Ao sair do governo em 1º de janeiro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deixará na lousa do Palácio do Planalto uma difícil equação para Dilma Rousseff resolver: estimular o brasileiro a poupar mais, sem perder a fome de consumo que tem puxado o crescimento econômico nos últimos anos – e que fará o PIB se expandir quase 8% em 2010. O que parece contraditório, poupar mais e continuar gastando, tornou-se uma questão prioritária nos bastidores econômicos. O País tem hoje a menor taxa de investimento entre as economias emergentes. 

 

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Enquanto o Brasil tem uma taxa de poupança de 17,5% do PIB, esse índice é de 27% na Argentina e no México, segundo dados do Banco Mundial. Na China, esse percentual supera 40%.

 

Enquanto poupa cada vez menos, o brasileiro tem gastado como nunca. De acordo com o IBGE, o consumo das famílias deverá ultrapassar 62% do PIB em 2010, o maior da história. 

 

Até o terceiro trimestre, a relação consumo/PIB estava em 61,2%,  atrás apenas dos 61,8% registrados em 2009 e 2002. “Não podemos perder o senso de responsabilidade nas nossas compras”, disse o presidente Lula, dias atrás, em reunião com empresários em São Paulo. “Caso contrário, vamos passar 2011 apenas pagando o que a gente gastou em 2010”, completou.

 

A preocupação de Lula chegou a Brasília como um mandamento – e também serve como um sutil recado para os ministros que assumirão seus cargos com a ordem de cortar custos, inclusive o ministro Guido Mantega, da Fazenda, que precisa agora evitar a formação de bolhas de consumo e ativos. 

 

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O paradoxo de Guido Mantega: o ministro da Fazenda passou os últimos quatro anos elaborando pacotes

de estímulo ao consumo, e passará os próximos quatro estudando meios para evitar bolhas

 

“O governo precisa fazer duas coisas: sua lição de casa cortando gastos correntes e ampliar os investimentos em infraestrutura”, afirma Felipe Salto, economista da consultoria Tendências. “O exemplo deve partir do governo. Não adianta ficar apenas fazendo discurso. 

 

Nos últimos anos, os gastos públicos cresceram de forma desproporcional e geraram a mesma preocupação que hoje o governo tem em relação ao orçamento dos trabalhadores”, completa Antonio Romero, professor de economia da PUC.

 

Entre as medidas a serem anunciadas pelo time de Dilma deve estar uma restrição ainda maior ao crédito fácil. Como os riscos de inadimplência estão mais concentrados nos financiamentos de longo prazo e sem entrada, essa modalidade de financiamento deixará de ser atrativa ao consumidor. 

 

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Nos contratos de até 24 meses para financiamento de veículos, o calote atinge 1,5%. Nos contratos superiores a 60 meses, o percentual chega a 8% logo no primeiro ano. “Sem motivação para entrar em financiamentos muito longos, os trabalhadores voltarão a guardar dinheiro para dar uma entrada maior ou até para comprar à vista”, diz o economista Rubens Fontes, especializado em finanças pessoais da Alfa Consultoria. 

 

Por outro lado, desta vez, para motivar o brasileiro a investir, um pacote de desonerações a investimentos tem sido aguardado pelo mercado.Entre as principais medidas estão o fim do Imposto de Renda para aplicações na poupança acima de R$ 50 mil e o estímulo à redução das taxas de administração sobre aplicações de longo prazo, especialmente voltadas à previdência complementar. 

 

Neste início de ano, espera-se uma alta dos juros básicos pelo Banco Central para conter a alta da inflação. Com isso, além de esfriar o consumo, o BC deixará mais atraente a rentabilidade das aplicações.  

 

“É preciso educar o consumidor para ele deixar de consumir um pouco agora, poupar e garantir mais emprego e renda no longo prazo”, diz Felipe Salto. Fácil de falar, difícil de fazer.

 

Colaborou Denise Bacoccina