20/02/2015 - 20:00
Em plena terça-feira gorda de Carnaval, enquanto a folia rolava solta nos quatro cantos do Brasil, o discreto ministro da Fazenda, Joaquim Levy, estava em Washington, de terno e gravata, vendendo a imagem do País para investidores estrangeiros. Na plateia, representantes do Fundo Monetário Internacional (FMI), do governo americano e de empresas multinacionais, como General Motors, Toyota e Coca-Cola, não desgrudavam os olhos do economista carioca, que repetiu a dose no dia seguinte, em Nova York. Ao contrário do que poderia fazer um caixeiro-viajante mal-intencionado, Levy não dourou o seu principal produto: a economia brasileira.
Apontou os erros do passado recente – “um deslize fiscal” em 2014, que está sendo corrigido – e reconheceu que o PIB pode ter encolhido no ano passado. Não é o tipo de discurso que faria algum investidor sambar de alegria, mas o “choque de realidade” faz parte da estratégia da nova equipe econômica para resgatar a credibilidade perdida. O primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff ficou marcado por previsões econômicas otimistas que nunca se concretizaram. A cada início de ano, o Ministério da Fazenda e o Banco Central projetavam crescimento do PIB exuberante e inflação próxima ao centro da meta, feitos nunca concretizados.
Agora, a “utopia” foi retirada do dicionário econômico. “Levy é transparente e realista na mensagem que transmite aos agentes econômicos”, diz Manuel Enriquez Garcia, presidente da Ordem dos Economistas do Brasil (OEB). “É o perfil de quem estudou na Escola de Chicago.” O perfil “realista” do novo ministro da Fazenda vem agradando ao mercado financeiro. Embora não signifique boas notícias no curto prazo, tem o dom de favorecer o planejamento dos empresários no presente, desanuviando o futuro. Já num segundo evento, em Nova York, organizado pelo Conselho das Américas e pela Américas Society, Levy apresentou 22 slides com números sobre a economia brasileira.
Logo de saída, exibiu imagens de fábricas construídas recentemente por multinacionais no País, como prova da confiança que os empresários depositam no Brasil. Destacou, ainda, que o investimento estrangeiro direto (cerca de US$ 60 bilhões por ano) dobrou nos anos 2010 em relação à década anterior. A ênfase, no entanto, foi dada ao ajuste fiscal em curso. O ministro garantiu que a meta de superávit primário de 1,2% do PIB será cumprida “sem fazer cortes draconianos”, segundo suas palavras. “Se voltarmos aos níveis de gastos de 2013, podemos entrar no caminho para atingir a meta sem problemas”, afirmou.
A crise na Petrobras também foi alvo da atenção dos investidores, tanto em Washington quanto em Nova York. Levy destacou que a estatal está “numa boa direção” e que a produção vem crescendo, apesar do “impasse contábil”. “Acho que, em última instância, isso que é o importante, produzir mais para poder lucrar mais”, afirmou o ministro, na capital americana. Ainda na Quarta-Feira de Cinzas, antes de retornar ao Brasil, Levy teve encontros reservados com representantes da agência de classificação de risco Moody’s.
Embora não admita publicamente, a nova equipe econômica tem como prioridade evitar que as grandes agências tirem o selo de grau de investimento do País. Em janeiro, poucas semanas após assumir o cargo, o ministro da Fazenda compareceu ao Fórum Econômico de Davos, na Suíça, para tranquilizar os investidores. Desde então, no entanto, a percepção de risco do Brasil no exterior piorou por conta do agravamento dos escândalos de corrupção na Petrobras e da ameaça de racionamento de água e energia elétrica. Na apresentação feita em Nova York, Levy acrescentou um slide de 2005, ao tempo em que era secretário do Tesouro Nacional, no governo Lula.
O quadro mostra que o Brasil estava disposto a aproveitar o boom dos preços de commodities para, entre outras coisas, “confirmar a responsabilidade fiscal”, “avançar a agenda microeconômica” e “transformar a composição da dívida pública”. Como se sabe, pouco do previsto aconteceu nos últimos nove anos. Na avaliação do economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, há um risco de que a atual equipe econômica tente tirar esse atraso, fazendo tudo de uma vez e, em consequência, acabe exagerando na dose do ajuste. “Não adianta ter juros no lugar certo e a economia no lugar errado”, afirma Perfeito. “Daí os empresários não investem.” Se estiver em dúvida, o ministro Levy pode perguntar ao seu espelho…