No início da década de 1990, a americana Elena Ford, hoje com 45 anos, dividia seu tempo entre o curso de administração, na Universidade de Nova York, e o trabalho na agência de propaganda Rich Green Advertising. Naquela época, sempre que chegava ao seu apartamento, na margem leste do rio Hudson, ela dava de cara com um gigantesco luminoso da Ford posicionado em frente à janela da sala de sua residência. Parecia uma espécie de aviso do destino. Afinal, Elena descende da linhagem de Henry Ford (1863-1947), o inventor da linha de montagem, sistema que permitiu que o automóvel se tornasse um bem ao alcance da classe média americana, e fundador da montadora vice-líder dos Estados Unidos. Em 1995, Elena decidiu se unir às hostes da corporação criada pelo tetravô. Desde então, galgou diversas posições.

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Exemplo: mesmo quando posa para fotos na fábrica em São Bernardo (SP),
Elena não dispensa equipamentos de segurança, como os óculos

Atualmente, é diretora de marketing global, vendas e operações de serviço. Nesse posto, é responsável pela implementação da plataforma de marketing do programa One Ford, concebido como uma ferramenta para modernizar a empresa. Na semana passada, a executiva passou pelo Brasil, em mais uma escala em seu périplo por diversos países da Europa e da América Latina. Em todas as visitas, ela sempre é questionada por sua herança genética: como é ser mulher, carregar o nome Ford e atuar na companhia da família? A resposta, invariavelmente acompanhada de um sorriso acanhado, é curta e direta: “Quando você é um Ford e trabalha na empresa, sua responsabilidade é ainda maior em relação aos demais funcionários”, disse Elena, em entrevista exclusiva à DINHEIRO. 

A fala mansa, os gestos contidos e a estatura mediana – ela mede cerca de 1,60 m – escondem uma personalidade forte. Elena é do tipo assertivo, que deixa claro que sabe o que deseja. Também diz não se intimidar por atuar em um segmento dominado majoritariamente por homens. Isso fica evidente em suas opiniões, muitas vezes, verbalizadas de maneira contundente. “Não existe essa coisa de carro de mulher e carro de homem”, afirma a executiva. Além do utilitário esportivo Explorer, Elena é dona de dois Mustangs, o mais vistoso representante do que se convencionou chamar de carro de macho. “Nosso compromisso é produzir veículos que preencham as expectativas do consumidor.” 

 

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Henry Ford, fundador da montadora americana

 

Seguindo essa linha de raciocínio, ela diz que o principal desafio da montadora é unir todas as operações em escala global, trabalhando de forma conjunta. Desde a concepção dos projetos até o desenvolvimento do plano de marketing. Um bom exemplo dessa estratégia foi o lançamento das novas versões do Focus e do Fiesta. Este último é o carro mais vendido da empresa em nível global e um projeto no qual Elena teve participação destacada. O arcabouço do programa One Ford, combinado com a venda de ativos, como Land Rover, Jaguar e Volvo, e o reposicionamento das marcas Ford e Lincoln são apontados como os responsáveis pela guinada da corporação. 

 

A Ford foi a primeira montadora americana a voltar ao azul (confira quadro abaixo), após a crise econômica global desencadeada em setembro de 2008. No ano passado, ela obteve receita total de cerca de US$ 130 bilhões e lucro de US$ 6,5 bilhões, o melhor resultado dos últimos dez anos. “Foi graças ao bom posicionamento em mercados emergentes que a montadora conseguiu sair da crise”, diz Luiz Carlos Augusto, diretor da consultoria Jato Dynamics do Brasil. Como prêmio por sua contribuição na recuperação, a subsidiária local da Ford foi autorizada a transformar o  EcoSport em um carro global. 

 

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Fórmula de sucesso: O EcoSport foi o modelo que ajudou a elevar os ganhos da montadora no Brasil.

Agora, Bill Ford, presidente do conselho, decidiu transformá-lo em um veículo global

 

O modelo, vendido apenas na América do Sul, foi desenvolvido integralmente no Brasil. “Esse projeto mostra o peso do País na estrutura global da Ford”, afirma.  Em um cenário no qual a profissionalização da gestão de empresas familiares dá o tom, o fato de integrantes do clã Ford trabalharem no dia a dia da companhia é considerado salutar pelo mercado. Desde 1999, William (Bill) Clay Ford Jr., primo-irmão de Elena, atua como presidente do conselho de administração da Ford Motor Company. “A volta da família ao comando, ocorrida com a ascensão de Bill Ford, foi positiva no quesito imagem”, afirma Augusto. “O gesto deixou claro que eles seguiam acreditando no negócio.” 

 

Além de Bill Ford, também dão expediente na montadora Edsel Ford Filho e Henry Ford Neto. De acordo com Elena, o sobrenome não é um passaporte para a alta gerência. Bill, por exemplo, bateu ponto na empresa por 20 anos até assumir o posto atual. Elena, por sua vez, teve de provar que tinha talento e competência. Hoje, seu trabalho é reconhecido pelo mercado. Ela foi eleita duas vezes uma das 100 mulheres mais influentes do setor automotivo americano pela revista Automotive News. Em 2010, Elena ganhou o Prêmio Hope, concedido pelo Centro de Empresas Emergentes. 

 

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Bill Ford, presidente do conselho

 

Uma honraria destinada a líderes empresariais que atuam na área de inovação. Não faltam, porém, derrapadas em sua trajetória. Em abril deste ano, ela foi presa, em companhia de seu filho de 16 anos, pela polícia de Ferndale, no Estado de Detroit, quando acelerava seu Explorer. O bafômetro acusou 0.14 de teor alcoólico em seu organismo, quando o máximo permitido é de apenas 0.08.

 

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