26/08/2016 - 20:00
O empreendedor André Ferraz tem 25 anos e lidera uma companhia que já fatura R$ 10 milhões: a In Loco Media, que desenvolveu um sistema de geolocalização sem o uso do GPS.
Seu sistema rastreia todos os caminhos feitos por 60 milhões de donos de smartphones no Brasil a partir da combinação de informações sobre redes Wi-Fi, antenas de celular e distorções de frequências magnéticas dos aparelhos.
A empresa, hoje localizada no Porto Digital, em Recife, iniciou neste ano sua internacionalização para os Estados Unidos, Israel, França e Alemanha, além de contar com representantes na Argentina e no México. Para 2017, a empresa planeja marcar presença na Índia, Inglaterra e Cingapura.
Leia os principais trechos da entrevista de Ferraz:
Se não utiliza GPS, como é possível ter um mapa por onde passam os usuários desses celulares rastreados?
Conseguimos fazer um mapeamento de forma eficiente, sem contratar uma equipe para fazer mapeamento. Nós nos baseamos no exemplo do Waze, que mapeou todas as ruas do mundo com informações geradas a partir do fluxo dos usuários do aplicativo. Se um usuário fez uma rota que não estava no mapa, o Waze criou uma ali uma rua. Fizemos uma abordagem parecida para mapear o interior dos estabelecimentos. Criamos uma tecnologia que analisa o fluxo das pessoas andando em ambientes fechados. Por exemplo, se o escritório aqui não é mapeado e você está usando um de nossos aplicativos parceiros, o primeiro a entrar no escritório começa a gerar dados.
Como isso é possível?
Hoje, eu identifico que a pessoa chegou perto do escritório e começou gravar sinal de Wi-FI, de torre de celular e de Bluetooth. Todo celular tem um hardware que é uma bússola, sempre apontada para o norte magnético. Mas ela sofre distorção quando se aproxima de metais e aparelhos. Isso gera uma impressão digital do lugar. Isso, isoladamente, não significa nada. O que importa é o conjunto das distorções magnéticas. Quando você chega na redação, você passa por uma porta, anda até a sua mesa, e para. Todo o trajeto vai ter um conjunto de distorções do campo magnético. Se você for para outra mesa, o conjunto de distorções mudará.
Como foi possível fazer isso?
Desenvolvemos tudo do zero. A tecnologia começou sendo desenvolvida a partir de “papers” acadêmicos. Quando identificamos que não tinha tecnologia para localização indoor, começamos a ler tudo e ganhamos maturidade no assunto. Criamos nossos próprios conceitos. A tecnologia é única e temos estratégias diferentes de propriedade intelectual, que não existe nada próximo na academia, nem no mercado, não há patentes. E não vamos patentear isso para não abrir o segredo. É um segredo industrial porque começamos muito antes.
Mas ao registrar a patente, você garante a propriedade sobre a tecnologia, protegendo-a contra cópias e recebendo royalties de quem quiser utilizá-la…
Temos feitos patentes em relação aos modelos, técnicas e produtos que desenvolvemos, mas não em relação à tecnologia especificamente. Porque a tecnologia é única. Mas se você abre a tecnologia e muda uma vírgula, você já consegue replicar sem necessariamente quebrar a patente. Geralmente num caso como o nosso, isso é comum: fazer a patente das coisas que estão ao redor da tecnologia, mas não da tecnologia porque você abre o segredo.
Quais as aplicações?
Existem aplicações de maior escala. Por exemplo, ao saber se a pessoa que foi na concessionária está buscando um SUV. Isso é informação que muita gente quer saber para impactar o consumidor. Ou as pessoas que preferem vinho a cerveja. Você pega tudo o que a pessoa está fazendo, independentemente do input do usuário, que está tocando a vida dele. E a tecnologia vai aprendendo até saber que o usuário está precisando de tal produto ou serviço. Começa a fazer com que o computador seja proativo, e começamos a falar de computação ubíqua, enquanto tocamos a nossa vida.
Hoje, a aplicação maior é na publicidade. Temos sido demandados por duas coisas. Todo publicitário sempre sonhou em atingir a pessoa certa no momento certo, mas nunca se conseguiu fazer isso com escala. Você atinge a pessoa certa pelo Facebook; o momento certo pela busca do Google, porque a pessoa está interessada. Mas no lugar e o momento certo é este (seu sistema). Como sabemos o local e momento certo fica mais fácil. A pessoa acabou de entrar no supermercado: é hora de vender aquela cerveja, aquele vinho. Para ter uma ideia, a taxa de cliques média nos anúncios da In Loco são dez vezes a média do Google e do Facebook. E tem uma segunda demanda, que é das agencias. Na publicidade digital se consegue mensurar se o consumidor clicou (na campanha). Mas existe uma limitação: 90% das vendas são feitas no mundo físico ainda. Como mensura o varejo físico? Com localização. O cliente viu o anúncio, passou pela loja?
Como fica a privacidade do cliente?
Hoje, tratamos a privacidade de forma muito séria. Temos suporte de alguns dos autores do Marco Civil da Internet para nos ajudar nesse tema. O primeiro ponto é manter o anonimato. Não precisa saber quem está do outro lado, quem é dono do celular. Mas sim saber que ele tem esses ou aqueles interesses. O segundo ponto: para eu ter acesso, ele tem que instalar um dos 500 aplicativos. O consumidor tem de autorizar para que o aplicativo tenha acesso à localização dele. E cada aplicativo tem contrato informando que terá acesso a dados de geolocalização, mas poucos leem isso. Só pegamos de quem autoriza. E permitimos que o usuário, após ter autorizado, desautorize. Isso é superaberto na nossa política de privacidade, com normas do Brasil, Estados Unidos e Europa. Mas acho que o ponto principal é não vincular esse dado a uma pessoa. Esse é o ponto mais fundamental. Como existe autorização do usuário, estamos cobertos. As pessoas que bloqueiam o app, que não quer mais ser rastreada, é menor que 0,1%