Na tarde da quinta-feira 9, o empresário Carlos Alberto de Oliveira Andrade, dono do grupo Caoa/Hyundai, maior importador brasileiro de veículos, não tirava os olhos dos monitores, nos quais acompanhava, minuto a minuto, a cotação do dólar. Ao final, ele fechou uma operação de US$ 76 milhões, a um câmbio de R$ 1,718, bem abaixo do fechamento do dia, que ficou em R$ 1,725. Ele avalia que a cotação da moeda americana, que despencou 13% desde o início de setembro, vai cair ainda mais. 

 

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“Se não fossem as intervenções diárias do Banco Central, o dólar já estaria a R$ 1,67”, disse ele à DINHEIRO. “Ainda assim, acho que vai chegar a R$ 1,60 até o fim do ano.” 

 

E por que então ele comprou, já que seu produto deve ficar mais barato? Com as vendas crescendo 50% em relação ao ano passado, o empresário não pode ficar sem estoque. 

 

Nesses últimos dias, a atuação do BC foi forte. Em setembro, as reservas internacionais aumentaram US$ 1 bilhão, chegando a US$ 262,1 bilhões. No dia 8, a Vale fez uma disputada captação de US$ 1,75 bilhão. 

 

Bancos que reservaram US$ 100 milhões não conseguiram mais do que 10% desse montante, tal a procura pelos papéis da empresa. A Telemar também captou no Exterior US$ 1 bilhão e a Odebrecht vendeu US$ 500 milhões em bônus perpétuos, que não têm prazo definido de vencimento.

 

A menos de um mês da eleição presidencial, o Brasil recebe uma avalanche de dólares. Uma situação incomum, bem diferente das campanhas anteriores. No início de setembro de 2002, um dólar valia cerca de R$ 3. No fim daquele mês, chegava perto de R$ 4. 

 

Oito anos depois, a situação é bem diferente. Resultado de uma combinação de fatores: forte fluxo de dólares para a capitalização da Petrobras, marcada para o dia 31 deste mês, captações no Exterior de outras empresas brasileiras e, especialmente, a aposta de investidores de que o ciclo de fortalecimento da moeda brasileira vai continuar. Em agosto, os bancos tinham US$ 13,7 bilhões em posições vendidas no mercado futuro, uma indicação de que acreditam que o real vai se valorizar ainda mais.

 

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A tranquilidade do cenário, apesar das declarações do candidato José Serra de que estranha o fato de que o dólar flutuante “só flutua para baixo”, pode ter duas explicações: reflexo do favoritismo de Dilma Rousseff nas pesquisas de intenção de voto ou a crença do mercado de que as declarações de Serra sobre o câmbio não refletem de fato uma promessa de governo. 

 

“Existe uma percepção de que se trata apenas de um discurso de campanha”, diz o economista-chefe para a América Latina do banco West LB, Roberto Padovani. “Esta eleição presidencial sugere uma apreciação cambial”, afirma.

 

Mas se os investidores estão tranquilos quanto aos rumos da economia brasileira a partir do ano que vem, o Banco Central está preocupado com a enxurrada de dólares. O presidente do BC, Henrique Meirelles, não fala sobre o assunto, mas comanda uma forte operação de disputa de preço via leilões de câmbio. 

 

Apesar disso, a atração do mercado brasileiro tem sido maior. Entre janeiro e julho, o volume de captações chegou a US$ 20 bilhões – mais do que o dobro dos US$ 8,4 bilhões registrados no mesmo período de 2009. Se as operações dos últimos dias trouxeram mais de US$ 3 bilhões ao mercado, as próximos terão um volume muito maior. Somente com a capitalização da Petrobras, o mercado estima que entrarão no País US$ 30 bilhões de capital externo. Também estão a caminho operações de captação de moeda estrangeira do BNDES e do Banco do Brasil. 

 

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Henrique Meirelles: leilões diários do BC têm impedido uma valorização ainda maior do real

 

Se por um lado, o interesse dos estrangeiros é sinal de uma economia forte e resistente aos ciclos eleitorais, por outro o fortalecimento da moeda brasileira traz problemas para os exportadores – e potencialmente para empresas que se protegem das oscilações cambiais com derivativos, como ccorreu com a Sadia e a Aracruz em 2008. 

 

O secretário de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Weber Barral, reconhece que o governo não tem muito o que fazer para mudar essa situação, a não ser investir no aumento da competitividade das exportações através de medidas burocráticas que simplificam procedimentos e reduzem os custos das empresas exportadoras. 

 

“Nos próximos meses vamos finalizar as medidas que vão permitir que exportadores entrem no Simples e empresas brasileiras tenham vantagens em compras do governo”, disse à DINHEIRO. 

 

O superávit da balança comercial brasileira, que foi de US$ 25 bilhões no ano passado, caiu para US$ 11 bilhões no acumulado dos oito primeiros meses deste ano. Sem a ajuda da balança comercial, sobra para a conta de capitais a tarefa de equilibrar as contas externas. Em julho, o déficit de US$ 4,49 bilhões em transações correntes teve o pior desempenho desde 1947, início da série histórica.