14/03/2012 - 21:00
A cidade de Ribeirão das Neves, na região metropolitana de Belo Horizonte, Minas Gerais, está no centro das atenções da indústria de componentes eletrônicos brasileira. É lá que o sétimo homem mais rico do mundo, Eike Batista, em parceria com o ex-presidente da Volkswagen no País, o empresário alemão Wolfgang Sauer, pretende construir uma fábrica de semicondutores. O projeto tem apoio do governo mineiro e será financiado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). No fim de fevereiro, a Companhia Brasileira de Semicondutores (CBS ), empresa que encabeça a iniciativa, obteve as licenças ambientais necessárias para a implantação do empreendimento.
Indústria de ponta: Wolfgang Sauer quer inserir o Brasil no cobiçado setor de fabricação de chips.
A iniciativa pretende transformar um antigo sonho do governo federal em realidade. Há pelo menos uma década que a instalação de uma fábrica de chips é assunto recorrente no Palácio do Planalto – o projeto da CBS vem sendo anunciado pelo septuagenário Sauer desde 2003. Se concretizado, o plano teria o dom de inserir o Brasil, como num passe de mágica, em um setor que movimenta por ano cerca de US$ 300 bilhões no mundo. O problema é que, se por um lado a expectativa pela viabilidade da empreitada é grande, por outro o ceticismo é maior ainda. Para o mercado, o chip brasileiro não deve passar de uma ilusão de ótica. Os investimentos para a construção da fábrica mineira estão estimados em US$ 500 milhões.
Com a entrada de Eike no projeto, os planos são de começar a produzir em dezembro de 2013. Desenvolver esse tipo de tecnologia localmente seria uma forma de reduzir o déficit da balança comercial do setor de eletrônicos no Brasil, que em 2011 ultrapassou a marca dos US$ 30 bilhões, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). Quase a metade desse gasto corresponde à importação de semicondutores e componentes para telecomunicações. Mas o que atrapalha, então, a instalação dessa indústria no Brasil, levando-se em consideração que o mercado brasileiro de computadores hoje é o terceiro maior do mundo?
Uma das razões, segundo Julio Gomes de Almeida, consultor do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), é que o País não oferece os atributos necessários para atrair as grandes empresas do setor, como a Intel, AMD e Qualcomm, por exemplo. “A infraestrutura não melhora; a energia tem um custo elevadíssimo; e a qualificação de mão de obra deixa muito a desejar”, afirma Gomes de Almeida. Por ser de alta tecnologia, o mercado de semicondutores demanda toda uma cadeia de suprimentos e logística que não existe no País. Isso sem falar no fato de que a legislação tributária brasileira é muito complexa e o desembaraço aduaneiro é diferente do de países desenvolvidos.
“A indústria tem receio de vir para cá”, afirma Rogério Nunes, diretor da Abinee responsável pela indústria de componentes. É verdade que ocorreram avanços nos últimos anos. Nunes, por exemplo, comanda no Brasil a Smart Modular Technologies, fabricante americana de memórias para computadores que instalou em 2006 uma unidade de “encapsulamento” de chips, em Atibaia, no interior paulista. Outro exemplo recente é a inauguração da fábrica da Ceitec, em 2010, na capital gaúcha. A estatal é apontada como o embrião da fábrica de semicondutores brasileira.
A companhia, porém, ainda não começou a fabricação de chips por conta de problemas no sistema de purificação de água. Para Roberto Brandão, gerente de tecnologia da empresa de processadores AMD, o respeito internacional do Brasil melhorou bastante. “Mas o País ainda não está no ponto em que deveria estar”, diz. “O que falta para o Brasil, além de toda a infraestrutura, é investir no setor de design de chips.”Para ele, esse é o começo do processo produtivo e está baseado apenas no conhecimento técnico. Como se vê, será necessário superar desafios complexos para que a primeira fábrica de semicondutores brasileira se torne real e não seja apenas mais um sonho de uma noite de verão.