13/11/2015 - 20:00
Economistas acostumados a fazer prognósticos sobre o desempenho da atividade brasileira têm enfrentado um enorme desafio nos últimos meses. A maior dificuldade é incorporar nas previsões os descaminhos da política. As cartadas do Congresso Nacional, as reações do Executivo e a queda de braço entre oposição e governo se tornaram soberanas às questões objetivas da economia e estão contribuindo para aprofundar a recessão. A temperatura da confusão em Brasília vem aumentando e já serviu até como justificativa para os rebaixamentos da nota de classificação de risco brasileira.
O clima de paralisia dos poderes abre caminho para que setores da sociedade transformem greves em atos políticos que pouco geram conquistas para os trabalhadores e ainda atrapalham a economia. Foi assim nas últimas semanas com paralisações de categorias que incorporaram nas pautas das manifestações assuntos políticos que vão muito além dos tradicionais temas como reajustes, benefícios, condições de trabalho e manutenção de empregos nas unidades. O caso mais emblemático é o dos caminhoneiros.
O movimento teve início na segunda-feira 9 e se estendeu com mais intensidade por dois dias, até perder força. O protesto foi convocado por um grupo independente e não contou com o apoio de outros sindicatos da categoria. A principal motivação da greve era explicitar o sentimento de indignação com a situação atual do País, e a resposta pretendida era a renúncia da presidente Dilma Rousseff. Como demonstração de apoio ao tema político, caminhoneiros exibiam faixas como “Desta vez é pelo Brasil” ou “Sinto vergonha deste governo”. No primeiro dia, as manifestações alcançaram 11 Estados, com 28 bloqueios pelas rodovias.
Quando o movimento foi lançado, os empresários temiam ver uma repetição da greve protagonizada pela categoria, em fevereiro, que durou pouco mais de dez dias e gerou desabastecimento em todo o País. “Todo mundo estava com uma preocupação tendo em vista, principalmente, os compromissos com as exportações, mas logo vimos que o movimento não ganhou força”, afirma Nelson Costa, superintendente-adjunto do sistema Ocepar (Organização das Cooperativas do Estado do Paraná), que representa 223 cooperativas, com um faturamento somado de cerca de R$ 60 bilhões.
A entidade identificou impactos na produção de leite e atraso nos embarques de frango e grãos para a exportação, no porto de Paranaguá. Mesmo quando as mobilizações estavam próximas do fim, ainda havia problemas. Os transportadores aproveitaram a demanda acumulada nos dias de paralisação para exigir um acréscimo de até 15% no preço do frete. “É inoportuna esse tipo de pauta nesse momento, principalmente quando as empresas estão buscando de todas as formas alternativas para vencer a crise”, afirma Costa.
Esse tipo de conta, como se sabe, acaba sendo repassada para os consumidores, com impactos inflacionários. O recuo do movimento se deu após a ameaça do governo federal de multar os caminhoneiros e autorizar o uso da força para desmontar os bloqueios. O Executivo também decidiu enviar uma Medida Provisória para elevar de R$ 1.915 para R$ 5.746 o valor da multa a quem for responsabilizado por obstruir indevidamente as rodovias. “Um fechamento de estradas com tentativas de desabastecimento do País é absolutamente inaceitável”, afirmou o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ao anunciar a medida.
Em Brasília, o líder do movimento Comando Nacional de Transportes, Ivar Luiz Shmidt, considerou o gesto autoritário e recebeu apoio de parlamentares da oposição. “Manifestação só vale quando é a favor do governo”, afirmou o deputado Cassio Cunha Lima (PSDB-PB), em plenário. Ninguém se preocupou, no entanto, com o impacto negativo que greves fora de hora geram na economia. Após a publicação da Medida Provisória, na quinta-feira 12, o balanço da Polícia Rodoviária Federal apontava apenas três pontos de interdição.
PETROLEIROS A questão política também esteve presente em outra grande manifestação de trabalhadores em curso no País. Mobilizados há duas semanas, os petroleiros exigem uma mudança de rota na gestão da Petrobras, com demandas para revogar cortes no plano de investimento da estatal e suspender a vendas de subsidiárias, medidas adotadas em resposta à crise na companhia. A estatal registrou um prejuízo de R$ 3,8 bilhões no terceiro trimestre, está altamente endividada e sofre as consequências da queda no preço do petróleo e da Operação Lava Jato.
Na quinta-feira 12, a companhia informou que a greve reduziu em 5% a produção de petróleo. Estimativa dos sindicatos calculam um impacto de R$ 400 milhões nos primeiros 15 dias da paralisação. Em nova proposta aos grevistas, a empresa ofereceu um reajuste salarial de 9,53% e se comprometeu a criar um grupo para avaliar a Pauta Brasil, elaborada pela Federação Única dos Petroleiros (FUP). O documento pede a continuidade das obras de refinarias, a defesa de regras de conteúdo local e da Petrobras como operadora única do pré-sal.
Para o professor de economia da USP, Helio Zylberstajn, especializado em mercado de trabalho, a pauta politizada é comum em períodos de recessão. “Quando a economia está indo bem, o sindicato fica menos politizado e mais pragmático, tentando tirar o melhor aumento da empresa”, afirma Zylberstajn. “Quando há recessão, o sindicato vai bater no governo, quer influenciar a política econômica, porque sabe que os problemas estão aí e não serão resolvidos na mesa de negociação.” Trata-se de mais uma variável obscura para o turvo cenário dos economistas.