A voz pausada e os gestos suaves do bilionário americano Marshall Cogan permitem expressar com muita clareza os objetivos que o farão transferir seu endereço fixo de um amplo apartamento na Park Avenue, em Nova York, para algum bairro em São Paulo, até janeiro de 2014. Depois de 22 viagens ao Brasil nos últimos 24 meses, Cogan, 76 anos, um dos homens mais ricos dos Estados Unidos, a despeito de suas maneiras elegantes, chega como um furacão, decidido a consolidar o mercado de concessionárias de veículos das marcas alemãs de luxo, como BMW, Mercedes e Audi, com sua empresa, a Auto Group Brasil. Pai de três filhos e avô de oito netos, provou ao longo de mais de 50 anos na estrada, sua capacidade de enxergar longe. 

 

118.jpg

Marshall Cogan, presidente da Auto Group Brasil: “Tenho 76 anos,

não me aposento, não jogo tênis nem golfe. O que me mantém

vivo é o mundo dos negócios”

 

Ainda em 1959, durante o mestrado na Universidade de Harvard, a sua tese de conclusão de curso previa que a China, um gigante adormecido na Ásia, pelo qual ninguém de bom senso pagaria um iuane, viria a dominar o mundo no século 21. A equação era clara, na sua visão. “Por quatro mil anos eles haviam dominado o comércio global”, diz Cogan. “Logo, retomar essa posição era uma questão de tempo.” No campo do varejo automotivo, porém, Cogan, que foi conselheiro econômico do senador Edward Kennedy por décadas, tem mais do que o mérito de prever o futuro. O empresário foi responsável por implementar a estratégia da consolidação de concessionárias de automóveis nos anos 1990 nos Estados Unidos, e entre 2006 e 2008 na China, com sucesso comprovado. 

 

Por meio da marca United Auto Group, Cogan investiu US$ 88 milhões em 1991 para entrar em participação acionária de revendedores, e reforçar a gestão, com o treinamento dos vendedores e mecânicos da rede de distribuição da Audi, BMW e Land Rover – além de marcas japonesas, como Honda –, em território americano. “As concessionárias, de modo geral, são administradas por grupos familiares e não oferecem serviços de valor agregado”, diz Cogan. Seguindo a velha máxima de que é preciso encantar o cliente, a rede UAG inovou nos Estados Unidos 20 anos atrás, ao mimar o consumidor, com serviços extras que o mercado não tinha, e com a oferta de serviços financeiros, como garantia estendida, ou modelos de financiamento vantajosos. 

 

O sucesso da empreitada pode ser medido pelo retorno financeiro na venda da UAG 11 anos depois da sua fundação, para Roger Penske, um dos grandes nome da Fórmula 1, no passado, e atualmente dono de uma equipe de Fórmula Indy: US$ 1,2 bilhão. A mesma estratégia foi replicada na China, em 2006, com a companhia North China German Automotive, onde Cogan, junto com o Citigroup, chegou a conquistar 22% do mercado da marca BMW. “É esse modelo de negócio que será aplicado no Brasil, que vive o momento ideal para iniciar uma oferta de serviços pouco tradicional por aqui”, afirma o inquieto executivo, workaholic confesso. “ Não me aposento, não jogo golfe nem tênis e o que me mantém vivo é estar conectado com o mundo dos negócios.” 

 

119.jpg

Encantar o cliente: ”Vou revolucionar o mercado das concessionárias no Brasil,

com a oferta de serviços pouco tradicionais por aqui”

 

Não por acaso, em seu currículo estão grandes negócios, como a compra de 30% da empresa londrina de leilões Sothebys, em 1982, por US$ 25 milhões, vendidos 18 meses depois para o Tapperman Group por US$ 175 milhões. “A venda foi o pior negócio da minha vida, pois, se tivesse mantido a participação, hoje ela valeria US$ 4 bilhões”, brinca Cogan. O empresário também adquiriu e revendeu com lucro a empresa Sheller Globe Corporation de autopeças, a empresa de revestimento de bancos de automóveis Foamex, que chegou a ter uma filial no Brasil, nos anos 1990, e a rede de restaurantes 21 de Nova York, famosa por receber celebridades do cinema. 

 

Para cumprir seus objetivos no Brasil, Cogan fez um trabalho de imersão e procurou conhecer a fundo os meandros do setor automobilístico, nos últimos dois anos, e as aspirações do País. “Com o programa Inova do governo, que aumentou as alíquotas de importados, as grandes marcas vão produzir localmente e precisarão de serviços diferenciados para ganhar a competição.” Após visitar redes que somam oito mil lojas em diferentes Estados, o empresário, que contratou para assessorá-lo na formatação da Auto Group o economista Fernando Hormain, da Camargue Capital Partners, concluiu que a falta de educação básica brasileira se reflete nos funcionários das lojas de veículos. 

 

“Há muitos com dificuldades de interpretação dos manuais técnicos dos carros”, diz. Com um plano de investir inicialmente R$ 800 milhões em aquisições, Cogan não vai economizar no treinamento dos funcionários, uma verdadeira obsessão para ele – “ duas vezes por dia, e não duas vezes por ano como é hoje nas concessionárias locais”. A seu ver, a capacitação é um benefício que permite alinhar os interesses do dono do negócio com a expectativa dos trabalhadores. “Treat a made like a queen, and the general like a king”, repete Cogan, o que em bom português pode ser traduzido como “trate a empregada como uma rainha, e o general, como um rei”. 

 

120.jpg

Cogan comprou 30% da casa de leilões Sotheby’s por US$ 25 milhões

e vendeu por US$ 175 milhões

 

Uma parte do plano do empresário, por outro lado, é apostar num forte time feminino em sua equipe. A razão para fortalecer a presença de mulheres no atendimento ao cliente é que sua opinião de que elas são mais espertas e dóceis para negociar foi muito bem-sucedida nos EUA e na China. O fundo de investimento baseado no Brasil deverá replicar a fórmula em outros países vizinhos, como Peru, Colômbia e Chile. Depois de acompanhar atentamente as manifestações de junho, que tomaram as ruas no País, Cogan diz ter entendido que os brasileiros despertaram um novo patamar de exigências, tanto na esfera pública como na privada. 

 

A lógica, portanto, é oferecer um padrão novo de atendimento no mercado para satisfazer essas expectativas: uma concessionária que liga para o cliente avisando que a garantia de suas peças está vencendo, ou que retira e entrega seu carro no local de trabalho. “Os lucros numa revenda de automóveis estão menos na venda de veículos e mais na troca de peças e serviços extras”, afirma Cogan. Essa receita, diz ele, ajudou a conseguir o apoio de fundos asiáticos e de investidores brasileiros para a empreitada – os nomes ainda não foram divulgados. “Vou revolucionar esse mercado no Brasil”, garante. A partir do ano que vem, ele poderá entregar o que promete.

 

121.jpg