O número 44 da rua Treze de Maio, no centro do Rio de Janeiro, era o endereço eleito por dezenas de pequenos e médios empresários que tinham ali a possibilidade de encontrar uma boa relação custo-benefício. Além de estar localizado numa região histórica da capital fluminense, o Edifício Liberdade, de 20 andares, ainda oferecia salas comerciais a preços acessíveis para o padrão carioca. Escritórios de advocacia, engenharia, imobiliárias e empresas de tecnologia, entre outros, viram ali um achado, diante do custo exorbitante do metro quadrado comercial no Rio de Janeiro. A valorização imobiliária é o preço pago pela Cidade Maravilhosa por ter se tornado o centro das atenções do mundo, com o trinômio pré-sal, Copa e Olimpíada. 

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Na quarta-feira 25, porém, toda essa percepção da cidade foi abalada. O Edifício Liberdade foi ao chão, por volta das 20h30, levando junto dois outros prédios vizinhos, um de dez andares e outro de quatro, deixando uma imagem estarrecedora de destruição, que muitos compararam ao pesadelo vivido pelos Estados Unidos, durante o ataque às Torres Gêmeas, no dia 11 de setembro de 2001. As causas do desabamento dos três edifícios no Rio, vizinhos ao Teatro Municipal da cidade – onde o presidente dos Estados Unidos Barack Obama discursou para duas mil convidados em março do ano passado –, ainda não estão totalmente esclarecidas. Segundo o prefeito, Eduardo Paes, que chegou ao local na primeira hora do acidente, houve um problema estrutural no prédio de número 44. 

 

No caso, a estrutura pode ter sido afetada por obras não autorizadas no nono andar do edifício, feitas pela empresa TO Tecnologia Organizacional. “Só podemos falar depois que a perícia confirmar as causas”, disse o prefeito. A DINHEIRO entrou em contato com representantes da empresa TO, mas não obteve retorno. As razões que levaram ao desabamento podem ser conhecidas apenas dentro de alguns dias ou até semanas. Mas, 24 horas depois da tragédia, já era possível contabilizar prejuízos irreparáveis. Na quinta-feira 26, já eram confirmadas pelo menos cinco vítimas fatais e a expectativa era de que esse número pudesse chegar a 26: havia 21 pessoas desaparecidas e com poucas chances de serem encontradas com vida. 

 

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Cenas da tragédia: bombeiros e funcionários da Defesa Civil retiram escombros em busca

de sobreviventes. Obra irregular pode ter provocado o desastre.

 

A Defesa Civil e o Corpo de Bombeiros, já haviam retirado grande parte dos destroços dos edifícios ao longo do dia e não havia pistas de sobreviventes. As perdas financeiras também foram grandes, e podem chegar a algumas dezenas de milhões de reais. Somente os edifícios que caíram custariam cerca de R$ 60 milhões, levando em conta o valor do metro quadrado da região. Além do custo imobiliário, havia o valor dos investimentos dos empresários locais. Marcelo Ferreira, dono da Centro de Lentes Amplitude da Visão, que ocupava o 12º andar do Edifício Liberdade há dez anos, estima um prejuízo de R$ 200 mil a R$ 300 mil, com as perdas principalmente dos equipamentos para a confecção de lentes de óculos. 

 

Ferreira alugava duas salas comerciais de cerca de 40 metros quadrados por R$ 1,5 mil mensais. “Uma década foi embora em questão de minutos”, disse o empresário à DINHEIRO, que na quarta-feira saiu por volta das 19h30 do edifício, logo após os quatro funcionários da empresa. “Agora é hora de recomeçar.” Enquanto os sobreviventes calculavam seus prejuízos e as famílias de desaparecidos procuravam mais informações sobre os resgates, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, comportou-se como o ex-prefeito de Nova York Rudolph Giuliani, célebre durante o 11 de Setembro. Esteve ao lado dos bombeiros desde os primeiros instantes após a tragédia. Paes teve ainda de administrar a sombra de desconfiança lançada sobre o Rio, diante dos desafios da capital de acolher eventos internacionais. 

 

Alguns veículos internacionais chegaram a associar o desmoronamento às dificuldades do País de erguer a infraestrutura necessária para os eventos esportivos. O blog Beyond Brics, do britânico Finantial Times,questionou a qualidade das construções brasileiras, citando inclusive os 62 anos do Estádio do Maracanã. “Não importa o quanto o Brasil tenha avançado, o País ainda precisa lidar com o pesado legado de seu passado”, escreveu o jornalista Jonathan Weathley. Em nota, a prefeitura rebateu as associações. “O desabamento foi um fato isolado, ocorrido em propriedades privadas e não tem relação com os preparativos para a Copa, os Jogos de 2016 ou outros eventos que fazem parte do calendário da cidade.” 

 

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A cicatriz no centro histórico

 

Os prédios que desabaram ficavam na parte posterior do Teatro Municipal. O Museu Nacional de Belas-Artes e a Câmara Municipal ficam a poucos metros do local. “É um desastre numa área muito sensível”, afirma Denise Machado, diretora da Faculdade de Arquitetura da UFRJ. Ela destaca que é uma região bem conservada do Centro, com grande movimento de gente e com uma economia dinâmica. “Era um local tipicamente de trabalho.”

 

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