depois, incorporou a americana Zetron, de sistema de comunicação, utilizados em portos e aeroportos.

No ano passado, foi a vez da italiana ASK, que fornece equipamentos eletrônicos para automóveis e mantém no Brasil, na cidade mineira de Sete Lagoas, uma de suas cinco fábricas. “A companhia chegou à conclusão que deveria se voltar ao setor de fones de ouvido, equipamentos automotivos e rádios transmissores para fins profissionais, nos quais somos referência”, disse o diretor da subsidiária brasileira, Walter Sitta. As cifras envolvidas nas negociações não foram reveladas. A tática da companhia japonesa tem tudo para dar certo, segundo especialistas.

“Buscar mercados mais rentáveis foi o mesmo que fez a Philips, ao deixar as tevês de lado para se dedicar a equipamentos médicos, e a Sony, que desistiu do setor de som automotivo, no caminho inverso ao da JVC”, diz Kevin Shiling, especialista em tecnologia na consultoria americana Life Consulting. “Com uma marca forte como essa, é meio caminho andado para se consolidar em qualquer segmento que quiser.” O plano da JVC Kenwood de se dedicar aos equipamentos de som transformou o Brasil em uma peça-chave. Mesmo com a forte crise que abateu a indústria automobilística nacional no ano passado, que despencou 22,8%, o País é o sétimo colocado no ranking mundial dos maiores produtores de automóveis.

Na contramão da crise, a marca passou de 2% de participação de mercado, em 2011, para os atuais 10%. A empresa japonesa vendeu 2,4 milhões de aparelhos de som para carros no Brasil em 2015, o mesmo volume registrado em 2014 e semelhante à quantidade de carros no País, no mesmo período. “Empatar em volume num ano em que o mercado retraiu, é uma vitória”, afirmou Sitta. “Conseguimos compensar a queda nas vendas das montadoras diversificando os canais de distribuição, como concessionárias e centros automotivos.” No Brasil, a JVC Kenwood produz na Zona Franca de Manaus por meio de uma fábrica terceirizada, a Flex Industries, e fornece para montadoras como Nissan, Fiat, Ford, Troller e Mercedes-Benz.

Outra aposta da empresa para conseguir dançar ao ritmo da economia, sem perder o passo, é a parceria com o Google e a Apple no desenvolvimento de uma plataforma exclusiva que integra os smartphones às centrais multimídia do carro. Embora seja um mercado ainda minúsculo no Brasil e no mundo, as tecnologias que integram celulares a automóveis serão cada vez mais acessíveis aos consumidores nos próximos anos, na opinião de Sitta. Chamadas de Android Auto e CarPlay, respectivamente, as novidades são aguardadas para estrear no Brasil, em português, daqui a dois meses. “Essa é a grande invenção da JVC Kenwood para o mercado brasileiro neste ano”, garante Sitta.