13/07/2011 - 21:00
Um período de linha-dura dos reguladores e de vacas magras para os acionistas. Essa é a perspectiva para a maioria dos grandes bancos europeus a partir deste mês, quando for aprovada a nova mudança na regulação internacional das instituições financeiras. “As mudanças vão exigir que os bancos tenham muito mais capital próprio, e isso vai afetar a rentabilidade”, diz Francisco Luzón, vice-presidente do banco Santander e responsável pelas operações no continente americano.
O banco estima que a exigência mínima de capital, hoje de 4% dos ativos, deve dobrar para 8% ou até mais. Em um seminário sobre a economia da América Latina realizado pelo Santander na Espanha, especialistas discutiram o cenário em que os bancos vão trabalhar nos próximos anos. Os prognósticos são ruins para quase todos os países. A única saída para os bancos europeus e americanos parece estar mesmo ao sul do Rio Grande. No caso do Santander, por exemplo, só no Brasil, deverão ser abertas 600 novas agências nos próximos cinco anos.
“O Brasil terá 20 milhões de novos clientes nos próximos cinco anos”
Francisco Luzón, vice-presidente para as Américas
As razões para o pessimismo em relação ao mercado desenvolvido decorrem da ressaca da crise de 2008. O pior já passou, é certo, mas a fase de ajustes ainda está longe de terminar. O modelo de regulação do setor financeiro que entra em vigor este mês será muito mais rígido, para impedir que se repitam os excessos que geraram a turbulência. Os 20 maiores bancos globais devem ser classificados como “sistemicamente importantes” para a solidez global. Isso exigirá que eles levantem mais capital e também que fiquem sujeitos a regras mais duras do que a média.
Tudo isso indica que os resultados serão magros nos próximos meses. Os números dos bancos até melhoraram, mas isso não quer dizer que eles estão fazendo mais negócios. Ao contrário, os balanços só estão no azul porque as instituições financeiras vão, aos poucos, limpando seus livros dos créditos ruins. Ao cancelar um empréstimo dado como perdido, os bancos consideram como lucro o dinheiro que havia reservado para cobrir essa perda. “Essa tem sido a principal causa dos lucros nos últimos trimestres, mas esse processo está próximo do fim”, diz José Antonio Álvarez, CFO do grupo Santander. “Agora, o maior desafio é como ganhar dinheiro novo, pois as receitas com comissões têm sido baixas, os juros globais permanecem em patamares reduzidos e o crédito nos Estados Unidos, onde temos uma participação importante, vem caindo.”
Sede no Brasil: entusiasmo com crescimento da classe média no País
A alternativa parece estar mesmo no mercado latino-americano, com maior potencial de crescimento. “Os países da América Latina terão 40 milhões de novos clientes nos próximos cinco anos, e todos os bancos querem disputar esse filão de mercado”, diz Luzón. “O Brasil representa metade desse potencial.” Para ele, as características da economia brasileira fazem do País um mercado ideal para o banco. O PIB cresce a um bom ritmo e não há uma sobreoferta de crédito. “O mais importante é que no Brasil há um sólido e vigoroso crescimento da classe média, o que sustenta uma expansão sustentável do sistema financeiro”, diz ele. “As instituições passam a ser mais maduras quando a classe média fica mais forte.”
Além disso, o aumento da renda permite que mais clientes passem a consumir produtos bancários diferenciados, como empréstimos e seguros. Nesse sentido, a América Latina em geral é, ainda, um campo aberto. Apenas 30% da população economicamente ativa tem conta em banco, ante quase 80% na Espanha, por exemplo. Luzón não diz quantos clientes quer conquistar no Brasil, mas diz que a meta é manter o País como responsável pelos atuais 25% dos resultados do Santander. A estratégia para manter essa proporção passa pelo crescimento orgânico. “Vamos abrir 600 novas agências, a um ritmo de 100 a 120 novos postos de atendimento por ano”, diz Marcial Portela, presidente do banco no Brasil.
“Vamos abrir 600 novas agências, a um ritmo de até 120 por ano”
Marcial Portela, presidente do Santander Brasil
Além disso, o banco vai concentrar-se em novos produtos, especialmente os empréstimos imobiliários. Portela diz que o acelerado crescimento da demanda por imóveis vem consumindo rapidamente o estoque de capital disponível. “Se o governo não criar rapidamente novos títulos que permitam aos bancos oferecer capital de longo prazo e a preços estáveis, faltarão recursos em dois anos”, diz. Luzón acrescenta que o crédito imobiliário é uma das principais apostas na estratégia do banco. “Hoje, esse mercado é dominado pela Caixa Econômica Federal e podemos crescer nesse setor”, diz. “Ainda há uma enorme demanda por crédito no Brasil.”
Vai dar certo? Segundo os especialistas que participaram do seminário sobre a América Latina, o cenário não é tão tranquilo quanto parece. “Os países da região, o Brasil em especial, são muito vulneráveis às oscilações do mercado financeiro internacional”, diz a economista peruana Liliana Rojas-Suarez, conselheira-sênior do instituto de pesquisa americano Center for Global Development.
Liliana ressalta que esses países concentram uma combinação de fatores de risco. O movimento de capitais é amplo e rápido, a participação do comércio exterior na economia é pequena e não há poupança interna. Portanto, há grande dependência do fluxo internacional de capitais. “Se os juros subirem rapidamente nos Estados Unidos ou na Europa, haverá uma maciça saída de capital, e o impacto sobre a economia será muito pesado”, diz ela.
O Banco Central brasileiro está tentando conter a enxurrada de dólares, mas o governo ainda está pecando na área fiscal. A economista lembra que boa parte das crises bancárias foi provocada pelo crescimento descontrolado do crédito, e esse fenômeno tem sido observado em todos os países latino-americanos. “Já estamos notando o surgimento de bolhas de crédito, inclusive no Brasil, e o impacto desses desajustes é pesado e imprevisível”, diz ela.
Enviado especial a Santander