Se o investidor está em busca de sair dos riscos locais, ir para o mercado americano pode não ser uma boa alternativa. Enquanto o Ibovespa subia 3,7%, o índice de BRDs (BDRX), que reúne ações de empresas americanas negociadas no Brasil, recuava 24,6% no acumulado do ano até segunda-feira (28). O indicador saiu dos 15.381 pontos para os 11.597 pontos.

Já quando o investidor observa o setor de tecnologia, vê que a situação fica ainda pior. O Nasdaq, principal índice do segmento, caiu 29,8%. Para o analista Richard Camargo, da Empiricus, o ano não foi nada agradável. “O desempenho dos ativos de risco foi péssimo no acumulado do ano por causa do ciclo de alta de juros”, afirmou.

No início de 2022, a taxa de juros dos EUA, conhecida como Fed funds, estava em 0,25% ao ano. Na última reunião, dia 2 de novembro, a equipe do banco central americano elevou a taxa de 3,25% para 4% ao ano. Para a analista de internacional da XP Investimentos, Pietra Guerra, o avanço dos juros desacelerou empresas como a Amazon. “A inflação e a alta de juros foram uma verdadeira pedra no sapato da Amazon, visto que as pessoas deixaram de comprar produtos não tão essenciais, como roupas e eletroeletrônicos, para adquirir itens prioritários, como alimentos”, afirmou.

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“A situação só vai melhorar quando os juros baixarem, mas o mercado não espera uma sinalização de corte até o fim do 1o semestre de 2023” Pietra Guerra analista de internacional da XP Investimentos.

Essa priorização é um dos motivos para a redução de 9% no lucro do terceiro trimestre da empresa fundada por Jeff Bezos. A companhia ainda anunciou a demissão de 10 mil funcionários. Outras big techs também seguiram esse caminho e tiveram de fazer cortes, como o Twitter, com 4 mil demissões confirmadas. Outro caso foi o da Meta, que anunciou no início de novembro a saída de mais de 11 mil funcionários. E da HP, que disse na quarta-feira (23) que cortaria mais de 6 mil empregados.

As análises para os cortes são variadas. Segundo o analista Luis Novaes, da Terra Investimentos, a maior parte dessas contratações foi realizada durante a pandemia, momento em que os serviços ofertados por essas empresas se mostraram como as melhores alternativas. “Muitos acreditavam que essa demanda poderia ter caráter permanente, como reflexo de um novo normal, mas isso não ocorreu”, disse Novaes.

Já Richard Camargo considera que a própria alta de juros fez essas empresas tirarem o pé do acelerador. “O aumento das taxas por si só causa uma desaceleração da economia, então todas as empresas foram desacelerando e no setor de tecnologia não foi diferente”, afirmou.

De acordo com Pietra Guerra, da XP, a Meta teve outras pedras no caminho. Segundo ela, o fato de a empresa ser de tecnologia focada em comunicação trouxe outros problemas. “Ela acabou sofrendo com a concorrência de plataformas chinesas e com a política de privacidade da Apple, que acabou interferindo na efetividade dos anúncios, uma das fontes de receita”, disse .

Ainda assim, as demissões são vistas como positivas no mercado, por enxugar gastos em um momento desafiador. É o que comenta Camargo, da Empiricus. “Os cortes foram positivos para todas as empresas, visto que isso preserva a saúde financeira delas no curto prazo.”

CONEXÃO LENTA Embora as demissões possam ter sido necessárias, o recorte que se desenha para os próximos meses não é tão animador. Os especialistas acreditam que a melhora nessas BDRs vai depender de variáveis macroeconômicas. Segundo Pietra Guerra, o primeiro ponto seria o fim das altas de juros nos EUA ou até mesmo o início de um ciclo de corte. “O mercado, no entanto, não espera sinalização de corte até o final do primeiro semestre de 2023”, disse. “Mas se isso acontecer poderemos ver um grande alívio nas empresas de tecnologia e na renda variável (ações).”

O segundo item da lista, de acordo com Luis Novaes, da Terra Investimentos, é que as empresas já chegaram ao auge e não vão crescer exponencialmente, como antes. “As companhias americanas do setor de tecnologia demonstram estar chegando ao estágio de maturação do negócio, após tantos anos de crescimento expressivo”, afirmou. Isso vale pelo menos para a maioria delas. Nessa linha, Pietra Guerra calcula que boa parte dessas grandes corporações está com os papéis caros, quando comparadas por exemplo com o Google pela variável preço sobre lucro. “Quanto menor é o indicador, melhor. A Amazon é negociada a 93 vezes, enquanto o Google é negociado a 19 vezes”, disse a analista. Portanto, o melhor é o investidor tomar cuidado com BDRs de tecnologia para não desconectar o próprio dinheiro em meio às pressões econômicas.