Na manhã da terça-feira 7, enquanto o economista Ilan Goldfajn era sabatinado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, Brasília começava a pegar fogo. O discurso do novo presidente do Banco Central (BC) não tinha nada de incendiário. Ele seguiu o padrão esperado pelo mercado financeiro e pela maioria dos políticos ao defender o resgate do tripé macroeconômico do Plano Real: responsabilidade fiscal, câmbio flutuante e inflação sob controle. “Nossa história recente bem demonstra que níveis mais altos de inflação não favorecem o crescimento econômico. Ao contrário, desorganizam a economia, inibem o investimento, a produção e o consumo e impactam negativamente a renda e o nível de emprego”, disse ele (leia mais à pág. 20). Seu nome foi aprovado por 19 votos a oito na CAE e ratificado, na tarde do mesmo dia, por 56 a 13 pelos senadores. Mas, o que agitava a capital federal não tinha nada a ver com o pensamento econômico de Ilan. Era a instabilidade política que mexia com o poder, atônito diante dos pedidos de prisão de quatro caciques do PMDB.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, encaminhou para o Supremo Tribunal Federal (STF) o pedido de detenção do presidente do Senado, Renan Calheiros, do ex-presidente da República, José Sarney, do senador Romero Jucá e do presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha. Para o Ministério Público (MP), todos conspiraram para impedir o avanço da Operação Lava Jato. O MP afirma que as gravações de Sergio Machado, presidente da Trasnpetro, com Renan, Jucá e Sarney, são prova disso. Eles, por sua vez, disseram que não fizeram qualquer movimento para interromper o trabalho da Justiça. Cunha afirmou que a divulgação busca constranger quem defende sua absolvição no Conselho de Ética. O caso será analisado pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato no STF.

Em meio a essa brasa política constantemente acesa, duas centenas de empresários desembarcaram na manhã de quarta-feira, em Brasília, para manifestar apoio ao governo. Eles se encontraram com o presidente Michel Temer, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, para reforçar cinco pontos essenciais para retomar a confiança dos investidores no País: a redução dos juros, o destravamento do crédito, o estímulo aos investimentos em infraestrutura, a alavancagem das exportações e o repúdio ao aumento de impostos. “É necessário ter trilhos separados, com a crise política seguindo seu caminho até que se resolva”, afirmou Paulo Skaf, presidente da Fiesp, que foi o porta-voz do grupo. “E a economia precisa ter trilhos desimpedidos, sem obstáculos, para que se retome a geração de riquezas no Brasil.”

Uma crítica que circula, ainda baixinho, nos bastidores é que Meirelles trocou a maior parte dos nomes ligados à economia, mas não anunciou nenhuma medida para dar impulso imediato aos negócios. O ministro da Fazenda responde que o que vem sendo feito pelo governo é para resolver os problemas da próxima década e não do próximo semestre. Ele é a favor da mudança estrutural da economia. “O importante é que isso gera uma confiança na sustentabilidade do Estado, na responsabilidade da gerência das contas públicas”, disse ele. “Esse é um processo que vai destravar coisas importantes.” O otimismo com a recuperação da economia brasileira, porém, deve ser visto com cautela. A inflação resiste em ceder. O IPCA registrou 0,78% em maio, o maior índice para o mês desde 2008. No ano, acumula 4,05% e, em 12 meses, 9,32%. A expectativa é de uma inflação de 7,12% no final do ano. “A resistência da inflação não é só dos preços administrados, mas dos preços livres, que mesmo com a recessão, não estão cedendo”, diz o economista Alexandre Schwartsman. “Isso é resultado da perda de credibilidade no BC do Tombini, que nunca sinalizou que traria a inflação para o centro da meta.”

Sem sinais de arrefecimento da inflação, a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), comandada por Alexandre Tombini, manteve a Selic em 14,25% ao ano. Agora, Tombini deve ser premiado com um cargo no FMI, como diretor-executivo. Sua ida para Washington provocará uma dança das cadeiras brasileiras nas organizações internacionais. Otaviano Canuto, que estava no FMI, deverá seguir para o Banco Mundial e Antonio Henrique Silveira, atualmente no Banco Mundial, para o Banco Interamericano de Desenvolvimento. As trocas devem acontecer a partir de agosto. “É preciso saber se o Tombini vai aceitar deixar de ser protagonista”, diz uma fonte próxima a ele, que pediu para não ser identificada. 

O ritual de passagem do BC estava previsto para a segunda-feira, 13. Ilan terá duas missões primordiais: resgatar a confiança perdida pela instituição nos últimos anos e criar uma estratégia diferente da de Tombini para os juros. Se não sinalizar uma mexida na Selic, será mais do mesmo. Porém, se decidir pelo aumento do juro para acelerar o ritmo da queda da inflação, o BC poderá colocar o País em situação de dominância fiscal, quando a política monetária é neutralizada por uma política fiscal fora de controle. “O Ilan vai precisar reconstruir a reputação institucional, que foi destruída”, diz a economista Monica de Bolle, pesquisadora do Peterson Institute. “Mas o problema do Brasil não é monetário. Há um desarranjo fiscal imenso, que não vai permitir a queda tão rápida da inflação.” Ilan, com sua nova equipe de diretores, terá muito trabalho nos dias que antecedem o novo encontro do Copom.