15/09/2010 - 21:00
Você vai morrer. É sua única certeza. Você está preparado? Além das questões afetivas e emocionais que precisam ser encaradas, é preciso resolver a situação patrimonial e financeira dos que ficam. Não se trata apenas de cuidar em vida das despesas com seu sepultamento e jazigo, mas também de deixar respostas para perguntas cruciais da família. Quem paga a escola das crianças? E as contas da casa? Pense bem. A hora de lidar com esses problemas pode ser agora.
Normalmente, a morte de um parente dá muito trabalho aos familiares, envolve burocracia e perda de tempo em um momento em que as pessoas estão emocionalmente abaladas e menos aptas a tomar decisões racionais. Se o falecido for o provedor, pior ainda. Entra em cena o chamado “custo desespero”, quando é necessário resolver uma situação inesperada em um curto período, em geral pagando mais do que seria razoável. O pesadelo nem sempre acaba após o enterro. Um inventário simples pode durar anos e brigas de herdeiros são comuns.
Por isso, é necessário organizar toda a papelada e acertar a divisão dos bens em vida, para não antecipar uma ida aos infernos para quem fica. O que fazer? A primeira providência é estar pronto para aquela data fatídica, antecipando as despesas funerárias.
Na cidade de São Paulo, as tarifas de sepultamento variam de módicos R$ 200 até suntuosos R$ 12 mil. Esse valor não inclui o preço dos jazigos, que oscila entre R$ 4 mil e R$ 20 mil, mas pode chegar a R$ 80 mil em cemitérios tradicionais, como o São João Batista, no Rio de Janeiro.
Para cobrir essas despesas, várias seguradoras oferecem apólices de seguro-funeral. “Um funeral completo pode desequilibrar as contas de uma família”, diz Pedro Bulcão, diretor da seguradora carioca Sinaf, especializada no ramo.
Há quem ofereça coberturas mais amplas que as de caixões e flores. Clientes de baixa renda da Caixa contam com apólices que garantem, por exemplo, o fornecimento de uma cesta básica durante seis meses. Pagando de R$ 6 a R$ 100 por mês, cada vez mais clientes adquirem o produto, diz Rosana Techima, diretora da Caixa Seguros.
Há uma mudança cultural importante, que segue a ascensão da nova classe média. “A mentalidade do brasileiro está mudando e agora há mais pessoas dispostas a fazer seguro para proteger o patrimônio e a estabilidade familiar conquistados com o trabalho”, diz a executiva. Se você for uma dessas pessoas, não faça segredo. Deixe alguém de sua confiança informado do que fez, onde estão os papéis e para quem telefonar.
Lembre-se de que a família precisa ter uma reserva financeira de emergência para o dia a dia. Um falecimento interrompe o pagamento de salários ou de benefícios de aposentadoria, o que pode comprometer imediatamente as contas da casa.
Para fazer frente às necessidades mais urgentes, a previdência privada é o produto mais adequado. Os planos oferecidos pela maioria das grandes instituições podem garantir uma boa renda mensal aos herdeiros e têm uma grande vantagem: esse dinheiro é imediatamente disponível, pois não entra no inventário.
Melhor: sobre ele não incidem os impostos de doação e causa mortis (que variam de 2% a 8% do patrimônio, conforme o Estado do Brasil). Com R$ 250 por mês, um pai com cerca de 40 anos pode garantir a mensalidade escolar ou a faculdade do filho, que custa em torno de R$ 1 mil, em média, em instituições privadas. O seguro de vida também beneficia as famílias rapidamente. Em geral, o pagamento único é feito cerca de um mês após a entrada dos papéis.
Tomadas essas providências, é preciso pensar na transmissão de bens em vida ou num testamento registrado em cartório. Não se trata apenas de distribuir riquezas aos herdeiros, mas também de garantir a herança emocional. Pais que não cuidam da divisão patrimonial podem deixar conflitos familiares como herança, prejudicando até mesmo sua própria imagem perante os filhos.
Ao contrário do que se vê nos filmes sobre heranças e testamentos, a legislação brasileira é muito rígida e não segue, necessariamente, o desejo do morto. A herança é dividida em duas metades. Uma delas, chamada de legítima, vai obrigatoriamente para os herdeiros legais. Pela ordem: descendentes, pai e mãe, cônjuge (se o casamento não for no regime de separação de bens) e parentes mais distantes.
A segunda metade, chamada de disponível, pode ser doada livremente, inclusive para outras pessoas. “É possível reconhecer um filho fora do casamento”, diz o advogado Roberto Justo, sócio do escritório Choaib, Paiva e Justo Advogados Associados. Um testamento tem de ser visto como algo dinâmico. Precisa ser revisado periodicamente, já que as famílias mudam ao longo dos anos.
Uma das novidades nessa área é o arrolamento, um trâmite legal que permite transmitir os bens e escapar da morosidade do inventário convencional. Isso só é possível se algumas condições forem cumpridas.
“Não se pode fazer arrolamento se houver herdeiros menores, se houver um testamento ou se os herdeiros não concordarem formalmente com a divisão dos bens”, diz Justo. A alternativa compensa. Um inventário é um processo judicial. Já um arrolamento pode ser resolvido no cartório em cerca de 15 dias.
Se o falecido for um empresário, a situação é mais complicada. É preciso deixar tudo preparado para perenizar os negócios. “Não planejar a sucessão é uma das principais causas de falência das empresas familiares”, diz Claudinei Santos, diretor da Escola Superior de Propaganda e Marketing.
O ideal é criar um acordo de acionistas, definindo quem vai chefiar a empresa. Outra alternativa é montar uma holding que controle os bens particulares e a empresa. As cotas são doadas aos herdeiros e o empresário desfruta dos bens enquanto viver. O custo de assessoria jurídica para isso é de 1% do patrimônio, em média – um preço pequeno para livrar os herdeiros do purgatório burocrático.