10/10/2014 - 20:00
O alemão Leo Apotheker, ex-CEO da HP, está longe dos holofotes, ocupando o cargo de vice-presidente do conselho da francesa Schneider Electric. Desde que deixou o comando da Hewlett-Packard, em setembro de 2011, ele mantém-se num estado de obsequioso silêncio nos assuntos relacionados à empresa americana. Se abrisse a boca e tivesse um surto de sinceridade, provavelmente diria: “Eu bem que disse, eu bem que disse”. Afinal, uma de suas bandeiras no pouco mais de um ano em que ocupou a presidência da empresa foi a divisão da HP em duas: uma para os clientes corporativos, outra para o consumidor final.
É exatamente esse movimento que está sendo executado agora por sua sucessora, Meg Whitman, que a princípio não simpatizava com a proposta de Apotheker. “Nosso trabalho nos últimos três anos tem fortalecido significativamente nossos negócios principais a ponto de podermos agressivamente ir atrás das oportunidades criadas por um mercado em rápida mudança”, disse Meg, em um comunicado. Quando a transição estiver concluída, ela será a CEO da Hewlett-Packard Enterprise, voltada a serviços para empresas. Dion Weisler, vice-presidente que anteriormente trabalhou para a chinesa Lenovo, estará à frente da HP Inc, de computadores pessoais e impressoras.
Meg bem que tentou dourar a pílula, mas parte do mercado não viu com tanta boa vontade o movimento. “HP, eBay, Nokia, Motorola,” afirmou o analista Horace Dediu, da consultoria finlandesa Asymco. “Dividir um negócio nunca é sinal de prosperidade.” Outros analistas veem que a empresa fundada por Bill Hewlett e David Packard, em 1939, em uma garagem, pode ter vantagens competitivas. “A mudança permitirá um foco no modelo de negócios dos PCs, apoiado pela receita das impressoras”, diz Ranjit Atwal, analista da consultoria Gartner. “Estamos na era dos dispositivos, na qual o PC é só mais um.”
A HP sofre da síndrome pós-PC, que acometeu a maioria das empresas do setor. O computador pessoal perdeu o protagonismo no universo digital, suplantado por smartphones e tablets. Os números falam por si. Em 2013, foram vendidos 315,9 milhões de PCs, uma queda de 10,4%, a maior da história, segundo a consultoria Gartner. Entre 2010 e 2012, as vendas ficaram estagnadas. Os gastos com serviços de tecnologia, por sua vez, devem alcançar US$ 964 bilhões, em 2014, alta de 4,6%. Melhor: as margens de lucro, nessa área, são bem mais generosas. Por essa razão, a HP Enterprise, que terá receitas de mais de US$ 50 bilhões, é considera a joia da coroa dessa cisão.
Os sinais de que a HP precisava se reinventar eram claros, há muito tempo, mas só agora, com três anos de atraso em relação ao plano de Apotheker, o processo é levado a sério. Mas, para ser bem-sucedida, a empresa terá de correr atrás de seus principais concorrentes. A Lenovo, que passou a HP em vendas no mercado de PCs, no ano passado, investe em smartphones. Sua aposta mais arriscada foi a compra da Motorola, que pertencia ao Google, por US$ 2,9 bilhões. Com a marca americana que inventou o celular, os chineses passam a ter relevância global na área de celulares inteligentes.
Antes, sua operação de telefonia móvel estava restrita à China. As taiwanesas Acer e Asus, que figuram entre os cinco maiores fabricantes de PCs, também diversificaram suas ofertas. Nos últimos meses, elas lançaram chromebooks (laptops com sistema operacional do Google), híbridos de tablets e PCs, tablets, smartphones, relógios inteligentes, entre outros produtos. A mudança de rumos mais brusca foi protagonizada pela da americana Dell. A companhia fechou o capital, em outubro do ano passado.
O objetivo de seu fundador, Michael Dell, era retirar a empresa da Bolsa para poder realizar as mudanças necessárias sem a pressão imediatista dos acionistas por resultados financeiro. Em meio a esse processo, a HP aproveitou o momento para divulgar na imprensa uma nota venenosa. “A Dell tem um caminho duro pela frente. A companhia enfrenta um extenso período de incerteza e transição que não será bom para seus consumidores”. Dell aproveitou a divisão da HP e foi às câmeras ironizar a divisão da rival. “Diante das recentes notícias e incertezas, gostaríamos que os parceiros e clientes soubessem que nunca estivemos tão determinados”, afirmou, com um sorriso maroto. “Nossos negócios, de ponta a ponta, estão fortes e passando por um bom momento.”