20/03/2013 - 21:00
Um grupo de 11 homens engravatados chegou à sede do Ministério da Fazenda no fim da tarde da segunda-feira 11. Eles atendiam a um convite do ministro Guido Mantega, para um evento que já foi comum até o início dos anos 90 – mas se tornou raro na última década, quando a inflação caiu para níveis mais comportados. Acomodados ao redor da mesa retangular, onde se realizam as reuniões do Conselho Monetário Nacional, no sexto andar do Ministério, representantes de empresas como Cargill, Bunge, BRF e redes de varejo como Carrefour e WalMart ouviram o apelo do ministro: a inflação de alimentos está num nível preocupante e o governo conta com eles para repassar aos preços toda a redução de impostos sobre a cesta básica anunciada dias antes pela presidenta Dilma Rousseff.
Às compras: consumidores vão pagar menos para encher os carrinhos
O apelo aos empresários mostra uma mudança de postura em relação à inflação. Até o início do ano, o governo desprezava o aumento dos preços, atribuída exclusivamente à alta dos alimentos no mercado internacional, com impacto limitado. Agora parece convencido de que a alta dos alimentos e dos serviços, os grupos que mais subiram no último ano, tem o poder de se espalhar por toda a economia. Nos últimos 12 meses, enquanto o IPCA acumula alta de 6,31%, o preço dos alimentos subiu 13,88%, mais do que o dobro. Nos serviços, a alta acumulada é de 8,65%. O discurso oficial começou a mudar no fim de fevereiro, quando a presidenta Dilma afirmou que a inflação, “é um valor em si”. Desde então, o governo vem mostrando que sabe a importância da estabilidade, condição fundamental para os investimentos e a manutenção do emprego e do poder de compra dos consumidores.
“Eu não descuido um só momento do controle da inflação, pois a estabilidade da economia é fundamental para todos nós”, afirmou Dilma no pronunciamento de rádio e tevê, no dia 8, quando anunciou que os produtos da cesta básica não pagariam mais impostos federais. Após a reunião com o setor privado, Mantega disse que a desoneração “beneficia o consumidor e também a luta contra a inflação”. Os empresários prometeram reduzir os preços, mas a queda não será na mesma proporção. Enquanto o fim do IPI e do PIS/Cofins vai reduzir os preços entre 9,25% e 14,25% (veja quadro abaixo), para o consumidor a queda será de 6% no preço das carnes e de 3% a 5% nos demais produtos.
Mantega e os empresários: ministro da Fazenda recebe a promessa de que os preços serão reduzidos
O presidente da Associação Brasileira de Supermercados (Abras), Fernando Yamada, elogiou a desoneração, mas reclamou que os impostos continuam elevados. “Mesmo com essas reduções, a carga tributária dos alimentos é alta no Brasil e precisa cair mais”, afirmou, lembrando que esses produtos ainda pagam ICMS, um imposto estadual. O repasse para os preços será menor também porque as empresas podem aproveitar a redução de custos para recompor as margens de lucro. O economista Octávio de Barros, diretor do departamento de economia do Bradesco, calcula em 0,60 ponto percentual o impacto da desoneração da cesta básica, mas acha que o repasse será parcial, e vai resultar numa redução de 0,40 ponto percentual na inflação anual. Ainda assim, todas as projeções de inflação colocam o índice acima de 5%, superior ao centro da meta pelo quarto ano consecutivo.
O corte dos tributos também pode prolongar o ciclo de juros baixos do Banco Central. A taxa Selic foi mantida em 7,2% por unanimidade no início de março, mas a ata da reunião divulgada na quinta-feira 14, mostra um BC mais preocupado com o custo de vida. Dois dias antes, em discurso em Varsóvia, Polônia, Tombini classificou a inflação brasileira de “resiliente”. No mercado futuro, os juros caíram com a redução dos impostos, subiram com as declarações de Tombini e voltaram a cair após a publicação da ata. A leitura do mercado é que o Copom só elevará a Selic em maio se o índice não ceder. A entrada da safra recorde de grãos deste ano pode dar um alívio no preço dos alimentos, ajudando o BC a manter os juros inalterados por mais tempo.