Caso levasse em conta as recentes notícias envolvendo o mercado de mobiliário corporativo, o Brasil dificilmente despontaria como uma opção de investimento no curto prazo, para as multinacionais do setor. Afinal, a maior fabricante nacional, a paulistana Giroflex, pediu falência, vergada por um passivo de R$ 80 milhões, em julho. Na sequência, sua conterrânea Ornare, especializada em móveis residenciais de luxo, anunciou o adiamento dos planos de produzir móveis para escritório. Nada disso, porém, parece assustar a americana Herman Miller, que fatura US$ 1,8 bilhão em nível mundial.

Há duas semanas, o CEO da empresa, Andy Lock, desembarcou em São Paulo para anunciar os planos para a América Latina. Após 50 anos atuando no País através de exportações, seus produtos passarão a ser fabricados localmente. Além disso, a companhia vai abrir uma loja exclusiva na capital paulista — até agora, a comercialização tem sido feita por revendedores independentes. “Nossos produtos ficam muito caros se tiverem de ser totalmente importados”, afirma Lock. O primeiro passo na estratégia de tropicalização dos móveis foi dado no final de 2013, com a abertura de um Centro de Distribuição (CD), em Diadema, na região do ABC.

“Esse investimento vai fazer com que cresçamos 6% neste ano, na América Latina, em relação a 2013”, diz Lock. Atualmente, os produtos comercializados por aqui vêm da Índia e da China e são montados no CD. “Por operarem com custos menores, as peças provenientes de países asiáticos levam vantagem sobre as demais”, diz Marcelo Prado, diretor do Iemi, instituto especializado em análises do setor moveleiro. Percalços e dificuldades conjunturais parecem não intimidar o executivo, que possui uma longa trajetória na Herman Miller, onde ingressou em 1990. “Não foi fácil entrar na Índia também”, diz Lock.

A saída foi apostar em produtos sob medida, especialmente no que se refere à cartela de cores. “Na Índia, a preferência é por móveis amarelos, vermelhos e azul-claros”, diz Lock. “Eles não gostam de preto nem cinza.” Embora seja conhecida mundialmente pelo design arrojado de suas cadeiras, mesas e estações de trabalho, a empresa não possui uma equipe própria de designers. São todos freelancers, recrutados entre os melhores profissionais. A lista inclui nomes como George Nelsen, William Stumpf e Jeff Weber. “Fazemos isso para garantir a variedade dos produtos”, diz Lock.

Graças a essa postura, a empresa ganhou fama e prestígio em um setor que deve movimentar globalmente US$ 43 bilhões em 2014. Também serviu para que a grife emplacasse peças em exposições em espaços nobres como os museus MoMA, em Nova York, e o Smithsonian, em Washington. Foi assim também que conquistou clientes ilustres como o papa João Paulo II, o ator e diretor americano Woody Allen e o apresentador Jô Soares. O consultor Prado, do Iemi, acredita que a tradição joga a favor dos americanos. “A Herman Miller tem muita história para contar”, diz. Para se diferenciar de seus concorrentes, a companhia aposta no atendimento personalizado.

Funciona assim: a Herman Miller envia um representante para visitar o cliente e desenha um projeto personalizado. “Cada negócio e cada empresa tem a sua peculiaridade”, afirma Lock. A companhia ficou tão famosa entre os empresários que muitos deles procuraram a Herman Miller para decorar suas casas com os produtos dela. De olho nessa demanda, a marca inaugurou um showroom em Tóquio, no Japão, em 2011 — e entrou pela primeira vez no varejo. Em 2015, segundo a empresa, será a vez de São Paulo receber uma unidade de vendas no varejo. “É um grande passo sair do B2B (venda para corporações) e se tornar também um negócio B2C (vendas para o varejo)”, diz Lock.