O mercado automobilístico mudou em 1908. Foi nesse ano que o lendário empresário americano Henry Ford inventou o modelo de linha de produção e conseguiu construir em escala o clássico Ford T. Até então, o processo de montar um carro era trabalhoso, lento e caro. Um século depois, esse formato chegou a outro mercado: o de tecnologia. Batizado de venture builders, uma espécie de fundo de investimento que se diferencia de incubadoras e aceleradoras, o novo modelo funciona como uma verdadeira fábrica de startups.

As venture builders reúnem as áreas que podem ser consideradas essenciais para dar vida a uma startup de forma coletiva. Uma equipe faz pesquisa de marketing, outra pensa no desenvolvimento, um time cuida da estratégia e, o mais importante, um núcleo tem o papel executivo. Esse grupo de empreendedores, então, pesquisa o mercado e procura ideias de negócios que podem dar retorno. Essa parte cerebral, então, repassa as instruções para a área operacional, uma espécie de chão de fábrica, que coloca a mão na massa para “montar” a startup.

Quando a operação está pronta para rodar, a venture builder contrata profissionais para tocar o dia-a-dia da recém-criada empresa. Daí o nome o “builder”, que pode ser traduzido como “construtor”. Os times das companhias criadas trabalham em um espaço comunitário, que lembra a casa da série humorística Silicon Valley, da HBO. O movimento apareceu nos Estados Unidos. Uma das primeiras a ganhar notoriedade foi a Obvious Corp., dos empreendedores Biz Stone e Evan Williams, os criadores do Twitter. Foi dentro da Obvious Corp que o Twitter ganhou forma, mas passou a ocupar muito tempo de Stone e Williams.

Quando a plataforma do passarinho azul se tornou em um negócio estável, no entanto, a dupla relançou a Obvious Corp., agora, com aspectos de venture builder. Nesta nova fase, a “casa” de Biz Stone e Evan Williams já criou dez empresas, como a Flux, que faz análise de dados, e a Loup, uma espécie de Uber da área de limousines. O Brasil não ficou fora dessa onda. Conhecido por criar, aos 24 anos, o aplicativo Easy Taxi, o empreendedor Tallis Gomes se afastou do comando da empresa no ano passado. Depois de passar um tempo na Coreia do Sul, Gomes voltou ao Brasil decidido a criar o máximo de startups possível.

Após pesquisar no mercado, constatou que a melhor saída para concretizar seu plano seria criar uma venture builder. Ele, então, fundou, em São Paulo, a eGenius. Gomes fez investimento com capital próprio para reunir o time de profissionais que o ajudará a formar um portfólio de companhias. “Trouxe pessoas que tem currículo forte, algumas ganhando na casa do milhão de reais por ano”, afirma Gomes. “Mas o retorno é garantido, pois esses profissionais estarão envolvidos em diversas empresas.” A meta de Gomes é ter, nos próximos três anos, quinze startups dentro da eGenius e um faturamento conjunto e R$ 1,5 bilhão.

Na mesma linha, o paulistano Alex Barbirato criou a Incube. Apesar de já ter adquirido uma empresa já em operação, a 99Motos, o DNA do fundo é de uma venture builder. “Nos reunimos e pensamos soluções e startups que podemos criar rapidamente.” Uma das soluções desenvolvida pela empresa foi o serviço Vá de Taxi, tocado em parceria com uma seguradora de automóveis. O mais recente deles é o Experiences, um aplicativo desenhado em duas semanas pelo time da Incube, que permite que usuários façam reservas e tenham um atendimento personalizado em restaurantes de alto padrão.

Barbirato testou pessoalmente o serviço. “O manobrista me chamou pelo nome, sem nunca ter me visto”, diz Barbirato. “Tudo isto foi desenvolvido e colocado em prática em tempo recorde.” No final das contas, o destino ideal para as startups criadas nas ventures builders é o mesmo do que o dos fundos e aceleradoras comuns: a venda para empresas maiores. Gomes e Barbirato, no entanto, afirmam que não têm pressa para se livrar de suas criações. “Não tenho urgência para passar as empresas para frente”, diz Gomes. “O que quero é ter o máximo possível de startups criadas no meu currículo.”