“Como diz o ditado, é vida que segue.” Esse lacônico comentário resume a reação de Wesley Batista, o presidente global da JBS, diante da decisão da BNDESPar, o braço de participações do BNDES, de vetar aquela que seria a maior jogada da companhia desde que ela começou sua expansão internacional, em 2005. Dona de 20,36% do capital da JBS, a BNDESPar exerceu, na terça-feira 25, seu direito a veto no ambicioso projeto de reestruturação do grupo, como prevê o acordo de acionistas da companhia.

Gestado desde o início do ano e divulgado em maio, depois de ser aprovado em uma reunião do Conselho de Administração, o plano previa transferir as operações da Seara, no Brasil, e as da JBS USA, para uma holding europeia, a JBS Foods International, que ficaria na Irlanda. Os Batistas planejaram essa operação para reduzir o “custo Brasil”, ampliar acesso da empresa a capitais mais baratos e, desta forma, aumentar o valor do negócio. “O plano era maximizar o valor para o acionista. Acreditamos que o valor da JBS não reflete a soma dos negócios da companhia.

Continuaremos buscando formas de atingir esses objetivos”, afirmou Wesley, em teleconferência com analistas, na manhã de quarta-feira 26. Procurado pela DINHEIRO, o empresário preferiu não fazer nenhum comentário adicional. No dia do anúncio do veto, o valor de mercado da companhia encerrou o pregão em R$ 28,37 bilhões, R$ 4 bilhões a menos do que o anterior, com as ações cotadas a R$ 10,44, após queda de 11,5%. Apesar desses números, Batista disse estar confiante pelo apetite global por proteínas.

“Temos várias alternativas, como a abertura de capital da JBS USA, na Austrália, na Europa e da JBS Foods (que detém a marca Seara), no Brasil. Vamos analisar todas essas possibilidades nos próximos meses e decidir quais serão os movimentos que fazem sentido para a companhia para, assim, gerar valor”, disse Wesley. A empresa não precisa do aval do BNDES para abrir o capital de suas subsidiárias. Na opinião de analistas, lançar ações em bolsa da JBS USA parece ser o caminho mais natural a ser seguido pela companhia, assim como a abertura de capital da JBS Foods.

O empresário negou haver atritos com o BNDES, mas reconheceu estar desapontado. “Nós discordamos da análise, mas resolvemos respeitar a decisão e cancelar a reorganização.” Os analistas do Deustche Bank, em relatório enviado para investidores, afirmam que “a decisão sinaliza que o relacionamento entre o BNDES, o segundo maior acionista da JBS, está fraturado, e assim deve permanecer até 2019, quando expira o atual acordo de acionistas.” Em nota, o BNDESPar informou que “vetou a operação porque não a considerou como a alternativa que melhor atende aos interesses da companhia e de seus acionistas.”

O comunicado acrescenta ainda que “a reorganização proposta, ao prever a transferência da propriedade de ativos que representam aproximadamente 85% da geração do caixa operacional da JBS para uma companhia estrangeira, implicaria na desnacionalização da empresa e alteraria substancialmente os direitos e deveres conferidos a todos os acionistas, com repercussões de diversas naturezas, e submetendo-os a legislação e jurisdição estrangeiras.” Em maio deste ano, o presidente Michel Temer indicou Maria Silvia Bastos para comandar o BNDES.

Ela, por sua vez, fez mudanças nas diretorias e nos processos, a partir de junho. A JBS não ficou à margem das alterações de Maria Silvia. “Houve mudança do conselheiro e da equipe de analistas que acompanha a JBS”, afirmou Wesley, na teleconferência. Na reunião do conselho em que o BNDESPar deu o aval à reorganização, o conselheiro era João Carlos Ferraz. Mas, em agosto, ele foi substituído por Claudia Azeredo Santos. Ao final da nota, a BNDESPar reiterou “seu total apoio à JBS” e afirmou “permanecer aberta para avaliar outras alternativas de reorganização societária que venham a ser apresentadas pela companhia.”

Para Adeodato Netto, da empresa de informações financeiras independente Eleven Financial, a JBS pode ter dificuldade para manter sua fatia no mercado local. “No começo do ano, a JBS aproveitou o momento delicado da BRF, impactada pela alta do preço do milho e pelo reajuste de preços, para ganhar participação. O problema é que, com isso, ela esgotou sua capacidade de produção e teria que abrir novas plantas ou fazer aquisições para manter esse market share, e isso leva tempo.” Soma-se a isso, o fato de que, ao relançar a marca Perdigão, em 2015, a BRF colocou a marca de alimentos processados para competir em preço com a Seara, da JBS. “A BRF passou a estipular os preços porque tem duas marcas: a Sadia, com um posicionamento mais elevado, e a Perdigão, mais acessível.”