09/09/2016 - 20:00
Apesar da grave crise econômica dos últimos três anos, o Brasil jamais deixou de ser cobiçado pelos investidores internacionais. Os números do Banco Central atestam isso, com investimento estrangeiro direto superior a US$ 60 bilhões por ano. Houve, é verdade, momentos em que a insegurança jurídica levou ao adiamento de projetos, e períodos em que a bagunça política espantou negociadores habituados a ambientes mais calmos. Acostumado a lidar com esse público, o presidente da consultoria Going Global, Gilberto Lima Jr., que trabalhou na Apex-Brasil entre 2008 e 2011, classifica os estrangeiros em dois grupos: os das multinacionais instaladas há décadas no País e os que estão desbravando o nosso mercado pela primeira vez.
“Os que conhecem o Brasil de longa data ignoraram os ruídos causados pelo processo de impeachment”, diz Lima Jr.. “Já os novatos se assustaram um pouco.” Com o objetivo de lustrar a imagem do Brasil e garantir que a estabilidade jurídica está de volta ao jogo, o presidente Michel Temer; o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles; o ministro das Relações Exteriores, José Serra; o ministro da Agricultura, Blairo Maggi; e o presidente do Congresso Nacional, Renan Calheiros, estiveram na China, entre 2 e 5 de setembro, na cúpula do G20, o grupo das vinte maiores economia do mundo.
O corpo a corpo com potenciais investidores foi intenso e não se resumiu a encontros empresariais. Temer teve reuniões bilaterais com o presidente da China, Xi Jinping; o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe; o primeiro-ministro da Espanha, Mariano Rajoy; o primeiro-ministro da Itália, Matteo Renzi; e o vice-primeiro-ministro da Arábia Saudita, Principe Mohammad. Em todos os casos, as autoridades demonstraram interesse em fazer negócios com o Brasil. “Vamos estimular os investimentos em infraestrutura, sobretudo por meio de concessões”, afirmou Temer, no domingo 4, aos líderes dos BRICS, grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul.
No agronegócio, o maior desafio é romper barreiras aos produtos brasileiros. “Temos condições de atender toda a população brasileira e às demandas mundiais”, disse o ministro Maggi aos representantes chineses. Reduzida a insegurança política, os investidores passaram analisar as opções que o Brasil tem a oferecer. “Desde maio o humor dos players internacionais melhorou bastante em relação ao País”, diz Fábio Matsui, sócio da Cypress Associates, especializada em operações de fusões e aquisições internacionais. “Estamos orientando os nossos clientes a pisar no acelerador para se posicionarem no mercado.”
A infraestrutura, incluindo projetos de logística, energia e petróleo, é o setor mais cobiçado. Nas palavras do ministro Meirelles, é “um mapa de oportunidades, com concessões, outorgas e privatizações que somam US$ 269 bilhões”. No dia 13 de setembro, em Brasília, o secretário executivo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Moreira Franco, vai detalhar os projetos que estarão à disposição da iniciativa privada. Com a atração de recursos para a infraestrutura, o governo pretende gerar receitas e empregos.
Para atingir esses objetivos, no entanto, a equipe econômica precisará atender a um pleito dos investidores: aumentar a taxa interna de retorno (conhecida como TIR) dos projetos. No governo Dilma Rousseff, a TIR foi achatada e acabou inviabilizando alguns leilões de rodovias. Em outras rodadas, a participação generosa do BNDES com empréstimos a juros subsidiados compensava esse lucro menor, mas gerava um custo aos cofres públicos. Agora, no governo Temer, a tendência é de que o BNDES tenha um papel mais discreto, o que demandará uma TIR maior. “O investidor que antes olhava taxas de retorno de 15% hoje miram em 20% a 25%”, diz Matsui.
O atual cenário global tem características que jogam contra e a favor do Brasil. De positivo, há trilhões de dólares aplicados a juros negativos nas economias desenvolvidas que podem ser convertidos em investimentos financeiros e produtivos no País. Por outro lado, os recursos destinados a infraestrutura em países emergentes vêm caindo nos últimos três anos, segundo dados do Banco Mundial. “Devido ao baixo crescimento econômico, a América Latina está perdendo muito espaço”, diz Luís Afonso Lima, presidente da Sociedade Brasileira de Estudos de Empresas Transnacionais e Globalização Econômica (Sobeet). “No caso do Brasil, a insegurança política também atrapalhou.” Com a derrocada da economia no governo Dilma, a partir de 2014, o País caiu da 5ª para a 12ª posição no ranking das nações que mais atraem investimentos.
Enquanto estiveram no G20, o presidente Temer e o ministro Meirelles continuaram monitorando e comentando os assuntos nacionais. Na pauta, as manifestações contra o governo e a tramitação de projetos do ajuste fiscal. “Uma ambiciosa agenda de reformas estruturais está em curso para elevar a produtividade da economia”, disse o presidente a empresários chineses. De volta ao Brasil, na terça-feira 6, a cúpula do Planalto retomou as articulações com a base parlamentar para garantir o avanço das propostas. Além disso, o governo prometeu enviar a proposta de reforma da previdência antes das eleições municipais (leia reportagem aqui). Na noite da quinta-feira 8, o Senado Federal proporcionou boas notícias ao governo.
Promulgou a Emenda Constitucional que prorroga a desvinculação das receitas da União, a chamada DRU, e aprovou a reforma administrativa, que havia sido determinada pelo presidente Temer nos primeiros dias de interinidade, reduzindo de 39 para 24 o número de ministérios. A equipe econômica acredita que os ajustes avançarão rapidamente e, consequentemente, impulsionarão os índices de confiança de consumidores e empresários. Na própria quinta-feira, numa demonstração de que os estrangeiros estão de olhos abertos a boas oportunidades, o presidente da petroleira norueguesa Statoil, Eldar Saetre, se reuniu com Temer e cravou: “Queremos ampliar nossos negócios e investir mais no Brasil.” É só o jogo político não atrapalhar a economia.